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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

quarta-feira, agosto 25, 2010

Preparando o Fim do Mundo






O inverno nuclear - Reflexões de Fidel Castro



ENVERGONHO-ME de ser desconhecedor do tema, do qual nem sequer tinha ouvido falar. Caso contrário, teria compreendido muito antes que os riscos de uma guerra nuclear são muito mais graves do que imaginei. Eu supunha que o planeta podia suportar o deflagrar de centenas de bombas nucleares, após calcular que, tanto os Estados Unidos quanto a URSS, tinham feito incontáveis testes durante anos. Não tive em conta uma realidade bem simples: não é a mesma coisa fazer explodir 500 bombas nucleares em 1.000 dias, do que fazê-las estourar em um único dia.
Consegui saber disso quando solicitei informação a vários especialistas na matéria. É de supor que fiquei espantado quando soube que não era necessária uma guerra mundial nuclear para que perecesse a nossa espécie.
Bastaria uma contenda nuclear entre duas potências nucleares das mais fracas, como a Índia e o Paquistão ―que entre ambas, não obstante, reúnem muito mais de 100 armas desse tipo―, e a espécie humana desaparecerá.
Raciocinei um bocado com os elementos de juízo que me forneceram nossos peritos na matéria, tomados do que foi exposto pelos mais prestigiados cientistas do mundo.
Existem coisas que Obama conhece perfeitamente bem:
"…uma guerra nuclear entre os EUA e a União Soviética produziria um ‘inverno nuclear’."
"O debate internacional acerca dessa previsão, animado pelo astrónomo Carl Sagan, obrigou os líderes de ambas as superpotências a encararem a possibilidade de que sua corrida aos armamentos não apenas os colocaria em perigo a eles, mas também a toda a humanidade."
"…‘os modelos elaborados por cientistas russos e norte-americanos mostravam que uma guerra nuclear traria em consequência um inverno nuclear tremendamente destruidor para toda a vida na Terra; saber disso representou para nós, para as pessoas de moral e honra, um grande estímulo…’."
"…as guerras nucleares zonais poderiam desencadear uma catástrofe global similar. Novas análises revelam que um conflito entre a Índia e o Paquistão, durante o qual fossem jogadas 100 bombas sobre cidades e áreas industriais ―só 0,4% das mais de 25.000 ogivas que existem no mundo― geraria fumaça suficiente para arruinar a agricultura mundial. Uma guerra regional poderia causar a perda de vidas, inclusive em países afastados do conflito."
"Com computadores modernos e novos modelos climáticos, a nossa equipe conseguiu demonstrar que não só eram corretas as ideias dos anos oitenta, mas também que os efeitos durariam pelo menos dez anos, muito mais do que antes se julgava […] inclusive a fumaça de uma guerra regional receberia o calor do Sol e ascenderia para ficar suspensa durante anos na atmosfera superior, encobrindo a luz solar e arrefecendo a Terra."
"A Índia e o Paquistão, que entre ambas reúnem mais de 100 ogivas nucleares…"
"Alguns acreditam que a teoria do inverno nuclear desenvolvida nos oitenta caiu no descrédito. Por isso talvez se surpreendam perante a nossa asseveração de que uma guerra nuclear zonal entre a Índia e o Paquistão, por exemplo, poderia devastar a agricultura em todo o planeta.
"A teoria original estava rigorosamente validada. Sua fundamentação científica tinha o apoio de investigações realizadas pela Academia Nacional das Ciências, por estudos patrocinados pelas Forças Armadas dos EUA e pelo Conselho Internacional de Sindicatos Científicos, que incluía representantes de 24 academias nacionais da ciência e doutros organismos científicos."
"Talvez o arrefecimento não pareça coisa de particular preocupação. Mas convém saber que uma leve diminuição de temperatura pode acarretar consequências graves."
"O volume total de cereais armazenado hoje no planeta poderia alimentar a população mundial durante um par de meses (Vide ‘Crises alimentares: uma ameaça para a civilização?’, por Lester R. Brown; INVESTIGAÇÃO E CIÊNCIA, Julho de 2009)."
"Às vezes, a fumaça dos grandes incêndios florestais penetra na troposfera e na estratosfera inferior e é deslocada a grandes distâncias, gerando arrefecimento. Os nossos modelos se acomodam também a esses efeitos."
"Há 65 milhões de anos, um asteróide impactou na península de Yucatan. A nuvem de poeira resultante, misturada com a fumaça dos incêndios, escondeu o Sol, matando os dinossauros. O vulcanismo ativo, que nesse tempo acontecia na Índia, pôde ter agravado os efeitos."
"…o crescente número de estados nucleares eleva as probabilidades de que deflagre uma guerra, deliberada ou acidentalmente.
"Coreia do Norte ameaçou de declarar guerra se não cessa a inspeção de seus navios, na busca de materiais nucleares."
"Alguns líderes indianos extremistas propugnaram atacar o Paquistão com armas nucleares, quando dos últimos ataques terroristas na Índia."
"O Irã ameaçou de destruir Israel, uma potência nuclear, que por sua vez jurou não permitir jamais que o Irã se torne uma potência nuclear."
"As duas primeiras bombas nucleares comocionaram tanto o mundo, que apesar do crescimento em massa dessas armas desde então, elas nunca mais voltaram a ser empregues."
Uma guerra nuclear será inevitável a partir do momento em que se cumpra o prazo do Conselho de Segurança da ONU; qualquer coisa pode acontecer quando for inspeccionado o primeiro navio iraniano.
"No âmbito do Tratado Estratégico de Redução Ofensiva, os EUA e a Rússia se comprometeram a reduzir seu arsenal para 1.700 e 2.200 ogivas nucleares estratégicas instaladas, para finais de 2012."
"Se essas armas forem utilizadas contra objetivos urbanos, matariam centenas de milhões de pessoas e uma ingente fumaça de 180 Tg inundaria a atmosfera do planeta."
"O único modo de eliminar as possibilidades de uma catástrofe climática é banindo as armas nucleares."
Estive reunido hoje ao meio-dia com quatro especialistas cubanos: Tomás Gutiérrez Pérez, José Vidal Santana Núñez, o coronel José Luis Navarro Herrero, chefe da secretaria da Ciência e Tecnologia, do Ministério das Forças Armadas e Fidel Castro Diaz-Balart, com os quais examinei o tema de que trato nesta Reflexão.
Solicitei a reunião ontem 22 de agosto. Não desejava perder um minuto. Sem dúvida foi muito frutuosa.
Fidel Castro Ruz

