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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

sábado, agosto 07, 2010

CANDIDATOS NÃO DEBATEM DEMOCRATIZAÇÃO DA MÍDIA






Liberdade de expressão: o “efeito silenciador” da grande mídia


Venício Lima, na Carta Maior

Desde a convocação da 1ª. Conferência Nacional de Comunicação (CONFECOM), em abril de 2009, os grandes grupos de mídia e seus aliados decidiram intensificar a estratégia de oposição ao governo e aos partidos que lhe dão sustentação. Nessa estratégia – assumida pela presidente da ANJ e superintendente do grupo Folha – um dos pontos consiste em alardear publicamente que o país vive sob ameaça constante de volta à censura e de que a liberdade de expressão [e, sem mais, a liberdade da imprensa] corre sério risco.
Além da satanização da própria CONFECOM, são exemplos recentes dessa estratégia, a violenta resistência ao PNDH3 e o carnaval feito em torno da primeira proposta de programa de governo entregue ao TSE pela candidata Dilma Roussef (vide, por exemplo, a capa, o editorial e a matéria interna da revista Veja, edição n. 2173).
A liberdade – o eterno tema de combate do liberalismo clássico – está na centro da “batalha das idéias” que se trava no dia-a-dia, através da grande mídia, e se transformou em poderoso instrumento de campanha eleitoral. Às vezes, parece até mesmo que voltamos, no Brasil, aos superados tempos da “guerra fria”.
O efeito silenciador
Neste contexto, é oportuna e apropriada a releitura de “A Ironia da Liberdade de Expressão” (Editora Renovar, 2005), pequeno e magistral livro escrito pelo professor de Yale, Owen Fiss, um dos mais importantes e reconhecidos especialistas em “Primeira Emenda” dos Estados Unidos.
Fiss introduz o conceito de “efeito silenciador” quando discute que, ao contrário do que apregoam os liberais clássicos, o Estado não é um inimigo natural da liberdade. O Estado pode ser uma fonte de liberdade, por exemplo, quando promove “a robustez do debate público em circunstâncias nas quais poderes fora do Estado estão inibindo o discurso. Ele pode ter que alocar recursos públicos – distribuir megafones – para aqueles cujas vozes não seriam escutadas na praça pública de outra maneira. Ele pode até mesmo ter que silenciar as vozes de alguns para ouvir as vozes dos outros. Algumas vezes não há outra forma” (p. 30).
Fiss usa como exemplo os discursos de incitação ao ódio, a pornografia e os gastos ilimitados nas campanhas eleitorais. As vítimas do ódio têm sua auto-estima destroçada; as mulheres se transformam em objetos sexuais e os “menos prósperos” ficam em desvantagem na arena política.
Em todos esses casos, “o efeito silenciador vem do próprio discurso”, isto é, “a agência que ameaça o discurso não é Estado”. Cabe, portanto, ao Estado promover e garantir o debate aberto e integral e assegurar “que o público ouça a todos que deveria”, ou ainda, garanta a democracia exigindo “que o discurso dos poderosos não soterre ou comprometa o discurso dos menos poderosos”.
Especificamente no caso da liberdade de expressão, existem situações em que o “remédio” liberal clássico de mais discurso, ao invés da regulação do Estado, simplesmente não funciona. Aqueles que supostamente poderiam responder ao discurso dominante não têm acesso às formas de fazê-lo (pp. 47-48).
Creio que o exemplo emblemático dessa última situação é o acesso ao debate público nas sociedades onde ele (ainda) é controlado pelos grandes grupos de mídia.
Censura disfarçada
A liberdade de expressão individual tem como fim assegurar um debate público democrático onde, como diz Fiss, todas as vozes sejam ouvidas.
Ao usar como estratégia de oposição política o bordão da ameaça constante de volta à censura e de que a liberdade de expressão corre risco, os grandes grupos de mídia transformam a liberdade de expressão num fim em si mesmo. Ademais, escamoteiam a realidade de que, no Brasil, o debate público não só [ainda] é pautado pela grande mídia como uma imensa maioria da população a ele não tem acesso e é dele historicamente excluída.
Nossa imprensa tardia se desenvolveu nos marcos do de um “liberalismo antidemocrático” no qual as normas e procedimentos relativos a outorgas e renovações de concessões de radiodifusão são responsáveis pela concentração da propriedade nas mãos de tradicionais oligarquias políticas regionais e locais (nunca tivemos qualquer restrição efetiva à propriedade cruzada), e impedem a efetiva pluralidade e diversidade nos meios de comunicação.
A interdição do debate verdadeiramente público de questões relativas à democratização das comunicações pelos grupos dominantes de mídia, na prática, funciona como uma censura disfarçada.
Este é o “efeito silenciador” que o discurso da grande mídia provoca exatamente em relação à liberdade de expressão que ela simula defender.

Venício A. de Lima é professor titular de Ciência Política e Comunicação da UnB (aposentado) e autor, dentre outros, de Liberdade de Expressão vs. Liberdade de Imprensa – Direito à Comunicação e Democracia, Publisher, 2010.

