“Não vou embora, estou chegando”, diz Mujica em despedida
“Se tivesse duas vidas, as gastaria inteiras para ajudar suas lutas, porque é a forma mais grandiosa de amar a vida que pude encontrar ao longo dos meus quase 80 anos”, disse Pepe
Ao final do seu último dia útil como mandatário do Uruguai, José “Pepe” Mujica – que ficou conhecido internacionalmente como “o presidente mais pobre do mundo” – foi ovacionado por milhares de uruguaios, que lotaram a Plaza Independencia (a principal da capital) para “agradecer” por sua gestão.
Em meio a aplausos, gritos de “obrigado, Pepe”, bandeiras alusivas ao seu partido político (Movimento de Participação Popular) e palavras de ordem como “Pepe, amigo, o povo está contigo”, Mujica compareceu ao tradicional rito de arriamento da bandeira, quando o símbolo nacional é retirado de seu mastro e entregue ao presidente prestes a deixar o cargo.
Na cerimônia, estavam presentes também o novo presidente do Uruguai, Tabaré Vázquez – que assume neste domingo, 1º de março – , o vice-presidente eleito, Raul Sendic, a mulher de Mujica, a senadora Lucía Topolansky, atual candidata à Prefeitura de Montevidéu, e ministros do governo de Pepe.
Em um discurso de 10 minutos, que trazia por escrito, o presidente relembrou rapidamente sua infância e adolescência, e agradeceu ao povo “pelo profundo companheirismo” em cada uma das vezes em que disse ter se sentido “sozinho”. “Se tivesse duas vidas, as gastaria inteiras para ajudar suas lutas, porque é a forma mais grandiosa de amar a vida que pude encontrar ao longo dos meus quase 80 anos.”
Também repassou os tempos de prisão e luta armada contra a ditadura. “Pagamos preços enormes, mas continuamos vivos por milagre, aprendendo com a adversidade e tendo repensado toda a vida, como uma entrega e como valor a defender acima de todas as coisas.”
Ao final, afirmou: “Não estou indo embora, estou chegando. Irei com o último respiro e, onde estiver, estarei por vocês, porque é a forma superior de estar com o povo”.
Fusca no ar, Mujica na pele
Em meio à multidão que acompanhava um dos últimos atos públicos de Mujica, o famoso fusca azul do presidente pairava como um monumento à sua personalidade. Não era o fusca real, mas sim uma réplica feita de papel machê, no alto de uma caminhonete.
Em meio à multidão que acompanhava um dos últimos atos públicos de Mujica, o famoso fusca azul do presidente pairava como um monumento à sua personalidade. Não era o fusca real, mas sim uma réplica feita de papel machê, no alto de uma caminhonete.
“Sou um simpatizante do Pepe, da Frente Ampla (a coalizão governista integrada pelo partido de Mujica), e organizamos a vinda a essa despedida com amigos e integrantes do MPP do Cerro (bairro operário de Montevidéu). O fusca foi feito em 15 dias por um artista que faz 'cabeçudos' (bonecos tradicionais do Carnaval uruguaio) e me ofereci para trazê-lo no meu carro”, contou ao Terra Raul Presyones.
Os amigos Wilson Mieres, 30, e Emiliano Cardozo, 18, foram a caráter para a ocasião. Cardozo, com uma camiseta customizada com o rosto e frases de Mujica – além de uma tatuagem com o rosto do presidente no braço direito – , e Mieres, com uma máscara do mandatário.
“Mujica é um ídolo. Para os mais humildes, calou fundo e é um marco por tudo o que nos ensinou. Nunca havíamos visto um presidente assim, e acho que nunca mais vamos voltar a ver”, disse Mieres.
Para Cardozo, Mujica “impactou com força. Para além do fato de ser carismático, seu carisma foi acompanhado por atos políticos”.
O aposentado Guillermo Verona, 59, acompanhou a cerimônia com as cores da Frente Ampla na cabeça e com a bandeira da coalizão nas mãos. “É a primeira vez na história que um presidente sai como ele está saindo. Pepe nos deixa o que nunca nos deixaram: a intenção de fazer o melhor que se pode.”
Milhares de uruguaios comparecem à despedida de Mujica
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