Páginas

Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

terça-feira, outubro 23, 2012

O engaiolamento tucano



 


A iminência de uma derrota histórica na cidade que consideravam sua reserva de mercado têm levado alguns observadores a fazer um trabalho vergonhoso em defesa da candidatura de José Serra à prefeitura de São Paulo. 

Em vez de defender José Serra, o que seria natural na reta final da eleição, eles procuram levantar o fantasma da ameaça de um avanço da hegemonia do PT no país inteiro. 


Enquanto acreditavam que seu candidato era favorito, diziam que a polarização política era ótima, que o conflito ideológico ajudava a formar a consciência do eleitor. 


Mas agora, diante de pesquisas eleitorais constrangedoras, querem mudar o jogo de qualquer maneira. 


Paulo Moreira Leite no site da Época 


É um comportamento arriscado e pode ser contraproducente. Do ponto de vista democrático, o PT só chegou ao poder de Estado, em qualquer instância, pelo voto direto. 


Bem ou mal, é o único dos grandes partidos brasileiros – já existentes na época — que pode exibir essa condição. Claro que você pode discutir a recusa em votar em Tancredo Neves, em 1984. 


Pode dizer que foi radicalismo, esquerdismo, sei lá. Mas é possível reconhecer que naquele momento da transição os petistas defenderam um princípio de respeito a vontade popular que vários adversários – por uma esperteza que em vários casos pouco tinha a ver com patriotismo desinteressado – logo iriam trocar por um cargo no ministério. 


Essa postura conservadora contra Haddad retoma os velhos fantasmas do perigo vermelho, tão primitivos como tantas mitologias de quem saiu colonizado pelos anos de Guerra Fria. 


Reflete um medo aristocrático de quem imaginava que tinha transformado São Paulo em seu quintal eleitoral e agora se vê sem respostas para as grandes parcelas da população. 


Depois de criticar o PT pelos Céus de Marta Suplicy, a campanha tucana fala em Céus do Serra. Depois de criticar o bilhete único, o PSDB aderiu a ele. Criticou Haddad pelo bilhete único mensal, mas agora lançou sua própria versão do mesmo bilhete. 


Depois de passar a campanha pedindo que a população tivesse pena de Gilberto Kassab, nossos analistas descobrem que o continuismo não está com nada e, para não perder embalo, dizem que é uma tendência para 2014 e já ameaçam Dilma. 


Levantar o fantasma de um perigo difuso e ameaçador é um dos mais conhecidos truques da comunicação moderna. 


Revela desprezo pelo conhecimento e pela inteligência do eleitor, procurando convencer a população com argumentos inconscientes, de natureza emocional. 


A postura pode ser resumida assim: quando não dá mais para falar em bolo nem em brioches, como fez Maria Antonieta diante da plebe rude, vamos para lágrimas e o sentimentalismo. 


O pensamento aristocrático e conservador do século XIX, quando a aristocracia descobriu que o voto popular poderia produzir resultados desagradáveis e inesperados, foi construído assim. 


Pensadores como Gustave Le Bon afirmavam, literalmente, que a multidão “ou não conseguia raciocinar, ou só conseguia racionar de forma errada.” 


O truque principal, nesse comportamento, era evitar referências claras e diretas. Por motivos fáceis de explicar, nunca se diz: perigo de que? Por que? Grita-se: “eu tenho medo,” como fez Regina Duarte, em 2002. 


Mas pelo menos ela tinha sido a namoradinha do Brasil… 


Como bem lembrou Fernando Rodrigues, a partir de 1994 o PSDB tornou-se um partido rico e poderoso. Deixou essa condição, pela vontade livre e direta do eleitorado. 


Em nenhum momento o PSDB deixou de ter colunistas e articulistas de pena amiga para descrever suas virtudes perante a população, com uma generosidade jamais exibida em relação a nenhum outro adversário. 


A dificuldade é que, em sua passagem pelo poder federal os tucanos não deixaram nenhuma recordação duradoura na defesa dos mais pobres e dos assalariados em geral. 


Foi por isso que perderam três eleições consecutivas, sem jamais exibir concorrentes competitivos. 


Em 2002, quando o governo de FHC chegou ao fim, sua popularidade era negativa. 


A inflação passara dos dois dígitos, o desemprego havia disparado, a economia estava num abismo financeiro e é claro que, já então, culpava-se o perigo vermelho por isso. 


Quanto aos métodos de governo, não sejamos ingênuos nem desmemoriados. 


Se você não quer usar a palavra aparelhamento, poderia falar, então, em engaiolamento tucano. É um sistema realmente eficiente, já que, em quatro anos, promoveu:  


a) mudanças nas regras eleitorais estabelecidas pela Constituição; 


b) um esquema conhecido como mensalão, matriz dos demais; 


c) um procurador geral da República dos tempos de FHC era conhecido como “engavetador”geral da República; 


Embora goste de lembrar que o PT votou contra o Plano Real assinado por Itamar Franco, o PSDB prefere esquecer que, ao retornar ao governo de Minas Gerais, o ex-presidente rompeu com FHC e chegou a mobilizar a PM para impedir que Brasília privatizasse a usina de Furnas. 


Foi para tentar derrotar Itamar, político muito popular no Estado, que o PSDB inventou o mensalão de Marcos Valério, colocando de pé um esquema que arrecadou mais de R$ 200 milhões para as agências ligadas ao esquema. 


