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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

sexta-feira, junho 05, 2015

O negócio presídios

Modelo carcerário brasileiro não diminui criminalidade, avaliam especialistas

Entre 2005 e 2012, a população carcerária brasileira cresceu 74%; maioria tem entre 18 anos e 29 anose
O aumento da população carcerária brasileira sem uma melhora na percepção de segurança pública pela população demonstra que o modelo carcerário brasileiro está equivocado, na avaliação de dois especialistas ouvidos pela Agência Brasil sobre as conclusões do Mapa do Encarceramento: os Jovens do Brasil, divulgado nessa quarta-feira (3).
(Foto: Agência Brasil)
Segundo o estudo, divulgado pelas secretarias Nacional de Juventude e de Políticas de Promoção da Igualdade Racial e pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud), entre 2005 e 2012, a população carcerária brasileira cresceu 74%. No período, o número de presos subiu de 296.918 para 515.482. A maioria tem entre 18 anos e 29 anos, é negra e cumpre penas entre quatro e oito anos por crimes contra o patrimônio ou ligados às drogas. Cerca de 38% da população carcerária estão presos em caráter provisório, ou seja, ainda não foram julgados. Entre os condenados, enquanto 69% cumprem pena em regime fechado, apenas 31% estão nos regimes semiaberto ou aberto.
“Houve uma explosão no número de prisões que atinge um público muito específico: homens com escolaridade baixa, negros ou pardos e jovens”, disse o coordenador da área de sistemas de Justiça e segurança pública do Instituto Sou da Paz, Bruno Langeani. Para ele, no Brasil, "prende-se muito e mal".
"Não se trata de deixar impunes os autores de crimes menos violentos, mas sim de aplicar uma pena cujos resultados sejam melhores para a sociedade e para o próprio apenado, que terá mais chances de se recuperar. Hoje, os que cometem crimes contra o patrimônio e que poderiam ser punidos com penas alternativas são mantidos presos, enquanto crimes graves, como os homicídios, na maioria das vezes não são esclarecidos”, disse.
“De que adianta discutirmos penas mais severas se conseguimos identificar apenas um de cada dez homicidas, deixando outros nove impunes? É uma discussão que não faz o menor sentido em um país com índices tão baixos de esclarecimento de crimes graves. Mesmo assim, cada vez que há um crime de maior repercussão, o Poder Público responde com propostas de aumento das penas, de endurecimento das leis", completou Langeani.
O pesquisador João Trajano Sento-Sé, do Laboratório de Análise da Violência da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj), é taxativo: o sistema prisional brasileiro funciona mal. “Ele é seletivo e extremamente cruel, pois não ressocializa nem oferece oportunidades de reinserção positiva na sociedade. Estamos encarcerando mais, por mais tempo, sem com isso reduzirmos as taxas de criminalidade. E o mais bizarro é que grande parte desses mais de 500 mil presos já poderia estar em liberdade ou cumprindo penas alternativas. Ou seja, nem mesmo os direitos previstos por leis são garantidos a essas pessoas.”
Defensores da tese de que o endurecimento das penas e a aprovação de leis apresentadas como resposta imediatista à comoção pública diante de casos de repercussão midiática não resolvem os problemas da violência e da segurança pública, Langeani e Sento-Sé são contrários à redução da maioridade penal. “A população não quer um sistema mais ou menos duro. O que os cidadãos cobram é melhorias na segurança pública. Só que temos uma elite política conservadora que identifica os sistemas Judiciário e de execução penal com o mero exercício punitivo e que vem conseguindo convencer parte da população, que está assustada. Daí a associação entre endurecimento das leis e melhoria na segurança pública. Só que essa associação é falha e estão aí os números para provar isso”, disse Sento-Sé.
Para Langeani, atualmente há um crescimento do número de prisões de pessoas portando pequenas quantidades de drogas. “Muitas mulheres têm sido presas tentando ingressar em presídios levando pequenas quantidades de drogas para seus maridos ou companheiros. E esse aumento da população carcerária feminina está associado à nova lei de drogas que, visivelmente, também não está funcionando. Estamos apenas enchendo as cadeias sem diminuir o mercado de drogas, o número de usuários e a violência", acrescentou o coordenador, ao destacar que as prisões atualmente têm servido para criar e fortalecer organizações criminosas.
*http://www.correio24horas.com.br/detalhe/noticia/modelo-carcerario-brasileiro-nao-diminui-criminalidade-avaliam-especialistas/?cHash=52fad5c1dfa5fbc491bcaf2940fbd23b

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