Preparar a III Guerra Mundial: Objectivo Irã

Michel Chossudovsky* no DiarioInfo

Michel Chossudovsky
Neste artigo Michel Chossudovsky alerta para o perigo de um ataque iminente ao Irão pelos EUA e pelo estado neofascista de Israel. A concentração de poderosas forças aeronavais no Golfo seria o prólogo de bombardeamentos devastadores de objectivos estratégicos, de acordo com planos há muito elaborados. Especialistas do Pentágono têm afirmado, porém, que a utilização de armas convencionais no bombardeamento das instalações nucleares subterrâneas de Natanz seria ineficaz pelo que sugerem o recurso a armas atómicas tácticas. Os próprios dirigentes iranianos duvidam que Obama assuma a responsabilidade de repetir Hiroshima, desencadeando uma tragédia que provocaria a condenação dos EUA pela Humanidade.

A humanidade está numa encruzilhada perigosa. Os preparativos de guerra para atacar o Irão estão em «avançado estado de preparação». Sistemas de alta tecnologia, incluindo armas nucleares, estão totalmente preparados.
Esta aventura militar tem estado na mesa de planeamento do Pentágono desde meados da década 1990. Primeiro o Iraque, depois o Irão, de acordo com documentos desclassificados de 1995 do Comando Central dos EUA.
A escalada faz parte da agenda militar. Além do Irão – é o próximo objectivo juntamente com a Síria e o Líbano – este desenvolvimento estratégico militar também ameaça a Coreia do Norte, a China e a Rússia.
Desde 2005, os EUA e os seus aliados, incluindo os interlocutores dos Estados Unidos na NATO e Israel, estão envolvidos num amplo desenvolvimento e armazenamento dos sistemas de armas avançadas.
Os sistemas de defesa aérea dos EUA, dos países membros da NATO e Israel estão totalmente integrados.
É um trabalho coordenado pelo Pentágono, a NATO e a Força de Defesa de Israel (FID), com a activa colaboração de vários países da NATO e outros não integrados nesta estrutura, incluindo os Estados árabes (os membros da NATO do Diálogo do Mediterrâneo e a Iniciativa de Cooperação de Istambul), Arábia Saudita, Japão, Coreia do Sul, Índia, Indonésia, Singapura e Austrália, entre outros. Fazem parte da NATO 28 Estados; outros 21 países são membros do Conselho da Aliança Euro-Atlântica (EAPC); o Diálogo Mediterrâneo e a Iniciativa de Cooperação de Istambul é formada por 10 países árabes e Israel.
O papel do Egipto, dos Estados do Golfo e da Arábia Saudita dentro da aliança militar ampliada é de particular relevância: o Egipto controla o trânsito dos navios de guerra e petroleiros no Canal do Suez; a Arábia Saudita e os Estados do Golfo ocupam a costa ocidental sul do Golfo Pérsico, o Estreito de Ormuz e o Golfo de Oman.
No princípio de Junho, «o Egipto informou que permitiu a passagem pelo canal do Suez de onze barcos dos EUA e de Israel, num aparentemente aviso… ao Irão. Em 12 de Junho, alguns meios de comunicação regionais informaram que os sauditas tinham dado autorização a Israel para sobrevoar o seu espaço aéreo» (Mirak Weissbach Muriel, Israel’s Insane War on Iran Must Be Prevented, Global Research, 31 de Julho de 2010). Na doutrina militar nascida do 11 de Setembro, o desenvolvimento massivo de armamento militar definiu-se como parte integrante da chamada «Guerra Global contra o Terrorismo», dirigido contra organizações terroristas «não estatais» como a Al-Qaeda e os chamados «Estados patrocinadores do terrorismo, como o Irão, a Síria, o Libano e o Sudão.
A criação de novas bases militares dos EUA e o armazenamento dos sistemas de armas avançadas, incluindo as armas nucleares tácticas, etc. fazem parte da preventiva «doutrina militar defensiva» sob o guarda-chuva da «Guerra Global contra o Terrorismo».
GUERRA E CRISE ECONÓMICA
As consequências de um ataque de um ataque intenso dos Estados Unidos, da NATO e Israel contra o Irão são de longo alcance.
A guerra e a crise económica estão intimamente relacionadas, A economia de guerra é financiada por Wall Street, que surge como credor da administração dos EUA.
Os produtores de armas são os destinatários de milhares de milhões de dólares do Departamento de Defesa dos EUA, como forma de pagamento dos contratos de aquisição de sistemas de armas avançadas.
Por sua vez, «a batalha do petróleo» no Médio Oriente serve directamente os interesses das petrolíferas gigantes anglo-estadunidenses. Os EUA e os seus aliados estão «a tocar os tambores da guerra» num momento de uma depressão económica mundial, para não falar da catástrofe ambiental, mais grave da história mundial. Numa amarga jogada, um dos grandes jogadores (BP) do tabuleiro de xadrez geopolítico da Ásia Central no Médio Oriente, a antigamente conhecida como Anglo-Persian Oil, foi a instigadora da catástrofe ecológica no Golfo do México.
MEIOS DE DESINFORMAÇÃO
A opinião pública, influenciada pelo bombardeamento dos meios de comunicação social, apoia tacitamente, indiferente ou ignorando os possíveis impactes do que se mantém como um ad hoc «punitivo», uma operação dirigida contra as instalações nucleares do Irão em vez de uma guerra total.
Os preparativos para a guerra incluem o desenvolvimento do fabrico de armas nucleares nos EUA e Israel.
Neste contexto, as consequências devastadoras de uma guerra nuclear trivializam-se ou, pura e simplesmente não se mencionam.
A crise «real» que ameaça a humanidade é o «aquecimento global» segundo os media e o Governo, não a guerra.
A guerra contra o Irão apresenta-se à opinião pública como um tema entre vários outros. Não se apresenta como uma ameaça à «Mãe Terra», como o caso do aquecimento global. Não é notícia de primeira página. O facto de um ataque contra o Irão poder levar a uma potencial escalada e desencadear uma «guerra global» não é motivo de preocupação.

