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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

terça-feira, dezembro 11, 2012

Manifesto dos Intelectuais lançado no Rio de Janeiro

               Dezenas de intelectuais brasileiros se reuniram ontem, no Palácio da Cultura,  no Rio, para o lançamento de um manifesto em defesa do Brasil e da paz mundial, e a criação de um instituto que atue na difusão dessa idéia. Uma comissão, formada por Luis Pinguelli Rosa, Márcio Pochman, Luís Soares, Pedro Celestino, Renato Guimarães, Roberto Amaral, Embaixador Samuel Pinheiro Guimarães e Ubirajara Brito, fez uma análise da situação internacional e da atualidade política interna do Brasil, concluindo que há uma ofensiva antidemocrática no mundo inteiro, diante da crise vivida pelo sistema capitalista. Como no passado, essa crise pode conduzir a novos e extensos conflitos mundiais, e é preciso mobilizar os cidadãos na defesa das liberdades democráticas e da paz.
         A idéia desse manifesto e do Instituto foi de Oscar Niemeyer, que deveria – se não fosse a enfermidade que o levou à morte - estar presente  no encontro de ontem. Por isso mesmo, os que se reuniram no Rio decidiram que o  nome do arquiteto e humanista estará associado à instituição a ser fundada nas próximas semanas.
 

Ditadura montou até dossiê contra Niemeyer

Sem novidades, só o ridículo da ditatura de perseguir e exilar um gênio reconhecido mundialmente como Oscar Niemeyer. Pois é, não surpreendem as revelações dessa reportagem publicada pelo Estadão de ontem, de que o regime militar montou dossiê contra ele e monitorou também os passos do mestre dos arquitetos brasileiros. A ditadura realmente era capaz de tudo, em matéria que ia do rídiculo ao execrável.
Um simples telegrama de Luiz Carlos Prestes a Niemeyer cumprimentando-o pela inauguração de Brasília em 1960, tornou-se uma das principais provas de que o arquiteto era um homem de esquerda. A mensagem terminou se constituindo na principal base  para o Serviço  Nacional de Informações (SNI) pedir em 1973 ao Ministério da Justiça que abrisse processo sigiloso contra ele.
"Nesta data em que Brasília passa a ser a capital do País, envio-lhe em nome de todos os camaradas do nosso Partido nossas congratulações mais efusivas. Sua atividade criadora em Brasília merece nosso maior aplauso, é elevada expressão da capacidade de nosso povo e testemunho da contribuição dos comunistas ao progresso do Brasil. Nosso augúrio - que sabemos ser também o seu - é que Brasília venha a ser no menor prazo possível a capital de um Brasil próspero e feliz, completamente emancipado do jugo imperialista, numa grande e bela cidade, livre de favelas e miséria, capital de um Brasil livre, democrático e socialista. Com nossas saudações patrióticas extensivas a todos seus auxiliares, afetuosamente Luiz Carlos Prestes", diz o telegrama do dirigente do PCB.
Arquiteto era considerado um perigoso homem de esquerda
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Foto: Ricardo Stuckert/Foto de Arquivo PR
No governo do general Emílio Garrastazu Médici (q1969-1975), Niemeyer era alvo dos espiões do regime. Os documentos a respeito e que serviram de base para a reportagem de ontem do Estadão estão em dossiê sobre o arquiteto guardado no Arquivo Nacional. O original do texto (assinado pelo próprio Prestes), segundo explica o próprio SNI, foi apreendido pouco depois do golpe de 1964 em meio a documentos de Prestes - durante décadas secretário-geral do Partido Comunista Brasileiro, o PCB - recolhidos pela repressão no Rio e em São Paulo.
A documentação no Arquivo Nacional contém informes da comunidade de informações sobre o arquiteto e cópias de entrevistas e reportagens a seu respeito na imprensa estrangeira. O PCB nunca adotou a luta armada, desde o início da ditadura manteve sua opção pela via pacífica via pacífica para o socialismo, mas, mesmo assim, Niemeyer era considerado um homem perigoso para o regime.
Outro informe constante no dossiê feito contra Niemeyer dá conta: "Dia 02 Jan 71, às 19,30 horas, foi exibido, na televisão norueguesa, um filme falado em inglês, com elementos colhidos em BRASÍLIA, sobre a obra de OSCAR NIEMEYER, onde este, depois de referir-se em termos elogiosos ao ex-presidente JUSCELINO KUBITSCHEK DE OLIVEIRA e ao engenheiro LUCIO COSTA, confirmou, ostensivamente, ser comunista. Pouco depois, o arquiteto aparece em sua casa de campo, ao lado de uma piscina, demonstrando, inadvertidamente, ser apreciador do conforto do regime capitalista. O filme televisado (sic), a par da propaganda pessoal do arquiteto, constituiu-se numa demonstração negativista da realidade brasileira, pela ênfase dada aos aspectos de pobreza e subdesenvolvimento focalizados (...)."
A documentação inclui, ainda, trecho de entrevista publicada na revista peruana Oiga em seu número 373, de 8 de maio de 1970, no qual Niemeyer dá definição política de si mesmo. Ele afirma: "Sou comunista, você o sabe, mas também sou brasileiro, e é por ser brasileiro que sou comunista".
*comtextolivre
 

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