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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

terça-feira, maio 22, 2012

De ex a anti-esquerdistas

À direita, Carlos Lacerda, o maior exemplo de um ex-esquerdista

Por Emir Sader

Isaac Deutscher tem um artigo que ele intitula “De hereges a renegados”, delineando o caminho de gente que começa rompendo com teorias e posições esquerdistas, para terminarem como furibundos anti-esquerdistas. São figuras que povoam a direita de todo o mundo, ao longo do tempo.

Alguns se valeram do stalinismo para terminarem condenando a Lenin e, finalmente, a Marx e ao marxismo. Não por acaso uma proporção não desprezível deles teve origem trotskista, para absolutizar o “totalitarismo stalinista”, passando a identificá-lo com o nazismo e dali estão já a um passo do liberalismo e do anti-comunismo.

Há os tipos padrão, os que foram de esquerda, militantes mesmo, de repente “se arrependem”, largam tudo, renegam, denunciam seu passado e seus companheiros, os ídolos em que acreditaram cegamente, para se entregar de armas, bagagens e, frequentemente, emprego, para a direita.

Alguns se mantem na esquerda, no seu espaço mais moderado, com um tom fortemente anti-esquerdista, denunciando o que não seria “democrático” em correntes da própria esquerda. São adeptos fortes de alianças com correntes do centro e mesmo da direita, tendem a diluir as distinções entre direita e esquerda.

Outros, os casos mais conhecidos, se tornam militantes da direita, de suas correntes mais fundamentalistas, no velho estilo anti-comunista da guerra fria. Ganham espaços na mídia de direita – desde direção de revistas a colunas em jornais, convites para a televisão – como prêmio pela sua adesão.

Há ainda escritores, intelectuais, músicos, decadentes, em triste fim de carreira, que abandonam posturas rebeldes que tiveram no passado para submeter-se aos donos do poder e dos meios de comunicação em troca de espaços para escrever, prêmios, elogios, que confirmam sua perda de dignidade no fim da carreira.

Fonte: Blog do Emir
*observadoressociais

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