CULTO DA MORTE E DA DESTRUIÇÃO
A máquina global de matar também é sustentada pelo culto da morte e da destruição que inunda os filmes de Hollywood, para não referir as guerras em prime time e as séries de televisão sobre delinquência.
Este culto da matança é apoiado pela CIA e pelo Pentágono, que também apoiou (financiou) produções de Hollywood como instrumentos de propaganda da guerra.
O ex-agente da CIA Bob baer disse: «Há uma simbiose entre a CIA e Hollywood» e revelou que o ex-director da CIA George Tenet, se encontra actualmente em Hollywood, a falar com os estúdios. (Mathew Alford and Robbie Graham, Lights, Camera… Covert Action: The Deep Politics of Hollywood, Global Research, 31 de Janeiro de 2009). A máquina de matar desenvolve-se a nível global no quadro da estrutura de comando de combate unificado. E, habitualmente, mantém-se nas instituições do governo, media corporativos e mandarins e intelectuais às ordens da Nova Ordem Mundial, desde os think thanks de Washington e os institutos de investigação de estudos estratégicos, como instrumentos indiscutível da paz e da prosperidade mundiais. A cultura da morte e da violência gravou-se na consciência humana.
A guerra é largamente aceite como parte de um processo social: a Pátria tem que ser «defendida» e protegida.
A «violência legitimada» e as execuções extrajudiciais contra os «terroristas» mantêm-se nas democracias ocidentais, como instrumentos necessários de segurança nacional.
Uma «guerra humanitária» é sustentada pela chamada comunidade internacional. Não é condenada como um acto criminoso. Os seus principais arquitectos são recompensados pelas suas contribuições para a paz mundial. Quanto ao Irão, o que se está a desenvolver é a legitimação directa da guerra em nome de uma ilusória teoria de segurança mundial.

UM ATAQUE AÉREO «PREVENTIVO» CONTRA O IRÃO
LEVARIA A UMA ESCALADA
Na actualidade há três teatros de guerra separados no Médio Oriente-Ásia Central: Iraque, Afeganistão/Paquistão e Palestina.
Se o Irão for objecto de um ataque aéreo «preventivo» pelas forças aliadas, toda a região, do Mediterrâneo Oriental à fronteira ocidental da China com o Afeganistão e Paquistão, poderia rebentar o que potencialmente conduz a um cenário da Terceira Guerra Mundial.
A guerra também se estenderia ao Líbano e à Síria. É muito pouco provável que os ataques, se tivessem lugar, ficassem circunscritos às instalações nucleares do Irão, como afirmam as declarações oficiais dos EUA e da NATO. O mais provável é um ataque aéreo, tanto a infra-estruturas militares como civis, sistemas de transporte, fábricas e edifícios públicos.
O Irão, com uma estimativa de dez por cento do petróleo mundial, ocupa o terceiro lugar mundial das reservas de gás, depois da Arábia Saudita (25%) e Iraque (11%) do total mundial das reservas. Em contrapartida, os EUA têm menos de 2,8% das reservas mundiais de petróleo (Ver Eric Waddel, The Battle for Oil, Global Research, Dezembro de 2004).
É de importância vital a recente descoberta no Irão, em Soumar e Halgan, das segundas maiores reservas mundiais conhecidas que se estimam em 12,4 biliões de pés cúbicos. Atacar o Irão não só consiste em recuperar o controlo anglo-estadunidense, mas também questiona a presença e influência da China e da Rússia na região.
O ataque planificado contra o Irão faz parte de um mapa global coordenado de orientação militar. Faz parte da «longa guerra do Pentágono» uma lucrativa guerra sem fronteiras, um projecto de dominação mundial, uma sequência de operações militares.
Os planificadores militares dos EUA e da NATO previram diversos cenários de escalada militar. Estão perfeitamente conscientes das implicações geopolíticas, a saber, que a guerra poderá estender-se para além da região do Médio Oriente à Ásia Central. Os efeitos económicos sobre os mercados de petróleo, etc. também foram analisados. Enquanto o Irão, a Síria e o Líbano são os objectivos imediatos, a China, a Rússia, a Coreia do Norte, para não falar da Venezuela e Cuba, são também objecto de ameaças dos EUA.
Está em jogo a estrutura das alianças militares. Os desenvolvimentos militares da NATO-EUA-Israel, incluindo as manobras militares e exercícios realizados na Rússia e nas suas fronteiras imediatas com a China têm uma relação directa com a guerra proposta contra o Irão.
Estas ameaças veladas, incluindo o seu calendário, constituem um aviso claro aos antigos poderes da era da Guerra Fria, paar evitar que possam interferir num ataque dos EUA contra o Irão.

