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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

quarta-feira, maio 26, 2010

Receita de golpe






Receita de golpe

Como está o clima hoje? Vai chover? Vai fazer calor? Golpe militar, para muitos, é questão de clima. "Não é possível um golpe militar, hoje, no Brasil, porque não há clima", dizem.

Como se sabe, quem depende de clima é agricultor. Golpes de Estado precisam de oportunidade, e oportunidade pode simplesmente aperecer ou, então, ser criada. A mistura certa de ingredientes, alguns previa e adredemente colocados (v.g., art. 142 da CRFB) com outros anexados na hora certa e, "voila", eis a oportunidade! Mas... como fazer para hondurar um golpe?

Hondurar significa fazer um golpe militar parecer ser legal e constitucional. Note que, em Honduras, a Suprema Corte deu total aval ao golpe. Mas como...??? Vamos à nossa receita de "Golpe à Hondurenha":

INGREDIENTES:

a) Um ou mais partidos que apresentem reclamações (no nosso caso, contra o(a) candidato(a) da preferência do povo);
b) Um ou mais procuradores do MP Eleitoral (para oferecer a denúncia que vise impedir a inscrição, diplomação, posse, ou ainda a cassassão do candidato do povo);
c) Um Judiciário (para acatar a denúncia do MPE e legitimar o golpe);
d) Uma mídia nativa, totalmente simpatizante do golpe (para dar um verniz de legitimidade ao golpe);
e) Um povo inconformado e revoltado com o golpe (terá que ir às ruas protestar. Se não for, o golpe estará consumado, porém não será o legítimo " à Hondurenha") e
f) Uma Constituição que preveja a intervenção das forças armadas para o cumprimento da lei e reposição da ordem por determinação do Judiciário (art.142 da CRFB).

JUNTANDO OS INGREDIENTES:

* O ingrediente "a" é fácil. Já está no caldeirão faz tempo (PSDB, DEM, PPS...).
* O ingrediente "b" acaba de chegar na cozinha (olá, Sra. Vice-Procuradora-Geral Eleitoral, Sandra Cureau).
* O ingrediente "c" conta com algumas especiarias que costumam agridir o paladar da maioria, mas já é de todos conhecido. Não é difícil de encontrar e há tempos está na despensa podendo algumas das especiarias serem usadas a qualquer hora, dependendo da que você escolher.
* O ingrediente "d" não é bem um ingrediente. Está mais para o nosso fogão. Sempre esteve na cozinha soltando fogo pelas ventas e é um veterano em receitas de golpes (Globo, Veja, Folha, Estadão, Época...).


Juntamos os ingredientes "a", "b", e "c", ligamos o "d" e já podemos ver um golpe formado! Ainda não é o militar/hondurenho. Até aqui, aprendemos a fazer um golpe civil (o mais simples). Para chegarmos ao militar\à hondurenha, devemos acrescentar, agora, o ingrediente "e". Este ingrediente é muito importante para essa nova etapa. Serão necessárias manifestações, greves, passeatas, acampamentos nas portas dos palácios, protestos, enfim, algo que irá reagir com o ingrediente "d" para que este, por sua vez, desencadeie uma reação junto ao ingrediente "c". Esta última reação irá fazer surgir o ingrediente "f".

O INGREDIENTE "F":

O ingrediente "f" foi colocado na despensa da nossa cozinha em 1988. Muitas pessoas (os constituintes) colocaram coisas e mais coisas que lhes pareciam oportunas e convenientes (não é Sr. Jobim?) na nossa despensa, sendo que uma delas é o Art.142, "caput" da nossa constituição. Eis a descrição do ingrediente "f":
"Art. 142. As Forças Armadas, constituídas pela Marinha, pelo Exército e pela Aeronáutica, são instituições nacionais permanentes e regulares, organizadas com base na hierarquia e na disciplina, sob a autoridade suprema do Presidente da república, e destinam-se à defesa da Pátria, à garantia dos poderes constitucionais e, POR INICIATIVA DE QUALQUER DESTES, da lei e da ordem."

Ou seja: qualquer dos poderes constituídos brasileiros (Executivo, Legislativo e JUDICIÁRIO) pode convocar as Forças Armadas para o restabelecimento da Lei e da ordem. Eis aí o segredo culinário hondurenho!

FINALIZANDO:

Seguindo nossa receita, o ingrediente "c" determina a intervenção militar baseado no ingrediente "f" e... tchan, tchan, tchan, tchannnn!!! Está pronto um legítimo "golpe à hondurenha". Os militares agem sob o manto da legalidade, colocam outra pessoa qualquer no poder (quem seria...?) e o produto final passa a se chamar " democracia". Agora é só servir com golpes de cacetete, choques na genitália, desaparecimentos ou o que você inventar. Os acompanhamentos podem ser vários. No Brasil usou-se muito o pau-de-arara. A criatividade culinária, nesses casos, não tem limites...

ADVERTÊNCIA!

Apesar de parecer simples, esta receita nem sempre funciona. Qualquer descuido e os ingredientes poderão ficar irremediavelmente imprestáveis para nova tentativa, devendo os mesmos serem jogados, imediatamente, no lixo!

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