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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

sexta-feira, agosto 13, 2010

A comunicação no Brasil está mudando






Miranda sobre o surgimento da blogosfera política no Brasil



A comunicação no Brasil está mudando. Graças à internet. O Brasil está mudando. Graças ao bafejar dos ventos mudancistas soprados por uns tais “militantes da utopia”, por aqueles que combatem, desde sempre, seja enfrentando a sordidez da real política seja militando na blogosfera, por uma democracia plena.
O texto que segue versa sobre o poder da internet [mais precisamente da chamada “blogosfera”] na modificação do paradigma da comunicação e da mídia no país, e, como conseqüência ou instância última, na transformação da sociedade. É um “corte”. Apesar de longo [peço-lhe desculpas de antemão por ser demasiado prolixo] esse artigo é um pequeno-grande capítulo dessa história. O título, para aqueles que ainda não perceberam, alude a certa frase de um certo ex-presidente da Suprema Corte do país, e também àquela antiga canção de protesto “Para não dizer que não falei de flores” mais conhecida como “Caminhando e Cantando”. A alusão a essa canção, por sua vez, pretende remeter àqueles tempos em que alguns jovens “idealistas” sonhavam mudar o Brasil. A tal “turma da Kombi” seria, na visão dos “reacionários”, o povo da blogosfera que, agora, “faz a hora, não espera acontecer”.

A comunicação no Brasil está mudando. Graças à internet. O Brasil está mudando. Graças ao bafejar dos ventos mudancistas soprados por uns tais “militantes da utopia”, por aqueles que desejam e combatem, desde sempre, seja enfrentando a sordidez da real política seja navegando/militando na blogosfera, por uma democracia plena e, mais ainda, desejosos que este país seja, de fato, um país de/para todos os brasileiros.

[Contextualizando: a atmosfera que se respirava na época ou a “ambiência”. Vivia-se a retomada da anima esquerdista, incorporava-se o espírito das reuniões do Fórum Social Mundial que nos ensinava que “um outro mundo era possível”. Se um outro mundo era possível, então uma nova comunicação também era possível e, mais que isso, necessária. Diversas reuniões e conferências sobre comunicação “pipocavam” por todo o país]

Os blogs, no começo utilizados por alguns como uma espécie de singelo diário eletrônico ou virtual, evoluiu, amadureceu bastante [mas ainda não o suficiente] e se transformou, nos dias que correm, em vital instrumento de comunicação e combate aos humores do “mercadismo” e à grande mídia oligopolista, que, sabemos, era pretensa detentora do monopólio da verdade. Ou seja: a versão deles dos fatos [e da história] era a que prevalecia, posto que apenas veiculava-se essa versão “única”, apenas essa única maneira de ver o mundo tinha espaço. Hoje, não mais. Graças ao poder da participação do cidadão. Graças à força da cidadania.

“Cidadania.com” era, a propósito, o nome de um desses blogs precursores. Pilotado por um comerciante, um cidadão comum que, inconformado com as manipulações e inverdades publicadas diuturnamente pelos grandes jornais, resolvera ir à luta e “botar a boca no trombone”. Esse homem comum foi, decerto, a princípio, utilizado/manietado como um “inocente útil” pelos colunistas e editores desses “jornalões”. Mas, quando passou obstinadamente a buscar “a verdade”, tal qual um Quixote redivivo, foi logo descartado e rotulado de “louco” por esses mesmos colunistas e editores que antes lhe davam guarida e paparicavam. O espírito ali já se revelava outro: o homem comum, o leitor, buscava participar da tessitura da realidade, da notícia. Quem sabe faz a hora. O homem ordinário desejava ser extraordinário.

Eduardo Guimarães [este é o nome desse personagem], talvez após constatar que a solução para aquele problema que lhe incomodava deveras [e a muitos como ele] não passava somente pelo estratagema, digamos, bem intencionado, mas talvez ingênuo, de melhorar o jornalismo praticado pelos grandes veículos/grupos de comunicação utilizando-se tão-somente de esporádicas manifestações nos espaços dedicados aos leitores, teve então a idéia de criar um movimento agrupando aqueles que, como ele, se sentiam sem vez e voz, incomodados com o “duplipensar” e a “novilíngua” daquela imprensa que, desde sempre – agora, enfim, ele comprovara – esteve a serviço dos chamados “donos do poder”. Guimarães [e muitos com ele] naquele instante apreendeu a lição. Nascia então o MSM – Movimento dos Sem Mídia.

E foi exatamente esse mesmo MSM que, a despeito das suas fragilidades e insuficiências, dentre as várias ações que realizou, empreendeu uma que marcou, de modo indelével, definitivo a história dessas eleições de 2010. O movimento, agora uma ONG, entrou com uma representação na Procuradoria Geral Eleitoral (PGE) ajuizando a abertura de um processo em que solicita auditoria, fiscalização e acompanhamento das pesquisas realizadas por todos os institutos, pois havia fortes indícios de manipulação nessas sondagens [as principais suspeitas recaíam sobre DataFolha e Ibope]. O inquérito foi aberto e o processo instaurado (Nº 4559.2010-33). A Polícia Federal está investigando. Daí em diante, as empresas de pesquisas, e também o PIG, colocaram as barbas de molho. Não dava mais para mexer nos dados, dar uns 10 ou 12 pontos de vantagem ao candidato da oposição de direita e dizer-lhe: “Vai que a gente garante!”. Esse “empurrãozinho” fraudulento o conduziria direto ao abismo.

