Manifesto dos Intelectuais lançado no Rio de Janeiro
Dezenas
de intelectuais brasileiros se reuniram ontem, no Palácio da Cultura,
no Rio, para o lançamento de um manifesto em defesa do Brasil e da paz
mundial, e a criação de um instituto que atue na difusão dessa idéia.
Uma comissão, formada por Luis Pinguelli Rosa, Márcio Pochman, Luís
Soares, Pedro Celestino, Renato Guimarães, Roberto Amaral, Embaixador
Samuel Pinheiro Guimarães e Ubirajara Brito, fez uma análise da situação
internacional e da atualidade política interna do Brasil, concluindo
que há uma ofensiva antidemocrática no mundo inteiro, diante da crise
vivida pelo sistema capitalista. Como no passado, essa crise pode
conduzir a novos e extensos conflitos mundiais, e é preciso mobilizar os
cidadãos na defesa das liberdades democráticas e da paz.
A idéia desse manifesto e do Instituto foi de Oscar Niemeyer, que
deveria – se não fosse a enfermidade que o levou à morte - estar
presente no encontro de ontem. Por isso mesmo, os que se reuniram no
Rio decidiram que o nome do arquiteto e humanista estará associado à
instituição a ser fundada nas próximas semanas.
Ditadura montou até dossiê contra Niemeyer
Sem novidades, só o ridículo da ditatura de perseguir e exilar um gênio
reconhecido mundialmente como Oscar Niemeyer. Pois é, não surpreendem
as revelações dessa reportagem publicada pelo Estadão de ontem, de que o
regime militar montou dossiê contra ele e monitorou também os passos
do mestre dos arquitetos brasileiros. A ditadura realmente era capaz de
tudo, em matéria que ia do rídiculo ao execrável.
Um simples telegrama de Luiz Carlos Prestes a Niemeyer cumprimentando-o
pela inauguração de Brasília em 1960, tornou-se uma das principais
provas de que o arquiteto era um homem de esquerda. A mensagem terminou
se constituindo na principal base para o Serviço Nacional de
Informações (SNI) pedir em 1973 ao Ministério da Justiça que abrisse
processo sigiloso contra ele.
"Nesta data em que Brasília passa a ser a capital do País, envio-lhe em
nome de todos os camaradas do nosso Partido nossas congratulações
mais efusivas. Sua atividade criadora em Brasília merece nosso maior
aplauso, é elevada expressão da capacidade de nosso povo e testemunho
da contribuição dos comunistas ao progresso do Brasil. Nosso augúrio -
que sabemos ser também o seu - é que Brasília venha a ser no menor
prazo possível a capital de um Brasil próspero e feliz, completamente
emancipado do jugo imperialista, numa grande e bela cidade, livre de
favelas e miséria, capital de um Brasil livre, democrático e
socialista. Com nossas saudações patrióticas extensivas a todos seus
auxiliares, afetuosamente Luiz Carlos Prestes", diz o telegrama do
dirigente do PCB.Arquiteto era considerado um perigoso homem de esquerda
Foto: Ricardo Stuckert/Foto de Arquivo PR |
No governo do general Emílio Garrastazu Médici (q1969-1975), Niemeyer
era alvo dos espiões do regime. Os documentos a respeito e que serviram
de base para a reportagem de ontem do Estadão estão em dossiê sobre o
arquiteto guardado no Arquivo Nacional. O original do texto (assinado
pelo próprio Prestes), segundo explica o próprio SNI, foi apreendido
pouco depois do golpe de 1964 em meio a documentos de Prestes - durante
décadas secretário-geral do Partido Comunista Brasileiro, o PCB -
recolhidos pela repressão no Rio e em São Paulo.
A documentação no Arquivo Nacional contém informes da comunidade de
informações sobre o arquiteto e cópias de entrevistas e reportagens a
seu respeito na imprensa estrangeira. O PCB nunca adotou a luta armada,
desde o início da ditadura manteve sua opção pela via pacífica via
pacífica para o socialismo, mas, mesmo assim, Niemeyer era considerado
um homem perigoso para o regime.
Outro informe constante no dossiê feito contra Niemeyer dá conta: "Dia
02 Jan 71, às 19,30 horas, foi exibido, na televisão norueguesa, um
filme falado em inglês, com elementos colhidos em BRASÍLIA, sobre a
obra de OSCAR NIEMEYER, onde este, depois de referir-se em termos
elogiosos ao ex-presidente JUSCELINO KUBITSCHEK DE OLIVEIRA e ao
engenheiro LUCIO COSTA, confirmou, ostensivamente, ser comunista. Pouco
depois, o arquiteto aparece em sua casa de campo, ao lado de uma
piscina, demonstrando, inadvertidamente, ser apreciador do conforto do
regime capitalista. O filme televisado (sic), a par da propaganda
pessoal do arquiteto, constituiu-se numa demonstração negativista da
realidade brasileira, pela ênfase dada aos aspectos de pobreza e
subdesenvolvimento focalizados (...)."
A documentação inclui, ainda, trecho de entrevista publicada na revista
peruana Oiga em seu número 373, de 8 de maio de 1970, no qual Niemeyer
dá definição política de si mesmo. Ele afirma: "Sou comunista, você o
sabe, mas também sou brasileiro, e é por ser brasileiro que sou
comunista".
No ZéDirceu
*comtextolivre
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