GUERRA MUNDIAL

O objectivo estratégico a médio prazo é chegar ao Irão e neutralizar os seus aliados, através da diplomacia da canhonheira. O objectivo militara longo prazo é dirigido directamente à China e à Rússia.
Ainda que o Irão seja o objectivo imediato, o desenvolvimento militar não se limita ao Médio Oriente e Ásia Central. Foi formulada uma agenda militar global.
O desenvolvimento das tropas da coligação e os sistemas de armas avançadas dos EUA, da NATO e dos seus parceiros estão a produzir-se em todas as principais regiões do mundo.
As recentes acções dos militares dos EUA em frente das costas da Coreia do Norte sob a forma de manobras, são parte do plano global.
Os exercícios militares, os simulacros de guerra, o desenvolvimento de armas, etc., dos EUA, da NATO e dos seus aliados que estão a ser levados a cabo simultaneamente nos principais pontos geopolíticos, são dirigidos principalmente contra a Rússia e a China,
• A península da Coreia do Norte, o Mar do Japão, o Estreito de Taiwan, o Mar Meridional da China, ameaçam a China.
• O desenvolvimento de mísseis Patriot na Polónia, o centro de alerta rápido na República Checa, ameaçam a Rússia.
• Movimentações navais na Bulgária e Roménia no Mar Negro, ameaçam a Rússia.
• Movimentações de tropas da NATO e dos EUA na Geórgia.
• Um intenso movimento naval no Golfo Pérsico, incluindo submarinos israelitas dirigidos contra o Irão.
Ao mesmo tempo, o Mediterrâneo Oriental, o Mar Negro, o Caribe, a América Central e a região Andina na América do Sul, são zonas de militarização em curso. Na América Latina e no Caribe as ameaças dirigem-se contra a Venezuela e Cuba.
“AJUDA MILITAR” DOS EUA
Por sua vez, transferências de armas em grande escala tiveram lugar sob a bandeira dos EUA como “ajuda militar” a países seleccionados, incluindo 5 mil milhões de dólares num acordo de armamento com a Índia que se destina a melhorar as capacidades da Índia perante a China (Huge U.S.-Índia Arms Deal To Contain China, Global Times, 13 de Julho de 2110).
“[A venda de armas] significará melhorar as relações entre Washington e Nova Deli e, de forma deliberada ou não, terá o efeito de conter a influência da China na região”. (Citado em Rick Rozoff, Confronting both China and Russia: U.S. Risks Military Clash With China In Yellow Sea, Global Research, 16 de Julho de 2010).
Os EUA conseguiram acordos de cooperação com alguns países do sul da Ásia Oriental, como Singapura, Vietname e Indonésia, incluindo a sua “ajuda militar” e a participação em manobras militares dirigidas pelos Estados Unidos na Pacífico (Julho-Agosto de 2010). Estes acordos são de apoio às implementações de armas apontadas à República Popular da China. (Ver Rick Rozoff, Confronting both China and Russia: U.S. Risks Military Clash With China In Yellow Sea, Global Research, 16 de Julho de 2010).
Do mesmo modo, e mais directamente relacionado com o ataque planificado contra o Irão, os EUA estão a armar os Estados do Golfo Pérsico (Bahrein, Kuwait, Qatar e os Emiratos Árabes Unidos) com o interceptor de mísseis terra-ar, Patriot Advanced Capability-3 e a Terminal High Altitude Area Defense (THAAD), bem como as instalações standard de mísseis mar-3 interceptores instalados em navios de guerra da classe Aegis no Golfo Pérsico. (Ver Rozoff Rick, NATO’s Role In The Military Encirclement Of Iran, 10 de Fevereiro de 2010).

