Páginas

Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

sexta-feira, maio 20, 2011

Cresce na Espanha a Revolução dos Indignados

Acompanhe a Revolução dos Indignados, ao vivo,

O movimento que iniciou no dia 15 de maio, chamado 15-M ou a “revolução espanhola”, cresceu quinta-feira com panelaços que reuniram multidões em dezenas de cidades de todo o país para exigir a mudança de um sistema que consideram injusto. A revolta cresce a cada hora. Começou com uma convocatória nas redes sociais e internet para repudiar a corrupção endêmica do sistema e a falta de oportunidades para os mais jovens. A também chamada Revolução dos Indignados acusa, pela situação atual, o FMI, a OTAN, a União Europeia, as agências de classificação de risco, o Banco Mundial e, no caso da Espanha, os dois grandes partidos: PP e PSOE.
A Junta Eleitoral Central da Espanha proibiu em todo o país qualquer manifestação desde a zero hora de sábado até às 24 horas de domingo, dia das eleições municipais, em uma clara alusão às mobilizações do movimento cidadão Democracia Real Já que, desde o último domingo, ocorrem em repúdio ao modelo político e econômico vigente e que já se espalharam em escala nacional.
Alfredo Peréz Rubalcaba, ministro do Interior, declarou que o governo só esperava o pronunciamento da junta eleitoral para decidir se ordena à polícia dispersar os manifestantes. Enquanto isso, milhares de cidadãos indignados na Porta do Sol, em Madri, na Praça da Catalunha, em Barcelona, na Praça do Pilar, em Zaragoza, e no Parasol da Encarnação, em Sevilla, entre outras, voltaram a romper o cerco policial e, uma vez mais, repudiaram a política, banqueiros e empresários.
O movimento que iniciou no dia 15 de maio, chamado 15-M ou a “revolução espanhola”, cresceu quinta-feira com panelaços que reuniram multidões em dezenas de cidades de todo o país para exigir a mudança de um sistema que consideram injusto. A revolta cresce a cada hora. Começou com uma convocatória nas redes sociais e internet para repudiar a corrupção endêmica do sistema e a falta de oportunidades para os mais jovens e acabou se estendendo para a comunidade espanhola na Itália, Inglaterra, Estados Unidos e México, entre outros países.
No quinto dia de mobilizações a afluência aumentou sensivelmente, sobretudo em Madri e Barcelona, onde dezenas de milhares entoaram palavras de ordem durante horas. Uma delas advertia: se vocês não nos deixam sonhar, nós não os deixaremos dormir.
Os manifestantes desenvolveram métodos de organização através de comissões por setores – saúde, alimentação, meios de comunicação, etc. -, que decidem cada atividade. Nas assembleias gerais decide-se a estratégia e busca-se uma mensagem política unificada que mostrem as principais razões de descontentamento e protesto. Na quinta-feira, por exemplo, decidiu-se manter a mobilização até o próximo domingo, quando ocorrem as eleições locais, e, o mais importante, confirmar a convocatória para a manifestação deste sábado.
Mais tarde, a Junta Eleitoral Central declarou ilegais as concentrações, ao considerar que elas não se ajustam à lei eleitoral e excedem o direito de manifestação garantido constitucionalmente. De fato, desde o início da semana, todas as mobilizações, concentrações e marchas da “revolução espanhola” foram declaradas ilegais pela Junta Eleitoral de Madri. Em resposta, o número de indignados se multiplicou.
Depois de conhecer a decisão da Junta Eleitoral Central, o movimento cidadão decidiu simplesmente manter o acampamento, ao mesmo tempo em que ecoou um grito unânime: não nos tirarão daqui, vamos ganhar esta revolução. Em seguida, foi lido o manifesto original do movimento em uma dezena de idiomas. O texto aponta a classe política e os meios de comunicação eletrônicos como os grandes aliados dos agentes financeiros, os causadores e grandes beneficiários da crise. Advertem que é preciso um discurso político capaz de reconstruir o tecido social, sistematicamente enfraquecido por anos de mentiras e corrupção. “Nós, cidadãos, perdemos o respeito pelos partidos políticos majoritários, mas isso não equivale a perder nosso sentido crítico. Não tememos a política. Tomar a palavra é política. Buscar alternativas de participação cidadã é política”.
A também chamada Revolução dos Indignados acusa, pela situação atual, o Fundo Monetário Internacional, a Organização do Tratado do Atlântico Norte, a União Europeia, as agências de classificação de risco, o Banco Mundial e, no caso da Espanha, os dois grandes partidos: o direitista Partido Popular (PP) e o Partido Socialista Operário Espanhol (PSOE), de centro-esquerda.
A reação da direita
Desde a esquerda, há tentativas de aproximação aos indignados. O líder do governo, José Luis Rodríguez Zapatero, disse que é preciso escutar e ter sensibilidade porque há razões para a expressão desse descontentamento e dessa crítica. O líder da Esquerda Unida, Cayo Lara, defendeu o fim da submissão e do bipartidarismo, propiciado pela atual lei eleitoral.
Mas o setor duro da direita política e midiática reclamou com insistência a atuação policial para acabar com todas as mobilizações, sobretudo na Porta do Sul, e pediu inclusive ao Ministério do Interior para que adotasse meios violentos para assegurar esse fim. Uma das imagens do dia (quinta-feira) foi a do ex-ministro da Defesa durante o governo de José María Aznar, Federico Trillo, insultando com o dedo um grupo de cidadãos da revolução dos indignados.
As desqualificações mais fortes vieram, porém, dos meios de comunicação conservadores e da televisão pública de Madri, que acusaram o movimento de ser comunista, socialista, antissistema e de ter relação com o ETA. Um dos ideólogos da direita, César Vidal, foi mais além e depois de chamar, depreciativamente os manifestantes de “perroflautas” (tribo urbana também conhecida como ‘pés pretos’, formada por punks, anarquistas, hippies e ‘gente desocupada’), assegurou que estes jovens mantém contato regular com o Batasuna-ETA e que receberam cursos de guerrilha urbana, da Segi (organização de juventude da esquerda basca).
O movimento cidadão tem seu próprio canal de televisão, que transmite sem cessar as imagens da Porta do Sul (www.solttv.tv).
Armando G. Tejeda, do La Jornada
*cartamaior

Nenhum comentário:

Postar um comentário