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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

terça-feira, dezembro 09, 2014

Anistia e reparação

STJ reconhece responsabilidade de Ustra por torturas durante ditadura

A 3ª turma da Corte manteve decisão que reconheceu a existência de relação jurídica de responsabilidade civil com ex-presos políticos.

A 3ª turma do STJ negou provimento a recurso especial interposto pelo coronel reformado Carlos Alberto Brilhante Ustra e manteve decisão que reconheceu a existência de relação jurídica de responsabilidade civil com ex-presos políticos, em razão da prática de ato ilícito durante a ditadura. Em decisão por maioria de votos, o colegiado assinalou que "esclarecendo o passado, estamos dando exemplo e trazendo a tona uma situação inadmissível, que não podemos esconder debaixo do tapete".
A ação foi movida pela família Teles, que acusou Ustra de chefiar torturas no DOI-Codi quando era seu comandante na capital paulista, entre 1970 e 1974. No total, são cinco os autores: um casal de membros do Partido Comunista do Brasil (PCdoB), a irmã da mulher – à época, grávida de sete meses – e os filhos do casal, então com cinco e quatro anos. O coronel teria praticado pessoalmente atos de tortura contra eles.
O juízo de 1º grau julgou o pleito procedente, decisão esta mantida pelo TJ/SP. O coronel reformado recorreu ao STJ alegando negativa de prestação jurisdicional, ausência de interesse de agir, prescrição e sentença ultra petita.
Lei da anistia
Iniciado o julgamento do recurso, a relatora do processo, ministra Nancy Andrighi, seguida do ministro João Otávio Noronha, votou no sentido de dar provimento ao recurso sob o argumento de que a sociedade brasileira renunciou à punição jurídica com a lei da anistia. O ministro Paulo de Tarso Sanseverino, então, pediu vista dos autos.
Na sessão desta quarta-feira, 9, o ministro apresentou seu voto negando provimento ao recurso e abrindo divergência, sendo acompanhado pelos ministros Villas Bôas Cueva e Marco Aurélio Bellizze. Em concordância com as razões dos recorridos, o ministro ponderou que a anistia refere-se apenas a crimes e não pode se estender às questões de natureza civil.
O advogado da família, Joelson Dias (Barbosa & Dias Advogados Associados), destacou que "esta foi a terceira decisão consecutiva de um órgão do judiciário brasileiro afirmando o direito da família de ver reconhecida a relação jurídica com Ustra em decorrência de sua responsabilidade pelas violações de direitos humanos".
"Não menos importante, como hoje inclusive afirmou o ministro Sanseverino, foi também a afirmação do direito da própria coletividade de conhecer desde a perspectiva das vítimas os 'aberrantes episódios' de violação de direitos humanos verificados durante o período da ditadura militar brasileira."
Segundo o causídico, "o conhecimento dessas circunstâncias e a certificação delas, com efeitos declaratórios, é condição para o Estado cumprir seu dever constitucional de anistia e de reparação".
  • Processo relacionado: REsp 1.434.498/SP
  • http://www.migalhas.com.br/Quentes/17,MI212546,101048-STJ+reconhece+responsabilidade+de+Ustra+por+torturas+durante+ditadura

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