Nem assim o esquema funcionou e, como acontece nas democracias, venceu o candidato que era melhor de voto. 


Mesmo derrotado – a democracia tem disso, né, gente? – o PSDB empurrou a dívida do esquema com a barriga, com ajuda de verbas liberadas – olha a coincidência ! – pelo mesmo cofre do Visanet. 


Quando Aécio recuperou o governo de Minas, Valério voltou a ser premiado com novos recursos, informa Lucas Figueiredo, no livro O Operador. Conforme demonstrou a CPI dos Correios, dirigida por aliados do PSDB, havia farta distribuição de recursos públicos na campanha tucana. 


Num lance de peculiar ousadia, foram retirados R$ 27 milhões da própria Secretaria da Fazenda do Estado. A verdade é que o mensalão mineiro foi feito com tanta competência – ou seria melhor empregar o termo periculosidade? – que jamais foi descoberto. 


Até surgiram denúncias, mas eles nunca foram investigados. 


Chegou-se ao mensalão mineiro por causa do braço petista de Marcos Valério. 


Se não fosse por ele, nem saberíamos que teria existido. Isso é que engaiolamento, vamos concordar. Funciona mesmo depois que o PSDB deixou o poder. 


Enquanto o Supremo condena o mensalão petista com argumentos deduzidos e não demonstrados, os tucanos seguem no pão de queijo. Ninguém sabe, sequer, quantos serão julgados. Nem quando. 


Agora vamos reconhecer: Fernando Haddad assumiu a liderança folgada nas pesquisas como um bom candidato deve fazer. Veio do zero, literalmente, e ganhou eleitores na medida em que tornou-se conhecido. 


O apoio de Lula não é importante, apenas, porque lhe garante um bom patamar de votos. Essa é uma visão eleitoreira da política. Esse apoio mostra que é um candidato com origem e história e isso é importante. Dá uma referência ao eleitor. 


Num país onde os sábios da década passada adoravam resmungar com frases feitas sobre a falta de partidos “legítimos”, com “história”, com “programa,”etc, é difícil negar que o PT fez sua parte. 


Você pode até achar uma coisa detestável. Pode dizer que o PT é um partido anacrônico, que “traiu o discurso ético” e só faz mal ao país. Mas tem de admitir que não é Haddad, como Dilma já mostrou em 2010, quem tem problemas com a própria história. E isso, na construção de uma democracia, é um bom começo. Falta, agora, a outra parte. 


Caso as urnas confirmem o que dizem as pesquisas de intenção de voto, a vitória de Haddad só irá demonstrar a dificuldade da oposição em mostrar que poderia fazer um governo melhor. 


O debate político é este. O resto é propaganda.


do blog #youPode

O resgate de São Paulo - por Emir Sader!


O resgate de São Paulo - por Emir Sader, do seu blog, na Carta Maior 


São Paulo, uma das cidades mais extraordinárias do mundo, se tornou uma cidade triste, cinzenta, cruel, de exclusão, de discriminação, de intolerância. 


Tornou-se a cidade mais injusta do Brasil, pela brutal polarização entre a mais desenfreada riqueza e os maiores polos de pobreza, de miséria, de abandono do Brasil. A isso ficou reduzida nossa querida São Paulo nas mãos da sua elite e dos partidos que a representam. 


A chance de seu regate é agora. 


Pelo desgaste das políticas da direita e pela conjunção de fatores que levou Fernando Haddad a liderar as pesquisas. Não por acaso o resgate é comandado por um ex-estudante da USP e um ex-operario metalúrgico do Abc – algumas das grandes marcas que de São Paulo, de que nos orgulhamos tanto. 


São Paulo foi guindada, pelas mãos da sua direita, à condição de uma cidade que renega o que ela tem de melhor. 


Renega a diversidade, renega os movimentos sociais, renega os trabalhadores nordestinos – que construíram, com suas mãos e seu sofrimento, a riqueza de São Paulo -, renega a cultura, renega sua relação com o Brasil, renega o seu povo. 


Uma São Paulo que virou as costas para o outros estados, virou as costas para Brasil. 


Uma São Paulo que tentaram manter à margem do maior processo de democratização econômica e social que o país já viveu. 


À margem do reconhecimento e extensão dos direitos básicos a todos os cidadãos brasileiros, antes marginalizados pelos governantes, especialmente no governo tucano acentuou a desigualdade, a miséria e a pobreza no Brasil. 


Ao invés de “locomotiva da nação”, como apregoa a velha elite paulista, tornou-se objeto de vergonha nacional – pela miséria, pela discriminação, pelo racismo, pela violência policial e dos grupos extermínio, pela decadência de seus sistemas de educação e de saúde pública, entre tantas outras vergonhas. 


Agora chegou a hora do resgate de São Paulo. 


Chegou a hora de colocar São Paulo no mesmo processo que tem feito o Brasil avançar, pela primeira vez, na superação da sua maior chaga – o de ser o pais mais desigual do continente mais desigual do mundo. 


Chegou a hora, as condições estão dadas, se juntam as prementes necessidades com as excelentes perspectivas. 


Vamos, todos ao resgate de São Paulo. Essa cidade carece e merece esse resgate. 


O povo paulistano necessita. O Brasil precisa de uma São Paulo justa, humana, solidária. 


Vamos ganhar para realizar, juntos o resgate de São Paulo. 


Postado por Emir Sader


do blog Guerrilheiros do Entardecer
*cutucandodeleve

Nenhum comentário:

Postar um comentário