CALENDÁRIOS DE ARMAZENAMENTO MILITAR E DE IMPLEMENTAÇÃO

O que é crucial nas transferências de armas dos EUA para os parceiros e aliados é o momento real da entrega e o seu desenvolvimento. O lançamento de uma operação militar patrocinada pelos EUA, ocorreria normalmente quando estes sistemas de armas estejam instalados, depois do efectivo desenvolvimento da aplicação da capacitação do pessoal. (Por exemplo da Índia).
Do que estamos a falar é de um desenho militar mundial, cuidadosamente coordenado e controlado pelo Pentágono, com a participação das forças armadas combinadas de mais de quarenta países. Este desenvolvimento militar multinacional mundial é, no mínimo, o maior desenvolvimento de sistemas de armas avançadas da história.
Por sua vez, os EUA e os seus aliados estabeleceram novas bases militares em diferentes partes do mundo. “A superfície da Terra está estruturada como um enorme campo de batalha”. (Ver Jules Dufour, The Worldwide Network of US Military Bases, Investigación Global, 01 de Julho de 2007).
Comando Unificado da estrutura geográfica dividida em comandos de combate baseia-se numa estratégia de militarização a nível global. “Os militares dos EUA têm bases em 63 países. Há sinais de novas bases militares construídas a partir de 2001 em sete países. No total, há 255.065 militares deslocados dos EUA em todo o mundo”. (Ver Jules Dufour, The Worldwide Network of US Military Bases, Investigación Global, 01 de Julho de 2007).
CENÁRIO DA III GUERRA MUNDIAL
Este desenvolvimento militar dá-se em várias regiões ao mesmo tempo e sob coordenação dos comandos regionais dos EUA, com a participação no armazenamento dos arsenais dos EUA e dos aliados dos EUA, alguns deles seus antigos inimigos, como o Vietname e o Japão.
O contexto actual caracteriza-se por uma acumulação militar global controlada por uma superpotência mundial que utiliza os seus aliados para desencadear numerosas guerras regionais.
Diferentemente da Segunda Guerra Mundial, que também foi uma conjugação de diferentes locais de uma guerra regional, é que com a tecnologia de comunicações e sistemas de armas da década de 40, não havia possibilidades de uma estratégia em “tempo real” para a coordenação das acções militares entre as grandes regiões geográficas.
A guerra mundial baseia-se no desenvolvimento coordenado de uma única potência militar dominante, que supervisiona as acções dos seus aliados e parceiros.
Com excepção de Hiroshima e Nagasaki, a Segunda Guerra Mundial caracterizou-se pelo uso de armas convencionais. Agora a planificação de uma guerra mundial baseia-se na militarização do espaço extra-terrestre.
Se uma guerra contra o Irão tiver lugar, não será só o uso de armas nucleares, mas toda a gama de novos sistemas de armas avançadas, inclusive armas electrométricas e técnicas de alteração ambiental (ENMOD) que se utilizarão.