Porém, nessa breve história que lhes conto aqui existem outros, vários protagonistas e precursores. E é essa exatamente a principal característica da “blogosfera”: o chamado “protagonismo cidadão”. Leitores e articulistas-militantes se envolvem numa quase-perfeita sintonia. As notícias e opiniões são comentadas e, muitas vezes, contestadas em tempo real. Os comentários postados são, algumas das vezes, mais ricos e esclarecedores que os próprios artigos ou “posts” originais. Os leitores são agentes ativos do debate nacional, não mais passivos.

Para assomo de alguns “puristas”, alguns jornalistas egressos da grande mídia também se engajaram nessa intrincada, árdua e aparentemente inglória tarefa de construir e trilhar os caminhos de uma nova comunicação. Antes, você deve se lembrar, esse mister, esse ofício era atribuído à chamada imprensa alternativa. Surgem, porém, nomes de “celebridades” proscritas da grande mídia como “o impagável” Paulo Henrique Amorim e “o mineiríssimo” Luis Nassif, bem como nomes mais ou menos célebres como Luiz Carlos Azenha e Rodrigo Vianna, dentre outros.

Nassif tatuou a ferro e fogo seu nome nessa história quando publicou em seu blog o “Dossiê Veja”, onde revela os bastidores sombrios e pútridos desse semanário e da grande imprensa em geral – em decorrência disso responde hoje a inúmeros processos com custos (ou seriam custas?) de difícil mensuração. Atravessou para o lado de cá e queimou as caravelas que poderiam conduzir-lhe de volta. Nassif comeu o pão que o diabo amassou. Hoje pilota uma das mais instigantes e competentes experiências em jornalismo colaborativo na blogosfera.

Paulo Henrique Amorim, com seu jeito bonachão e galhofeiro de “bom carioca” foi intrépido e arriscou: deu vez e voz ao valente e “ínclito” delegado Protógenes Queiroz em sua luta contra o “banqueiro bandido” [nas palavras deste último]. Bateu de frente com gigantes das telecomunicações e foi “saído” do portal IG. É dele a “tirada”: “O supremo presidente do Supremo, Gilmar Dantas – como diria o Noblat”. Paulo Henrique também responde a inúmeros processos na Justiça. É inegável a importante contribuição que esses “traidores” da grande imprensa, por assim dizer [com o auxílio da ferina ironia do destino], deram à causa desses aqui chamados “militantes da utopia” ou, como querem alguns, dessa “turma que não enche uma Kombi”.

A estes se somam, como disse, outros, vários, diversos personagens anônimos [já nem tão anônimos assim] e protagonistas nesse “levante” dos “utopistas”. Ouso citar alguns só para cometer o pecado de me esquecer de muitos.

São importantes personagens dessa nova comunicação veículos como Carta Maior, Caros Amigos [faço aqui uma referência e reverência ao saudoso Sergio de Souza], Revista Carta Capital, ConversaAfiada, Nassif OnLine, Vi o Mundo, Escrevinhador, Blog da Cidadania, Vermelho.org.br [e o blog do Miro], Revista Fórum [revista, site e blog capitaneado por Renato Rovai], Revista do Brasil [alô, alô, Paulo Donizette!], RS Urgente, Abunda Canalha, Amigos do Presidente Lula [alô, alô, Helena Stephanowitz!], Óleo do Diabo, Cloaca News, Tijolaço [blog do jovem e valente deputado Brizola Neto - como o nome “entrega”, neto do saudoso e valoroso Leonel Brizola].

Não tenho aqui a pretensão de contar toda essa grande história em toda sua magnitude e dimensão; de enumerar/citar todos os seus mais importantes feitos, fatos e personagens – pois são muitos os seus aguerridos combatentes. Tampouco tenho a pretensão de mostrar a melhor visão ou enfoque desse rico movimento, essa onda que hoje se levanta diante de nossas retinas já tão fatigadas cristalizando o tal “quem sabe faz a hora acontecer”.

Trata-se apenas, como disse, de um “corte”, um “primeiro capítulo” de uma obra em construção. Mais um olhar, mais uma palavra semeada que, característica inerente a essa nova comunicação libertária, soma-se à sua visão e palavra, prezado leitor-cidadão, e se espalha. Enredo que se enreda rede adentro, mundo afora, por intermédio da internet e da blogosfera.

Não mais a serviço de um único tutor ou “dono”, seja esse “dono” uma empresa, um “coroné”, um partido ou uma determinada oligarquia. Sempre a serviço da “causa”. Qual seja: uma comunicação revolucionária, democrática e um Brasil para todos.

* Lula Miranda é poeta e cronista. Foi um dos nomes da poesia marginal na Bahia na década de 1980. Publica artigos em veículos da chamada imprensa alternativa, tais como Carta Maior, Caros Amigos, Observatório da Imprensa, Fazendo Média e blogs de esquerda.
doóleododiabo

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