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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

terça-feira, junho 26, 2012

Hoje, os EUA – não o Irã – são o principal obstáculo a impedir que se construam abordagem efetivamente multilateralistas e progressistas para superar as dificuldades que tantos países e povos enfrentam, em todo o mundo.



A China falará... (grosso)
17/6/2012, Charles Gray, Global Times, Pequim
Traduzido pelo Coletivo de Tradutores da Vila Vudu

“(...) Aproxima-se mais um prazo crucial: 1º de julho. Nessa data, os EUA estarão obrigados a “castigar” a China por o país ter ignorado as sanções contra o Irã. A China é o único caso em que, até agora, os EUA não concederam a chamada “isenção”. E agora? Washington recolherá a cauda-crista de pavão e concederá a “isenção”? O mais provável é que, sim, sim, sem dúvida. Como preveem os especialistas em Dinheiro, da rede CNN [1] “os EUA não estão em posição que lhes permita desencadear guerra comercial contra a China. Com certeza Obama & Clinton inventarão algum álibi e, sim, a China receberá a isenção [e o que mais exija]”. [2]
A decisão de não garantir à China qualquer tipo de isenção nas sanções unilaterais que os EUA tentam impor contra importadores de petróleo iraniano, considerada à primeira vista, já parece insana.
[Mais bem analisada, é decisão do mais irresponsável e temerário oportunismo]. Vila Vudu
Aquelas sanções, autorizadas pela Lei de Defesa Nacional [ing. National Defense Authorization Act (NDAA)] para o ano fiscal de 2012, visam nações que continuam a importar petróleo do Irã e não demonstraram ao governo dos EUA que tomaram medidas para reduzir suas importações daquele país.
É exigência que, evidentemente, ofende muitos países. De fato, a Lei de Defesa Nacional dos EUA obra para estender a soberania dos EUA a todos os países que aquela lei cita. A lei “determina” e informa à China que os EUA, não a China, decidirão quanto e como as instituições financeiras chinesas gastarão da própria moeda.
Mesmo que se ignore a longa e escandalosa história do ocidente tentar impor controles sobre a economia chinesa, o que aí se vê é indefensável agressão à soberania econômica da China.
Nem nações que, como a Índia, receberam o “favor” da isenção e foram “liberadas” de obedecer aos EUA, têm muito a agradecer aos EUA. A Índia descreveu o ato como regido, exclusivamente pela lei norte-americana é válido, evidentemente, só em território dos EUA. É mais que claro que o governo da Índia não quer que os indianos vejam o quanto o próprio governo curvou-se às exigências descabidas dos EUA.
Nada menos provável do que supor que o governo chinês se deixará apanhar nessa posição de submissão às “ordens” dos EUA. As sanções enfurecerão a opinião pública chinesa, no curto prazo. No longo prazo, serão duro teste à capacidade dos diplomatas chineses, para conviver com os desmandos dos EUA pelo mundo.
Por ironia, a obsessão norte-americana com as tais “sanções” reduzirá a capacidade dos chineses, na luta para convencer o Irã de que mais transparência e mais cooperação promoverão com mais eficácia o interesse dos próprios iranianos.
Além de tudo isso, as consequências financeiras das sanções sempre serão devastadoras para os EUA, ainda mais que para a China. No mínimo, farão aumentar perigosamente a incerteza, nos mercados financeiros. E o risco só aumenta, porque sem dúvida alguma a China retaliará contra instituições financeiras norte-americanas.
No limite extremo, pode acontecer de romperem-se as relações de comércio entre EUA e China. No pior cenário, o mundo será assim lançado de volta à mais desesperadora depressão.
Barack Obama e Hillary Clinton
Mas... o presidente Barack Obama e a secretária de Estado Clinton dos EUA sabem perfeitamente disso tudo e conhecem perfeitamente todos esses riscos. Por que, sendo assim, tomaram essas decisões temerárias? A resposta mais provável é que falam, falam, mas não têm qualquer intenção de realmente tentar impor qualquer tipo de “dever de obedecer” à China.
Tudo leva a crer que o movimento de Obama e Clinton visa, exclusivamente ao cenário doméstico e absolutamente pouco tem a ver com Irã ou China – ou com o mundo real.
Obama enfrentará eleições difíceis e seus adversários têm tentado usar a “questão chinesa” como arma contra ele. Negando qualquer isenção à China, quanto ao “dever” de não importar petróleo iraniano, Obama expõe-se ao ridículo aos olhos do mundo mas – como há quem suponha –se fortalece no plano eleitoral doméstico.
Mais significativo: Obama tem poder, nos termos da mesma Lei de Segurança Nacional, para adiar para depois das eleições a aplicação de sanções. E parece esperar que, reeleito, possa renegociar essa e outras questões, de posição mais forte do que a sua, hoje, quando é mais candidato à reeleição, que presidente dos EUA. Ou o problema de acertar-se com a China ficará para o Republicano que o suceder.
Em outras palavras: a decisão do governo Obama, de negar qualquer isenção à China, na questão das sanções contra o Irã, não é ameaça de mais sanções futuras: não passa, de fato, de movimento “de campanha eleitoral”, para escapar de confronto político direto com outros candidatos.
Nada disso, de fato, reduz o risco de dano potencial grave às relações entre China e EUA.
A primeira questão é a mais visível: sejam ameaças cenográficas ou não, mesmo assim as ameaças de Obama contra a China criam riscos para a economia doméstica chinesa e são agressão direta ao direito de o governo chinês gerir a própria política exterior sem ser chantageado. Não há hoje dúvida alguma de que a China mantém relações comerciais plenas e legítimas com o Irã, sem qualquer infração a qualquer resolução da ONU ou desrespeito a qualquer lei internacional. Infração e erro (além de chantagem) cometem, isso sim, os EUA, ao tentar impor leis norte-americanas e controles norte-americanos e interesses nacionais dos EUA a outras nações soberanas.
Além do impacto de curto prazo, a via de ação pela qual Obama e Clinton estão optando gerará ambiente mundial em que cada dia menos os EUA encontrarão nações dispostas a cooperar, sobretudo se as nações pressentirem que estejam sendo chantageadas ou coagidas a cooperar. Com isso, aumentarão ainda mais as já graves dificuldades que o mundo enfrenta hoje para chegar a soluções multilateralistas para os problemas.
Diferente do que os EUA dizem, o Irã não representa nenhum tipo de ameaça imediata à segurança do mundo. Mas as sanções que os EUA tentam obcecadamente impor, contra interesses e direitos de nações soberanas, como a China e outras, essas, sim, ameaçam a estabilidade da ordem mundial.
Hoje, os EUA – não o Irã – são o principal obstáculo a impedir que se construam abordagem efetivamente multilateralistas e progressistas para superar as dificuldades que tantos países e povos enfrentam, em todo o mundo. 
*redecastorphoto

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