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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

segunda-feira, junho 10, 2013

A arte de ensinar sem autoridade

Por Guilherme Wagner (1)
 Os problemas mais comuns em uma sala de aula na escola moderna podem ser resumidos em muita autoridade ou pouca autoridade. Existe dentro da classe do magistério a concepção de que o professor bom é aquele que tem o que se chama de “domínio de turma”. Como se estudantes fossem seres selvagens que precisariam ser domados, moralmente confeccionados e socialmente inclusos em um grupo, não obstante se criam os grupos escolares de inteligentes, espertos, bagunceiros, vagabundos... Tais grupos são exportados para a sociedade em que vivem e fomentadas expectativas sob tais jovens. Uma escola que produz diferenciações é uma escola que exclui, seja por vontade própria ou não. Não vou me ater as questões escolares gerais nesse artigo, irei me atrelar mais ao convívio de classe de aula.
Na escola moderna existe uma relação de poder conservadora mantida e propagada há séculos: o professor é a autoridade máxima de uma sala de aula. O que é o professor para ser uma autoridade? Quais as causas dessa necessidade? E se ela não existisse?
O professor enquanto pessoa é um ser que construiu sua consciência materialmente como qualquer ser humano, concebeu sua cultura influenciado diretamente por sua realidade política e econômica, realidade essa mantida e propagada materialmente. Isto é, o professor é um resultado material da realidade passada e presente, e fomentador de uma realidade futura, essas relações são questões sociais, indiferentes a vontade do mesmo. Então o professor não é nada e ao mesmo tempo é tudo para ser uma autoridade, ou seja, não há nada no professor em questão que faça com que ele seja ou não uma autoridade, pois a autoridade é um resultado social e não individual.
A autoridade socialmente falando é resultado direto da luta de classes, em que os explorados conflituam em batalhas sociais com seus exploradores em um local instituído chamado Estado. O Estado é o conjunto de instituições existentes que determinam e mantém a dominação de uma classe sobre outra, assim a Escola como uma instituição do Estado (particular e pública!) reflete essa dominação mantida sob formas de autoridade, de controle e persuasão moral. Logo a existência de uma autoridade em sala de aula é diretamente ligada a existência de privilegiados e explorados na sociedade, no entanto, engana-se quem crê somente nisso (a escola também produz explorados e exploradores...). Assim, a causa dessa necessidade autoritária, muitas vezes justificada pela urgência em ter silêncio, respeito, ensino-aprendizagem em uma sala, é na verdade resultado direto da sociedade conflitante.
Mas o eixo fundamental: é possível ensinar sem autoridade? Com toda a certeza! Por isso vou colocar algumas práticas interessantes para professores irem educando sem autoridade, seguir elas não fará de você um grande professor ou coisa do tipo, se buscas reconhecimento moral na sua profissão, o professor na sociedade capitalista é uma escolha errada.
Logo na primeira aula coloque sua didática em dúvida, questione-se e tenha a questionada, só há uma forma dela ser questionada, abrindo-se para tal. De primeiro assunto, “como vamos organizar a nossa sala de aula durante nos nossos estudos?” Coloque sugestões suas, e vá pedindo opiniões de outras, dar esse poder ao estudante de decidir uma questão tão tradicional promove confiança, e confiança é a palavra-chave para respeito, educação e construção. Trabalhando questões assim estás construindo o seu ambiente de estudos com os estudantes, as primeiras aulas são a construção desse ambiente, e delas dependem todo o processo educativo, as próximas são a aplicações dessa construção.
Experiências próprias:
- Estudantes preferem classes organizadas em circunferências, o contato visual de todos com todos é um semblante de igualdade.
- Na área de matemática evite ficar muito no quadro, isso promove uma relação de dependência sua com ele e dos estudantes com esse sistema, procure diversificar e pedir opiniões sobre aplicação do assunto. (A questão não é você preparar a aula, são todos da sala construir a aula).
- Faça dinâmicas e debates, sempre participe delas honestamente: professor não é ser sagrado que precisa ser idolatrado e resguardado.
- Procure aplicações do assunto na realidade social do estudante, isso requer um convívio e entrosamento com o estudante, e o primordial confiança. (Estudante é gente e não número!)
Mas então surgem questões como: “Tenho 60 horas/aula dadas, como vou trabalhar com isso?” Refaço a pergunta, participas das greves? Mas não se resume a isso, infelizmente a carreira do professor vem sendo muito desgastada e por isso muitos métodos que seriam excelentes tornam-se improdutivos. Ensinar sem autoridade faz com que você construa as aulas e não as prepare, a obrigação de ensinar não é somente sua, mas de todos. Existirá uma corrente de responsabilidades, aplicações e habilidades desenvolvidas por todos. Cheque-se de poder confiar nos estudantes e de promover a confiança entre eles.
Recomendo o filme que fala sobre a Escola da Ponte, ela reflete em alguns momentos essa “construção da aula”. Lembrando que esse é um método alternativo para uma escola moderna inserida em uma contexto conflitante de classes.
(1)Estuda Licenciatura em Matemática pela UFSC, colaborador do Memorial dos Direitos Humanos/UFSC (GE Mário Pedrosa e Ditadura Civil-Militar), pesquisa na área de Educação, História e Política
Posted by
*Centrodosocialismo 

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