O CONSELHO DE SEGURANÇA DAS NAÇÕES UNIDAS
O Conselho de Segurança aprovou no princípio de Junho uma quarta ronda de sanções de amplo alcance contra a República Islâmica do Irão que incluem o embargo de armas e “controlos financeiros mais apertados”.
Numa amarga ironia, esta resolução foi aprovada dias depois da negativa, pura e dura, do Conselho de Segurança das Nações Unidas de adoptar uma moção de condenação de Israel pelo seu ataque à Flotilha pela Liberdade de Gaza em águas internacionais.
Tanto a China como a Rússia, pressionadas pelos Estados Unidos, apoiaram on regime de sanções do CSNU, em prejuízo próprio. A sua decisão no Conselho de Segurança contribui para debilitar a sua própria aliança militar, a Organização de Cooperação de Shangai (OCS), em que o Irão tem o estatuto de observador. A resolução do Conselho de Segurança congela os próprios acordos de cooperação militar e económica entre a China e a Rússia com o Irão. Isto tem graves repercussões no sistema de defesa aérea do Irão, que em parte depende da tecnologia e experiência da Rússia.
A Resolução do Conselho de Segurança, de facto, dá “luz verde” para desencadear uma guerra preventiva contra o Irão.
A INQUISIÇÃO ESTADUNIDENSE: A CONSTRUÇÃODE UM CONSENSO POLÍTICO PARA A GUERRA
Em coro, os media ocidentais qualificaram o Irão como uma ameaça á segurança mundial devido a um suposto (inexistente) programa de armas nucleares. Fazendo eco das declarações oficiais, os meios de comunicação estão agora a exigir a bombardeamentos punitivos dirigidos contra o Irão a fim de salvaguardar Israel.
Os media tocam os tambores da guerra. O objectivo é inculcar na consciência interna das pessoas, através da repetição até à saciedade da publicação de relatórios com a ideia de que a ameaça iraniana é real e que a república islâmica deve ser “expulsa”.
O processo de criação de consenso para a guerra é semelhante à Inquisição espanhola. Procuram a submissão à ideia que a guerra é uma tarefa humanitária.
A verdadeira ameaça à segurança global vem da aliança Estados Unidos-NATO-Israel, no entanto, a realidade num ambiente inquisitorial é ao contrário: os belicistas estão comprometidos com a paz, as vítimas da guerra são apresentadas como os protagonistas da guerra.
Se em 2006 quase dois terços dos estadunidenses se opunham a uma acção militar contra o Irão, segundo uma sondagem recente da Reuter-Zogby, agora uma sondagem indica que 56% dos estadunidenses são a favor de uma acção militar da NATO contra o Irão.
A criação de um consenso político que se baseia numa mentira não pode, no entanto, confiar unicamente nos que são a fonte da mentira.
Os movimentos contra a guerra nos EUA, que em parte já foram infiltrados, assumiram uma posição frouxa em relação ao Irão. O movimento contra a guerra está dividido. A ênfase põe-se nas guerras que já estão a ser feitas (Afeganistão e Iraque) em vez de se oporem com força a guerras em preparação e que se encontram actualmente no estirador do Pentágono.
Desde a posse da administração Obama que o movimento contra a guerra perdeu parte do seu ímpeto.
Por outro lado, os que se opõem activamente contra as guerras do Afeganistão e do Iraque não se opõem necessariamente a “bombardeamentos punitivos” ao Irão nem estes atentados são qualificados como um acto da guerra que poderá ser o prelúdio da Terceira Guerra Mundial.
A escalada de protestos contra a guerra ao Irão tem sido mínima em comparação coma as manifestações massivas que precederam os bombardeamentos de 2003 e a invasão do Iraque.
Diplomaticamente, a operação Irão não teve a oposição da China e da Rússia, mas conta com o apoio dos governos dos Estados árabes de primeira linha que estão integrados no diálogo NATO-Mediterrâneo e conta também com o apoio tácito da opinião pública ocidental.
Fazemos um apelo às pessoas de todos os países, na América, na Europa Ocidental, em Israel, na Turquia e em todo o mundo para que se levantem contra este projecto militar, contra os governos que apoiam a acção militar contra o Irão, contra os meios de comunicação que servem para camuflar as devastadoras consequências de uma guerra contra o Irão.
ESTA GUERRA É UMA LOUCURA
A III Guerra Mundial é terminal. Albert Einstein compreendia os perigos da guerra nuclear e a extinção da vida na Terra, que já começou com a contaminação radioactiva resultante da utilização de urânio empobrecido. “Não sei com que armas se lutará na III Guerra Mundial, mas na IV Guerra Mundial lutar-se-á com paus e pedras”.
Os meios de comunicação, os intelectuais, os cientistas e os políticos, em coro, ofuscam a verdade não contada, a saber, que a guerra que utiliza ogivas nucleares destrói a humanidade, e que este complexo processo de destruição gradual já começou.
QUANDO A MENTIRA SE CONVERTE EM VERDADE JÁ NÃO HÁ VOLTA ATRÁS
Quando a guerra é apresentada como uma tarefa humanitária, a justiça e todo o sistema jurídico internacional estão de pernas para o ar: o pacifismo e o movimento contra a guerra são criminalizados. Opor-se à guerra converte-se num acto criminoso.
A mentira deve ser exposta como aquilo que é e faz.
Aprova a matança indiscriminada de homens, mulheres e crianças.
Destróis famílias e pessoas. Destrói o compromisso das pessoas com os seus semelhantes.
Impede as pessoas de expressarem a sua solidariedade com os que sofrem. Defende a guerra e o estado policial como a única via.
Destrói o internacionalismo.
Romper com a mentira significa romper com um projecto criminosos de destruição global, onde a procura do lucro é a sua força primordial.
Este lucro incentiva a agenda militar, destrói valores humanos e transforma as pessoas em zombis inconscientes.
Vamos inverter a maré.
Desafio aos criminosos de guerra em altos cargos e nas poderosas corporações e grupos de pressão que os apoiam.
Este beneficio impulsando la agenda militar destruye los valores humanos y transforma a la gente en zombis inconscientes.
Fim da inquisição estadunidense.
Fim da cruzada militar Estados Unidos-NATO-Israel.
Encerramento das fábricas de armas e das bases militares.
Retirada das tropas
Os membros das Forças Armadas devem desobedecer às ordens e recusarem-se a participar numa guerra criminosa.

* Michel Chossudowsky, amigo e colaborador de odiario.info, é Professor Emérito da Universidade de Ottawa, Canadá.
Tradução de José Paulo Gascão

A tendência à barbárie e as perspectivas do socialismo



por James Petras [*]
Quadro de Fernando Botero.As sociedades ocidentais e os Estados estão se deslocando inexoravelmente para condições semelhantes à barbárie; mudanças estruturais estão revertendo décadas de bem-estar social e sujeitando o trabalho, os recursos naturais e as riquezas das nações à exploração bruta, à pilhagem e ao saque, rebaixando os padrões de vida e causando descontentamento num nível sem precedentes.

Inicialmente, descreveremos os processos econômicos, políticos e militares que vêm abrindo este caminho à decadência e à decomposição social, e a seguir mostraremos a reação das massas populares à deterioração de suas condições de vida. As profundas mudanças estruturais que acompanham a ascensão da barbárie constituirão a base para considerar as perspectivas para o socialismo no século XXI.

A crescente onda de barbárie

Nas sociedades antigas, a "barbárie" e os seus portadores – os "bárbaros" invasores – foram vistos como uma ameaça vinda das regiões periféricas de Roma ou Atenas. Nas sociedades ocidentais contemporâneas, os bárbaros vêm de dentro, da elite, com a intenção de impor uma nova ordem que corrói o tecido social e a base produtiva da sociedade, convertendo meios de subsistência estáveis em condições deterioradas e inseguras da vida cotidiana.

A chave para a barbárie contemporânea encontra-se nas estruturas internas do Estado imperial e da economia. Estas incluem:

1. A ascensão de uma elite financeira e especulativa, que tem saqueado trilhões de dólares dos poupadores, investidores, mutuários, consumidores e do Estado, subtraindo enormes recursos da economia produtiva e colocando-os nas mãos da camada parasitária aninhada no Estado e nos mercados financeiros.

2. A elite política militarista, que vem supervisionando um estado de guerra permanente desde meados do século passado. Terror de Estado, guerras intermináveis, assassinatos em zonas fronteiriças e a suspensão das garantias constitucionais tradicionais levaram à concentração de poderes ditatoriais, prisões arbitrárias, torturas e à negação do habeas corpus.

