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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

segunda-feira, dezembro 15, 2014

Três lições que podemos tirar do caso Bolsonaro


Atoleiro racista
Um jornal compartilha no Facebook matéria em que as ministras Eleonora Menicucci (Política para Mulheres) e Idelli Salvatti (Direitos Humanos) manifestam repúdio ao comentário do deputado Jair Bolsonaro (PP) de que não estupraria a deputada e ex-ministra dos Direitos Humanos, Maria do Rosário (PT), porque ela “não merece”.
O comentário mais popular aparece logo em cima, com quase quatro mil curtidas, e diz “Sou mulher e não me senti atingida, humilhada e reduzida em nenhum momento. Quem fala o que quer, ouve o que não quer. Me sinto diminuída sim, quando essa Maria do Rosário defende bandido.”
Respiro fundo e clico para ver os demais. O nível não melhora e a barra lateral agora parece infinita. Ok, vamos lá, o que podemos aprender com essa história:
1. Nunca, jamais, sob hipótese alguma, leia comentários de notícias no Facebook. Faz mal, é sério.
2. Piadinha com estupro não tem graça, não é irônica, não é liberdade de expressão. É covarde. O que o deputado parece não compreender – e aparentemente, nem seus 400 mil eleitores – é que você falar que uma mulher merece ou não ser estuprada reforça a violência, como se em algum caso estupro fosse legítimo. Quando ela é feia, por exemplo, segundo Bolsonaro.
E, sinceramente, a última coisa que nós mulheres precisamos, senhor deputado, é de qualquer tipo de comentário leviano que reforce a cultura do estupro. Você não andou fazendo o dever de casa, mas eu te ajudo aqui: 50 mil mulheres são estupradas por ano e a cada 12 segundos uma mulher sofre algum tipo de violência. Quando o parlamentar “ironiza” que “não estupraria porque ela não merece”, ele não está se defendendo de uma suposta ofensa dela, mas está defendendo os milhares de estupradores que tem por aí. Porque em alguns casos, segundo ele, mulher merece sim ser estuprada.
Quais as implicações de um parlamentar, que tem um lugar de fala privilegiado, que supostamente representa centenas de milhares de brasileiros, fazer uma alegação dessas? É legítimo que ele promova a violência se ele tem um mandado e representa uma parcela da população? Bolsonaro passou dos limites. Mais uma vez. Como disse a ministra Menicucci, “É inaceitável que um deputado utilize seu posto para liderar um discurso de ódio a um crime que atinge, humilha e reduz as mulheres”.
3. Por que a autora do comentário no Facebook deveria se sentir atingida, humilhada e reduzida com o que Bolsonaro disse? Primeiro, porque ela poderia ter sido e, infelizmente, ainda pode ser uma dessas 50 mil mulheres. A violência de gênero tem um público específico do qual ela, suas filhas e irmãs fazem parte. Você pode até não concordar com a agenda da Maria do Rosário e com o que ela defende, mas entenda que ninguém merece ser estuprada. Nem você, nem ela, nem ninguém. Solidariedade mandou um abraço.
Categorizar mulheres de acordo com um determinado padrão e definir quem merece e quem não merece ser estuprada é covarde, cruel e criminoso. Concordar, defender ou mesmo se omitir faz de você cúmplice. Parece que a internet está cheio deles…
15/12/2014Geledés Instituto da Mulher Negra


Leia a matéria completa em: Três lições que podemos tirar do caso Bolsonaro - Geledés 
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