Páginas

Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

terça-feira, junho 26, 2012

Ustra é condenado a indenizar família de Luiz Eduardo Merlino

"Brilhante"
O coronel reformado do Exército Carlos Alberto Brilhante Ustra foi condenado pela Justiça de São Paulo a pagar uma indenização de R$ 100 mil à família do jornalista Luiz Eduardo da Rocha Merlino, morto sob tortura em 19 de julho de 1971 nas dependências do DOI-Codi (Destacamento de Operações e Informações – Centro de Operações de Defesa Interna), órgão de repressão da ditadura então comandado pelo réu.
A sentença foi proferida por Cláudia de Lima Menge, juíza de Direito da 20ª Vara Cível do foro central de São Paulo. Ustra terá que pagar R$ 50 mil a Regina Maria Merlino Dias de Almeida, irmã da vítima, e a Angela Maria Mendes de Almeida, sua companheira na época.
“Evidentes os excessos cometidos pelo requerido, diante dos depoimentos no sentido de que, na maior parte das vezes, o requerido participava das sessões de tortura e, inclusive, dirigia e calibrava intensidade e duração dos golpes e as várias opções de instrumentos utilizados. Mesmo que assim não fosse, na qualidade de comandante daquela unidade militar, não é minimamente crível que o requerido não conhecesse a dinâmica do trabalho e a brutalidade do tratamento dispensado aos presos políticos. É o quanto basta para reconhecer a culpa do requerido pelos sofrimentos infligidos a Luiz Eduardo e pela morte dele que se seguiu, segundo consta, por opção do próprio demandado, fatos em razão dos quais, por via reflexa, experimentaram as autoras expressivos danos morais”, afirma a juíza na sentença.
Segundo Cláudia de Lima Menge, o processo em questão não guarda relação com a Lei de Anistia de 1979, por esta ser “de âmbito exclusivamente penal”. “Não é de olvidar, porém, que até mesmo a anistia assim referendada pela Corte Suprema não está infensa a discussões, tendo em conta subsequente julgamento proferido pela Corte Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (OEA), em que o Brasil foi condenado pelo desaparecimento de militantes na guerrilha do Araguaia, enquadrados os fatos como crimes contra a humanidade e declarados imprescritíveis”, escreve.
Militantes do Partido Operário Comunista (POC), Merlino e Angela Mendes de Almeida estavam clandestinos desde 1968. Em 1971, após um período na França, o jornalista voltou ao Brasil. Em 15 de julho, quando visitava a família em Santos, litoral paulista, foi levado preso por agentes do DOI-Codi.
Segundo relatos de testemunhas, nas dependências do órgão Merlino passou por severas sessões de tortura, que acarretaram sua morte quatro dias depois. Companheiros de prisão, entre eles o ex-ministro da Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República, Paulo Vanucchi, afirmam tê-lo visto com evidentes sintomas de falta de circulação nas pernas, consequência das horas no “pau de arara”.
A versão oficial da sua morte foi de suicídio: ele teria se jogado na frente de um carro quando era transportado ao Rio Grande do Sul para reconhecer colegas militantes.
*comtextolivre

Nenhum comentário:

Postar um comentário