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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

sexta-feira, março 11, 2011

PARA EX-PRESIDENTE DE PORTUGAL, A FAMÍLIA SOCIALISTA, E SÓ ELA, PODE DEVOLVER O RUMO E A CORAGEM À EUROPA

Ótimo artigo do ex-presidente e ex-primeiro-ministro de Portugal, Mário Soares, publicado na revista Carta Capital, revela a atual conjuntura política e social de uma Europa que foi palco das principais transformações da era moderna, que gestou ideias e diferentes formas de ver e entender a geopolítica mundial; e que hoje encontra-se quase que à deriva, sutilmente desorientada diante das urgências da atualidade.

O ponto de vista do autor, o breve, porém suficiente resgate histórico feito por ele e a discussão sobre a situação atual são interessantes para refletir e pensar o mundo hoje e para os próximos anos.

Do socialismo democrático, passando pela democracia-cristã até a hegemonia do neoliberalismo norte-americano em solo europeu, o artigo aponta alternativas de uma nova oportunidade para o socialismo democrático, lembrando como este, se for capaz de se renovar e adaptar-se às mudanças contemporâneas nos diferentes campos da atividade humana, pode responder às principais questões da atualidade.

Dentre elas, lutar por justiça, redução das desigualdades sociais, retomar valores éticos, dignificar o trabalho e, principalmente, fazer renascer aquele sentimento de utopia tão saudável para que as nações progridam, acreditem e lutem por uma realidade melhor.

Em lúcidas palavras, o artigo chama de volta a família socialista européia para que a Europa recupere o rumo e a coragem de ser quem sempre foi no cenário internacional e para que espécies perversas de populismo não voltem a ganhar terreno no velho mundo.

Vale a leitura! Veja trecho:

O mundo está em rapidíssima transformação e a União Europeia, nos últimos anos, perdeu a orientação
Por Mario Soares

Lisboa, Portugal, fevereiro/2011 – Na década de 1970, a Europa era governada pela família do socialismo democrático, ou, como o chamávamos, do socialismo em liberdade (socialistas, social-democratas e trabalhistas) e pela família democrata-cristã, que era essencialmente europeísta e partidária da doutrina social da Igreja Católica.
Após o colapso do comunismo e a chegada do neoliberalismo norte-americano, as duas famílias, de acordo com os sinais do tempo, se deixaram convencer pela “terceira via” e pelo domínio dos mercados que têm como único valor o dinheiro e não as pessoas.
Resultado: a maior parte dos partidos da área socialista perdeu o poder, já que para os que preferem um governo de direita é mais lógico votar nos conservadores, enquanto os democrata-cristãos, salvo raras exceções, se esqueceram da doutrina social da Igreja e, transformados em Partidos Populares, colocaram-se na direita do espectro político. As duas famílias perderam a influência que tiveram em seus bons tempos, e em alguns países europeus pura e simplesmente desapareceram. Eram os anos nos quais os especialistas políticos norte-americanos proclamavam o “fim da história” e a “morte das ideologias” (com exceção, claro, da neoliberal). (Texto Completo)
*educaçãopolítica

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