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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

quarta-feira, fevereiro 09, 2011

Lula diz que expansão agrícola é chave para desenvolvimento da África


Bastante aplaudido por brasileiros em debate no FSM, Lula defendeu a criação do Estado Palestino, apoiou a revolta popular no Egito, criticou os países ricos e afirmou que as savanas africanas, como o cerrado brasileiro, poderiam dar suporte ao avanço da agricultura e da segurança alimentar.
O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou nesta segunda-feira (7) que as nações africanas deveriam apostar no desenvolvimento agrícola como forma de garantir soberania alimentar e gerar riquezas por meio da exportação dos produtos.
Em sua primeira viagem internacional após deixar a presidência do Brasil, Lula veio ao Senegal para participar do Fórum Social Mundial em uma mesa de debates sobre "A África na geopolítica mundial", na qual falou ao lado do presidente senegalês, Abdoulaye Wade.
Ao longo de sua exposição, bastante aplaudida por dezenas de ativistas brasileiros, Lula defendeu a criação de um Estado Palestino, apoiou a revolta popular no Egito, criticou as potências econômicas e o neoliberalismo e exaltou os resultados de seus governos (2003-2010), sobretudo no que diz respeito ao combate à miséria.
Após voltar ao Brasil, o ex-mandatário brasileiro fará outra viagem internacional neste mês: a convite, visitará o presidente venezuelano, Hugo Chávez, que enfrentará eleições em 2012.
Em sua fala no Fórum, Lula afirmou que as nações africanas precisam cortar os laços de dependência que ainda mantêm com as ex-metrópoles. Para isso, a questão alimentar seria essencial. "Não há soberania efetiva sem segurança alimentar", disse. Para o ex-presidente, a experiência brasileira na área agrícola, ainda que não seja possível a "transposição de modelos", revela que é viável a expansão da produção de alimentos em terras pouco valorizadas.
"Até os anos 70 o cerrado brasileiro era considerado um deserto verde, sem condições de sustentar uma agricultura produtiva", lembrou Lula. Mas, graças à atuação do Estado no fomento à pesquisa, essas regiões "tornaram-se grandes fornecedoras de alimentos para o mundo e viabilizou-se a política de erradicação da fome em nosso país".
Para ele, as savanas africanas poderiam repetir a história do cerrado no continente. Segundo Lula, as savanas se espalham por mais de 25 países da África e, com investimento em pesquisa, seria possível desenvolver seu potencial agrícola.
Hoje, apenas 10% da área das savanas possuem cultivos agrícolas. Na opinião do brasileiro, a elevação desse índice ajudaria a reduzir o drama da fome no continente, que poderia se tornar um grande fornecedor de alimentos no mundo. "Se o território dos países ricos está escasso para produzir alimentos, se há mais africanos, chineses, indianos, coreanos e latinos comendo, onde há terra para produzir alimento?", questionou, para em seguida responder: "A África e a América Latina podem e devem suprir os alimentos que são um produto essencial para a vida humana".
Lula criticou ainda os subsídios agrícolas dos países ricos e a atual escalada de preços das commodities no mundo, afirmando que a culpa é da especulação. "Não há nenhuma explicação para o preço do petróleo superar 100 dólares", disse.
Em ataque direto à ciranda financeira, o ex-mandatário lembrou que, apesar de sempre faltarem recursos para programas de erradicação da fome, sobraram fundos para "resgatar bancos e instituições financeiras na recente crise financeira internacional".
Para o brasileiro, os países africanos precisam alterar os modelos de cooperação internacional vigentes e não mais aceitar a imposição de modelos externos.
Revoltas populares
O ex-presidente brasileiro registrou pleno apoio às revoltas populares que ocorrem no Norte da África e no Oriente Médio – segundo ele, causadas pela pobreza, pela dominação de tiranos e pela submissão das políticas internas à agenda das grandes potências. E avaliou que a criação de uma cultura de paz – um dos temas históricos do Fórum Social Mundial – não dependeria apenas do fim do comércio de armas, mas sobretudo do combate à fome, à desigualdade e ao desemprego.
Além de criticar a intolerância étnica, cultural e religiosa, Lula mais uma vez atacou o modus operandi dos países ricos, em especial a política da guerra preventiva dos Estados Unidos. Disse que, sem ingerências externas, a África teria mais chances de acelerar seu desenvolvimento econômico e social. "Nos 29 países que visitei como presidente, comprovei a vitalidade deste continente que aqui reafirma sua diversidade ética e cultural", disse.
Para ele, a inclusão econômica de milhões de africanos pode ser uma estratégia para superação mais rápida da crise financeira internacional – assim como a expansão do mercado interno brasileiro evitou a intensificação dos problemas no país.
Ao terminar sua fala, Lula afirmou que o impasse em 2008 sobre as negociações comerciais de Doha, conduzidas pela Organização Mundial do Comércio, não foi resolvido até hoje por obra dos Estados Unidos, que se viam em eleições internas. Lula defendeu o engajamento dos ativistas nesse processo de negociações, bastante contestado por organizações que discutem o tema agrícola no Fórum Social Mundial.
Marcel Gomes
*cartamaior

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