3. Em meio a uma profunda recessão econômica e estagnação, os altos gastos do Estado na construção de um império econômico e militar, às expensas da economia nacional e dos padrões de vida, refletem a subordinação da economia local às atividades do Estado imperial.

4. A corrupção desde o topo, visível em todos os aspectos da atividade do Estado - desde as aquisições de bens e serviços até a privatização e os subsídios para os super-ricos –, incentiva o crescimento do crime internacional de cima para baixo, a lumpenização da classe capitalista e um Estado onde a lei e a ordem se encontram em descrédito.

5. Resultantes dos elevados custos de construção do império e da pilhagem da oligarquia financeira, os encargos sócio-econômicos recaem diretamente sobre os ombros dos trabalhadores assalariados, aposentados e trabalhadores por conta própria, determinando uma grande mobilidade descendente na escala social ao longo do tempo. Com a perda de empregos e o desaparecimento das posições mais bem remuneradas, as retomadas de casas pelos bancos crescem exponencialmente e as classes médias, antes estáveis, encolhem, e os trabalhadores são forçados a alongar suas jornadas de trabalho diárias e a trabalhar durante um maior número de anos.

6. As guerras imperiais, que se espalham pelo mundo e são direcionadas a populações inteiras, que sofrem com os bombardeios e as operações clandestinas de terror, geram, em oposição, redes terroristas, que também atingem alvos civis nos mercados, transportes e espaços públicos. O mundo vai se parecendo ao pesadelo hobbesiano de "todos contra todos".

7. Um crescente extremismo etno-religioso ligado ao militarismo é encontrado entre os cristãos, judeus, muçulmanos e hindus, que substitui a solidariedade de classe internacional por doutrinas de supremacia racial e penetra as estruturas profundas dos Estados e das sociedades.

8. O desaparecimento dos Estados europeus e asiáticos de bem-estar social coletivo – nomeadamente, a ex-URSS e a China – levantou as pressões competitivas sobre o capitalismo ocidental e o encorajou à revogação de todas as concessões de bem-estar social obtidas pela classe trabalhadora no período pós-II Guerra Mundial.

9. O fim do "comunismo" e a integração da social-democracia ao sistema capitalista levaram a um enfraquecimento severo da esquerda, que os protestos esporádicos dos movimentos sociais não conseguiram substituir.

10. Diante do atual assalto às condições de vida dos trabalhadores e da classe média, só se vêem protestos esporádicos, no melhor dos casos, e impotência política, no pior.

11. A exploração maciça do trabalho nas sociedades capitalistas pós-revolucionárias, como a China e o Vietnã, compreende a exclusão de centenas de milhões de trabalhadores migrantes dos serviços públicos elementares de educação e saúde. A pilhagem sem precedentes e a captura, por oligarquias nacionais e multinacionais estrangeiras, de milhares de lucrativas empresas públicas estratégicas da Rússia, das repúblicas da ex-União Soviética, dos países da Europa Oriental, dos Bálcãs e dos países bálticos, foram a maior transferência de riqueza pública para mãos privadas, em curto espaço de tempo, em toda a História.

Em resumo, a barbárie surgiu como uma realidade definida, produto da ascensão de uma classe dominante financeira parasitária e militarista. Os bárbaros encontram-se aqui e agora, presentes dentro das fronteiras das sociedades ocidentais e seus Estados. Eles governam e perseguem agressivamente uma agenda que está continuamente a reduzir os padrões de vida, a transferir a riqueza pública para os seus cofres privados, a pilhar recursos públicos, a violar direitos constitucionais no exercício de suas guerras imperiais, a segregar e perseguir milhões de trabalhadores imigrantes e a promover a desintegração e o desaparecimento do trabalho estável e de classe média. Mais do que em qualquer outro momento na história recente, o 1% mais rico da população controla uma parcela crescente das riquezas e das rendas nacionais.

Mitos e realidades do capitalismo histórico

A retirada, em grande escala e de forma sustentada, dos direitos sociais e previdenciários, da segurança no emprego, e as reduções de salários e aposentadorias, demonstram a falsidade da idéia do progresso linear do capitalismo. Essa reversão, produto do poder ampliado da classe capitalista, demonstra a validade da proposição marxista de que a luta de classes é o motor da História – na medida em que, pelo menos, a própria condição humana é considerada como sua peça central.

A segunda premissa falsa – a de que os Estados organizados em "economias de mercado" têm como pré-requisito a paz, tendo como corolário a ascendência dos "mercados" sobre o militarismo – é refutada pelo fato de que a principal economia de mercado – os Estados Unidos – tem permanecido em constante estado de guerra desde o início da década de 1940, estando ativamente engajada em guerras em quatro continentes, até os dias de hoje, e com perspectiva de novas, maiores e mais sangrentas guerras no horizonte. A causa e conseqüência da guerra permanente é o crescimento de um monstruoso "Estado de segurança nacional" que não reconhece fronteiras nacionais e absorve a maior parte do Orçamento do país.

O terceiro mito do "capitalismo avançado maduro" é o de que este sempre revoluciona a produção através da inovação e da tecnologia. Com a ascensão da elite financeira especulativa e militarista, as forças produtivas foram saqueadas e a "inovação" é em grande parte direcionada à elaboração de instrumentos financeiros que exploram os investidores, reduzem os ativos e acabam com o trabalho produtivo.

