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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

segunda-feira, dezembro 10, 2012

Argentina ou Clarintina

 

Via Rebelion
Aram Aharonian
Tradução do espanhol: Renzo Bassanetti
No embate pela democratização das comunicações argentinas, ao qual se acrescentou a corporação judicial abertamente a favor dos grandes grupos econômico-midiáticos, o oligopólio Grupo Clarín conseguiu uma prorrogação da medida cautelar graças à qual continuará isento de adequar-se às disposições e limites da Lei de Serviços de Comunicação Audiovisual sancionada há três anos. Essa nova legislação prevê que uma pessoa ou empresa pode possuir 24 sistemas de comunicação por cabo, 10 licenças de radiodifusão, - sejam de radio FM, AM ou televisão aberta -, e um sinal de conteúdos (canal a cabo). O Grupo Clarín detém 250 licenças.
A decisão cautelar vencia no dia 7 de dezembro, segundo a Corte Suprema tinha estabelecido no mês de maio passado, quando assinalou que, até aquele momento, o Clarín não tinha demonstrado que houvesse sido violado algum direito essencial, como a liberdade de expressão, e que por isso o expediente aparecia como uma questão de natureza meramente “patrimonial”. Uma questão patrimonial pode ser resolvida mais tarde com uma reparação econômica. A violação de um direito básico, não. Contudo, a Sala 1 da Câmara Cível e Comercial decidiu, na 5a. feira, 6 de dezembro, que continue vigente “até que a sentença definitiva da causa seja ditada”. Ou seja, ela cairá quando o juiz de 1ª instância Horácio Alfonso defina a validade constitucional dos artigos da norma que obrigam a desfazer-se das licenças de rádio e televisão e que definem os parâmetros da concentração de meios.
A Câmara argumentou que a situação mudou em relação à seis meses atrás, quando a Corte se pronunciou para advertir que não se devem prorrogar as medidas cautelares indefinidamente por que elas terminam se transformando em sentenças antecipadas. A Câmara assinalou que uma decisão do juiz Alfonse sobre a questão de fundo já é eminente, por que assim o exigem as diretivas supremas.
Para os integrantes dessa Câmara, levantar a cautelar “quando ainda não está dirimida a impugnação constitucional” apresentada pelo Clarín contra a “obrigação de desinvestir(...) causaria um prejuízo irreparável” se a decisão final fosse favorável à empresa, que se veria na obrigação de ter que ceder parte de seu patrimônio.
O titular da Autoridade Federal de Serviços de Comunicação Audiovisual, Martin Sabbatella, considerou “uma vergonha” a decisão da Câmara Civil e Comercial. “Isso demonstra claramente que essa Câmara termina sendo a equipe jurídica do grupo empresarial Clarín(...). Há uma parte da justiça argentina que não está preparada para enfrentar as corporações, porque está colonizada e responde a esses interesses corporativos”, advertiu.
Sabbatella ressaltou que “é uma barbaridade que uma lei aprovada pelo Congresso por ampla maioria fique travada por uma manobra”. A decisão da Câmara Civil e Comercial está assinada pelos juízes Maria Susana e Francisco de Las Carreras, sobre quem pesa uma denúncia penal e outra no Conselho da Magistratura, por ter viajado a um congresso em Miami organizado pela Certal, uma associação que tem entre seus membros diretores do grupo Clarín. Segundo Sabbatella, essa situação “demonstra que os juízes que viajam a Miami financiados pelo Clarín terminam transformados em membros da sua equipe jurídica.
A sentença da Câmara prorroga a cautelar até que o juiz de primeira instância Horácio Alfonso resolva a questão de fundo, desconhecendo assim o critério de “razoabilidade” apresentado pela Corte Suprema, que fixou o dia 7 de dezembro para sua finalização. É mais grave ainda que a Câmara tenha opinado que o Clarín poderia ter um ano mais para adequar-se à lei após a sentença de fundo.
Para que todos tenham as mesma oportunidades, a Autoridade Federal anunciou que prorrogará a resolução 901 do organismo, que amplia os prazos de adequação para o resto dos grupos de meios, até quando o principal ator do mercado, o Grupo Clarín comece seu processo de adequar-se ao disposto pela lei.
Sem dúvida, a concentração dos meios de comunicação por parte de um pequeno número de empórios econômicos se transformou numa das principais ferramentas do neoliberalismo para o controle ideológico das sociedades. Antes, necessitavam das forças armadas, hoje lhes basta o controle dos meios de comunicação de massa.,
A esse problema, acrescenta-se a impunidade para manipular e esconder de seus acionistas todos os seus interesses econômicos e políticos. Tudo isso é mostrado por eles como uma defesa da liberdade de expressão, transformando esse princípio democrático em uma cartada para seu domínio e o atropelo do direito cidadão de informar e ser informado.
Argentina ou Clarintina?
*GilsonSampaio

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