CANDIDATOS NÃO DEBATEM DEMOCRATIZAÇÃO DA MÍDIA

Mário Augusto Jakobskind

Não é preciso ser nenhum especialista em questões midiáticas para constatar que os grandes proprietários de veículos de comunicação estão colocando as asas de fora, cada vez mais na base da ampliação do esquema do pensamento único. Os debates em torno da democratização dos meios de comunicação se ampliam com a participação de mais brasileiros e isso contraria interesses dos barões da mídia.

O tema ainda não se faz presente nos debates dos candidatos à Presidência da República, Sabem o motivo? Os editores dos veículos de comunicação procuram a todo custo evitar que o tema aflore. Testem se o que está sendo dito aqui procede ou não, fazendo perguntas onde haja debates com os candidatos. Aguardem para ver o que acontece, ou seja, de um modo geral as perguntas não aparecem. Mas se os interessados insistirem com as perguntas é possível que em algum momento acabem tornando-se visíveis. Vale o teste.

Nas últimas semanas a questão da mídia foi objeto de pronunciamento do presidente da Sociedade Interamericana de Imprensa (SIP), Alejandro Aguirre, que chegou ao cúmulo de afirmar que no Brasil há restrições à liberdade de imprensa e acusou o Presidente Lula de não ser “democrata”, o que valeu uma moção de repúdio da Comissão de Liberdade de Imprensa e Direitos Humanos da Associação Brasileira de Imprensa. Para a Comissão, Aguirre na prática “estimula setores conservadores a promover denúncias sem fundamento e que no fundo tentam encobrir debates sobre a questão da mídia e a disposição para que o setor seja democratizado”.

Fazendo coro com a SIP, O Globo e outros órgãos de imprensa da mesma linha volta e meia se posicionam demonstrando preocupação com um suposto “chavismo” por parte do atual governo brasileiro e mesmo da candidata apoiada por Lula, Dilma Roussef.

O Globo, O Estado de S. Paulo, a Folha de S. Paulo, as revistas Veja e Época, entre outros órgãos de imprensa integrantes da SIP, simplesmente colocam as mangas de fora na defesa dos seus interesses, pois sabem perfeitamente que com a ampliação das discussões sobre o tema mídia, mais possibilidades acontecem no sentido da redução do poder absoluto que mantêm sobre os corações e mentes dos brasileiros.

Querendo ou não os barões da mídia, o tema terá que ser discutido por amplos setores da sociedade brasileira que almejam o aprofundamento da democracia no país.

Nesse sentido vale assinalar que a Unesco (Organização das Nações Unidas para a Educação e a Cultura) avalia que o Estado, ou seja, o Poder Público deve impedir a concentração indevida no setor de mídia e assegurar a pluralidade. E para que isso aconteça, segundo ainda a Unesco, os governos podem adotar regras para limitar a influência que um único grupo pode ter em um ou mais setores.

E tem mais, a Unesco entende que “os responsáveis pelas leis antimonopólio precisam atuar livres de pressões políticas” e que "as autoridades devem ter, por exemplo, o poder de desfazer operações de mídia em que a pluralidade está ameaçada”.

É isso aí, o tema está na ordem do dia, para desespero dos ”democratas” da mídia de mercado, que nos últimos tempos ficaram ainda mais ousados na defesa com argumentos frágeis e que não resistem a um maior aprofundamento, como, por exemplo, a defesa incondicional da liberdade de empresa com o argumento de liberdade de imprensa.

Por estas e muitas outras está na hora do mundo político ter a coragem de se posicionar, ou seja, dizer o lado em que estão. Pode ser até incômodo para certos setores mostrar a cara, porque a linguagem da hora do vamos ver exige definições. Mas para que isso aconteça é preciso que maiores contingentes de brasileiros cobrem posicionamentos dos seus representantes nos poderes Executivo e Legislativo.

Podem crer numa coisa: a hora da verdade midiática está mais próxima do que imaginam os senhores barões da mídia. E por isso, estejam certos os leitores, os jornalões e as emissoras de televisão aumentarão o tom da cantilena segundo a qual no Brasil há “perigo” de restrições à liberdade de imprensa, uma balela que a SIP, a pedido de seus integrantes brasileiros, já encampou.

No mais, ao apagar das luzes do governo Álvaro Uribe, a pedido provavelmente do Departamento de Estado, fabricou-se uma crise com a Venezuela em função da insistência da mentira segundo a qual as Farcs montaram acampamentos em território venezuelano. Uribe, com o sinal verde de Hillary Clinton, quer porque quer o aumento do estado de tensão na região, o que poderá resultar no descontrole da situação e derivar numa crise ainda maior do que a atual. Podem crer que a orquestração do conservadorismo vai se ampliar.

E o Comitê de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas denunciou que na Colômbia os paramilitares gozam de total impunidade. Mas O Globo prefere ignorar o fato e apoiar Uribe, da mesma forma que apoiou historicamente outros presidentes de direita em várias partes do mundo, bem como ditaduras na América Latina.


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