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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

quinta-feira, maio 27, 2010

Ele é um jênio.

Há lógica na sua loucura” (Shakespeare, Hamlet, Ato 2o, cena 2).

Serra diz uma besteira por dia.

Ele é um jênio.

A desta quarta-feira foi acusar – implicitamente – o presidente Evo Morales de fazer parte da quadrilha que exporta cocaína para o Brasil.

Clique aqui para ler: “Depois da Argentina, o Serra quer agora invadir a Bolívia”

Ele já tinha dito que o Mercosul é uma fraude e, ao corrigir, fez-se pior que o soneto: disse que ia “flexibilizar” a fraude. Clique aqui para ler!

Serra já tinha dito outras barbaridades do mesmo corte preconceituoso: os “migrantes” são os responsáveis pelos baixos índices de aproveitamento das escolas públicas paulistas.

Na Móoca, ele conseguia se relacionar “normalmente” com os nordestinos.

A lógica da “loucura” de Hamlet é o preconceito.

É atribuir à Bolívia o consumo de cocaína em São Paulo.

O inferno são os outros.

Como os americanos.

Que não coíbem o consumo de cocaína em Nova York e põem a culpa na Colômbia.

O problema está em São Paulo – o consumidor - e, não, na Bolívia.

Ou São Paulo não consome cocaína ?

Só o Rio consome…

E quem disse que 90% da cocaína vendida no Brasil vem da Bolívia ?

Onde ele arrumou esse número ?

Isso é chute.

E como atribuir a culpa “às autoridades” bolivianas, ou seja, a Evo Morales.

Ou ele não distingue os produtores de coca do Altiplano da Bolívia – que Morales representa – dos traficantes de São Paulo ?

É tudo a mesma coisa ?

(Não se esquecer do que disse o especialista na matéria, o colombiano Abadia: a melhor maneira de combater o narcotráfico em São Paulo é fechar a delegacia do Serra que combate o narcotráfico, o Denarc.)

Não, isso tudo não é uma besteira qualquer.

Nem uma loucura.

Isso tudo tem lógica.

É o preconceito.


Contra os bolivianos.

(Que contribuem, como trabalhadores, para a riqueza de São Paulo.)

Contra os argentinos.

Contra os nordestinos, os “migrantes”.

Isso não é uma besteira.

Isso é um preconceito em busca de votos – colher na horta da extrema direita.

É a carta que Sarkozy jogou na França e que o movimento Tea Party joga nos Estados Unidos.

Não tem nada de loucura.

É outro departamento e outra enfermaria.

(Ou artigo do Código Penal.)

Em tempo: acabo de ouvir na CBN, a rádio que troca a notícia, uma entrevista com uma senhora que usava a língua espanhola. Deu a entender que, de fato, o presidente Morales é “cúmplice”. Ela, porém, deu uma informação fundamental: Morales expulsou da Bolívia, há dois anos, a DEA (Drug Enforcement Agency) americana. Êpa, êpa, aí tem coisa. O Serra não prega prego sem estopa. A declaração “louca” tem outra face, lógica: o reles entreguismo. Levar a DEA de volta à Bolívia.


Paulo Henrique Amorim

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