Enquanto o império cresce, a economia local se contrai, o poder está centralizado no Executivo, o poder legislativo é reduzido e aos cidadãos é negada uma representação efetiva, ou mesmo o poder de veto através de processos eleitorais.

A resposta das massas ao aumento da barbárie

A ascensão da barbárie em nosso meio tem provocado revolta pública contra seus principais executores. As pesquisas de opinião têm reiteradamente encontrado:

(1) Profunda aversão e revolta contra todos os partidos políticos.

(2) Grande desconfiança, nutrida pela maioria da população, contra a elite empresarial e política.

(3) Rejeição, também pela maioria, da concentração de poder corporativo e do seu abuso, principalmente por parte dos banqueiros e financistas.

(4) Questionamento amplo das credenciais democráticas dos líderes políticos que agem a mando da elite empresarial e promovem as políticas repressivas do Estado de segurança nacional.

(5) Rejeição, pela grande maioria da população, da pilhagem do Tesouro nacional para salvação dos bancos e da elite financeira, com a imposição de programas de austeridade regressivos sobre a classe média trabalhadora.

Perspectivas para o socialismo

A ofensiva capitalista teve certamente um grande impacto sobre as condições objetivas e subjetivas da classe média trabalhadora, empobrecendo-a e provocando uma onda crescente de descontentamento pessoal, que ainda não se traduziu numa movimentação anticapitalista massiva, ou mesmo numa resistência dinâmica e organizada.

As grandes mudanças estruturais requerem um melhor entendimento das atuais circunstâncias adversas e a identificação de novas instâncias e meios onde se desenvolvem a luta de classes e de transformação social.

Um problema-chave é a necessidade de se recriar uma economia produtiva e reconstruir uma classe trabalhadora industrial após anos de pilhagem financeira e desindustrialização, não necessariamente para as poluidoras indústrias do passado, mas certamente para novas indústrias que criem e utilizem fontes de energia limpa.

Em segundo lugar, as sociedades capitalistas altamente endividadas necessitam, fundamentalmente, sair do modelo de construção imperial militarista de alto custo em direção a um modelo de austeridade financeira baseado na classe e que imponha os sacrifícios e as reformas estruturais aos setores bancário, financeiro e comercial de grande varejo, que substitui a produção local pela importação de artigos de consumo de baixo custo.

Em terceiro lugar, o enxugamento do setor financeiro e do comércio retalhista exige a melhoria das qualificações dos trabalhadores que serão deslocados ou desempregados, bem como mudanças no setor de TI, de forma a acomodar as próprias mudanças econômicas. Exige, também, a mudança de um paradigma – da renda monetária para o rendimento social –, em que a educação pública e gratuita de alto nível, o acesso universal à saúde e as aposentadorias abrangentes substituirão o consumismo global financiado por dívidas. Isso pode se tornar a base para o fortalecimento da consciência de classe contra o consumismo individual.

Esta é a questão: como passar de uma posição em que a classe trabalhadora se encontra fragmentada e enfraquecida e os movimentos sociais em recuo ou na defensiva a uma posição em que seja possível lançar uma ofensiva anticapitalista?

Vários fatores subjetivos e objetivos já permitem o trabalho nesse sentido. Primeiro, há uma negatividade crescente contra a grande maioria dos atuais operadores políticos e, em particular, contra as elites econômicas e financeiras que estão claramente identificadas como responsáveis pelo declínio nos padrões de vida. Em segundo lugar, há o ponto de vista popular, compartilhado por milhões de pessoas, de que os atuais programas de austeridade são claramente injustos - com os trabalhadores a pagar pela crise que a classe capitalista produziu. Até o momento, no entanto, estas maiorias são mais "anti"-status quo do que "pró"-transformação. A transição do descontentamento privado para a ação coletiva é uma questão em aberto quanto a quem a desencadeará e como o fará, mas a oportunidade está presente.

Existem vários fatores objetivos que podem deflagrar uma mudança qualitativa do descontentamento, deslocando-o da raiva passiva rumo a um maciço movimento anticapitalista. Um "duplo mergulho" na recessão, o fim da atual recuperação anêmica e o início de uma recessão mais profunda e prolongada ou de uma depressão poderiam desacreditar ainda mais os governantes atuais e seus aliados econômicos.

Em segundo lugar, o aprofundamento interminável da austeridade poderá desacreditar a noção atual, difundida pela classe dominante, de que os sacrifícios atuais são necessários para se obterem ganhos futuros, abrindo as mentes e encorajando os corpos a se moverem à procura de soluções políticas, de forma a alcançar ganhos no presente e infligir dor às elites econômicas.

As inesgotáveis e "invencíveis" guerras imperiais que sangram a economia e a classe trabalhadora podem, em última análise, criar uma consciência de que a classe dominante oferece "sacrifícios" à nação sem nenhuma finalidade "útil".

Provavelmente, o efeito combinado de uma nova etapa da recessão, a austeridade perpétua e as estúpidas guerras imperiais acabarão por transformar o mal-estar atual e a difusa hostilidade das massas contra a elite econômica e política em favor dos movimentos socialistas, partidos e sindicatos.
[*] Sociólogo. Ver obras do autor .

Tradução de http://www.correiocidadania.com.br/content/view/4921/9/


Este artigo encontra-se em http://resistir.info/ .

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