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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

sexta-feira, novembro 04, 2011

Especialista diz que economistas midiáticos defendem um sistema falido porque são pagos por bancos

 Os embalos da opinião econômica 
Luiz Gonzaga Belluzzo 

Professor da escola de economia de Paris, Bertrand Rothé abre seu artigo na revista Marianne com uma pergunta: por que os economistas midiáticos defendem com tanto ardor um sistema falido? Ele responde: porque eles são pagos pelos bancos. Um tanto rude, a resposta.

Mas Rothé mata a cobra e mostra o pau. Diz o economista que, em 10 de agosto, o jornal Le Monde publicou no caderno Debates 22 depoimentos de especialistas na matéria. Nesse grupo de sabichões, 16 (76,6%) são ligados a instituições financeiras. A promiscuidade vai longe. Anton Brender, reputado economista da esquerda francesa, hoje diretor de estudos econômicos do Dexia Asset Management usou duas páginas do Nouvel Observateur para concluir que “não são os mercados que estão em causa, mas a impotência política.”

A quase unanimidade, o realejo de opiniões banais encontra na mídia contemporânea um espaço ideal. Um jornalista do L’Expansion justificou a preferência pela ligeireza: “Os economistas de bancos sabem responder rápido, eles são pagos para isso. Esse já não é o caso dos universitários que se entregam à reflexão e cujas nuances são difíceis de transcrever.”

Vamos às relações entre “impotência política”, descuidos midiáticos e captura dos economistas. Até mesmo um idiota fundamental é capaz de perceber que na construção da crise atual a “impotência política” tem origem na ocupação do Estado e de seus órgãos de regulação pelas tropas da finança e dos graúdos interesses, digamos, corporativos, aí incluídos aqueles das megaempresas de mídia. As tropelias do meliante Rupert Murdoch dão testemunho das ligações perigosas entre o mass media, a política e a polícia. No Brasil é o “puder”, já na pérfida Albion it’s power.

O americano Robert Kaiser no livro So Damn Much Money listou 188 ex-congressistas registrados oficialmente como lobistas em Washington. A pesquisa de Kaiser revela como funciona a porta giratória entre os grandes negócios e a política. Estudo realizado por um grupo de advogados, o Public Citizen, flagrou na nobre ocupação de lobistas metade dos senadores e 42% dos deputados que deixaram o Congresso entre 1998 e 2004. No período 1998-2011 o setor financeiro gastou 84,5 bilhões de dólares com essa turma. Há “rachuncho” com o caixa das campanhas políticas.

Não escasseiam relatórios oficiais, depoimentos, documentários e livros de gente oriunda dos mercados a respeito da invasão dos bárbaros na cidadela da política e das políticas. Nesse espaço que, generosamente, me reserva CartaCapital, já publiquei um artigo sobre o relatório do Congresso americano que expõe as tropelias dos agentes da finança na montagem da crise financeira.

“No relatório do Congresso, o percurso em direção à crise é analisado mediante a narrativa de episódios esdrúxulos e de depoimentos patéticos de banqueiros, altos executivos e autoridades. A articulação entre as falas e as narrativas permite uma avaliação do papel desempenhado pelos vários fatores e protagonistas que levaram a economia global da euforia e da depressão: as inovações financeiras geradoras de instabilidade, a omissão sistemática das autoridades encarregadas de supervisionar os mercados de hipotecas e, finalmente, a farra da emissão de securities lastreadas em empréstimos imobiliários.

Before Our Very Eyes, assim é denominado o primeiro capítulo do Relatório do Congresso. Em linguagem popular “Estava na Cara”. É difícil negar que, ao longo dos anos de gestação da crise, os olhos – os da mídia incluídos – estiveram vendados pela trava que os hipócritas apontam na visão alheia (Palavras de Cristo, de admirável sabedoria). Já no caso de muitos economistas eminentes, sempre procura-dos para opinar, os olhos estavam travados, mas as imagens e palavras do documentário de Charles Ferguson, Inside Job, sugerem que os bolsos estavam arreganhados para a grana que escorria das façanhas da haute finance.

Ian Fletcher, autor do livro Free Trade Doesn’t Work, descreve formas mais sutis de cooptação dos economistas. Tais métodos, diz ele, não frequentam o ethos de bordel, com propostas do tipo “diga X e lhe pagarei Y”. Mas na faina de conseguir clientes, muitos economistas devem cultivar a reputação de sempre dizer aquilo que o freguês quer ouvir. “Certas ideias, como o aumento da desigualdade e problemas acarretados pelo livre-comércio devem ser evitadas. Elas não são economicamente corretas.” A mídia, em seus trabalhos de purificação da opinião pública, cuida de retirar tais “excentricidades” de circulação, assim como a polícia leva a enxovias os manifestantes de Ocupe Wall Street, uma súcia de desordeiros desatinados e desordeiras de barriga de fora.

*esquerdopata

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