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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

segunda-feira, maio 07, 2012

Partidos pró-austeridade não conseguem maioria na Grécia

Com 95% dos votos contados, os resultados mostram que o Nova Democracia e o PASOK terão obtido 32%. O líder do Syriza, a coligação de esquerda que quadriplicou os votos e alcança o segundo lugar na eleição, propõe um governo de esquerda para romper com o memorando e diz que "Merkel tem de perceber que as políticas de austeridade sofreram uma grande derrota". Resultados na Grécia são um “sinal importante que o povo grego dá à Europa”, afirmou a eurodeputada do Bloco Marisa Matias. (Notícia em atualização.)
Alexis Tsipras na declaração da noite eleitoral. Foto Orestos Panagioutu/EPA

O resultado das eleições gregas representa um autêntico terramoto político: os dois partidos da troika (Nova Democracia e PASOK) sofreram uma queda acentuada em relação às eleições de 2009, com os socialistas a baixarem 30% e os conservadores 14%. A coligação Syriza, que se opõe ao memorando da troika, confirma-se como a segunda força política grega e a primeira da esquerda. Alexis Tsipras, o líder da coligação, diz que o resultado de hoje mostra que os gregos e os europeus querem "cancelar o memorando da barbárie" a que a troika tem sujeitado o seu país nos últimos anos. Quando os líderes políticos fizeram as suas declarações, havia incerteza sobre se os partidos apoiantes do memorando serão minoritários no parlamento grego - mesmo com os 50 deputados que são automaticamente atribuídos ao partido vencedor, a Nova Democracia. Na sua declaração aos apoiantes, Tsipras propôs a formação de um governo de esquerda e disse que esta eleição é "uma mensagem de derrube" do governo da troika.
"A nossa proposta é a de um governo de esquerda que, com o apoio do povo irá recusar o memorando e pôr fim ao rumo pré-determinado do país para a miséria", afirmou Tsipras, que disse estar certo que a subida meteórica do Syriza não se deve a uma pessoa ou partido em especial, mas a esta proposta que repetiu na campanha eleitoral. A coligação parceira do Bloco de Esquerda no Parlamento Europeu e no Partido da Esquerda Europeia - de que Tsipras é vice-presidente - venceu as eleições em onze círculos eleitorais, incluindo a capital Atenas.
O líder do PASOK falou antes de Tsipras e reagiu à derrota histórica - o partido deve perder mais de dois terços dos votos que teve na última eleição - dizendo que procurará formar um governo com os partidos que apoiam o memorando. Evangelos Venizelos disse estar certo que os resultados deste domingo "excluem o velho sistema dos dois partidos" no governo.
Antonis Samaras, líder do partido mais votado, reagiu aos resultados conhecidos com duas condições para dar início à formação do governo: a manutenção do euro e a mudança das políticas do memorando da troika para "ter crescimento e dar alívio à sociedade grega".
Os resultados eleitorais - numa altura em que estão contados 96% dos votos -  dão 19% para a Nova Democracia, 16,7% para o Syriza, 13,3% para o PASOK, 10,5 para os Gregos Independentes, 8,4% para o KKE (PC grego), 6,9% para os neonazis da Aurora Dourada e 6,1% para a Esquerda Democrática. A extrema-direita do LAOS, que participou e depois rompeu com o governo da troika, não deverá eleger deputados, obtendo 2,9%. A abstenção está estimada em 35%. A Nova Democracia vence em 38 círculos eleitorais e o Syriza em 13, mas a coligação de esquerda ganha nos mais populosos, incluindo todos os que elegem mais de dez deputados. O PASOK ganha as eleições em quatro círculos e o KKE sai vencedor em apenas um.
Em comunicado, o KKE já veio rejeitar a proposta do Syriza, classificando esta força de social-democrata e acusando-a de servir para impedir a radicalização da sociedade grega. Para a secretária-geral Aleka Papariga, o resultado do partido não foi uma surpresa, mas a distribuição dos votos indica que o KKE não conseguiu mobilizar o sentimento antitroika do povo grego desta eleição, nem mesmo nos tradicionais bstiões eleitorais comunistas, perdendo votos nas zonas urbanas, onde disputa deputados com os neonazis. O surgimento em força da Aurora Dourada - sobretudo no voto urbano e nos bairros populares - veio abalar a política grega.
 
Resultados na Grécia são um “sinal importante que o povo grego dá à Europa”
“Já felicitámos o dirigente e o candidato da coligação de esquerda, com quem temos excelentes relações e com quem temos feito um caminho conjunto no sentido de combater esta Europa de austeridade”, informou Marisa Matias.
A eurodeputada do Bloco de Esquerda considera que, com estes resultados, o povo grego “rejeitou a deriva neoliberal de austeridade”. “O que é muito importante porque é um sinal claro de que o povo grego está aberto a que outras propostas surjam, que não sejam sempre neste mesmo caminho”, disse, sublinhando ainda que “rejeitou uma outra, de rejeitar o projeto europeu, porque a Europa pode ser outra coisa”.
Para Marisa Matias, porque “nunca colocaram a hipótese da saída do Euro, nem da União Europeia, mas antes lutaram por um projeto europeu que seja mais solidário e mais consistente”, os gregos dão “um sinal muito importante quer à Europa, quer a Portugal”, que está “numa situação muito semelhante à da Grécia”.
*Turquinho

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