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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

segunda-feira, maio 21, 2012

Sem-teto são unha encravada no centro de São Paulo, diz Mano Brown

 

Cinco anos após um show que terminou em pancadaria na praça da Sé, o grupo de rap Racionais MC's volta sua artilharia para o centro de São Paulo.
É terça à noite, e Mano Brown, KL Jay, Edi Rock e Ice Blue estão na rua Mauá, 340, ao lado da Estação da Luz. O que um dia foi o Hotel Santos Dumont parece, para quem vê de fora, uma edificação em ruínas.
O líder do Racionais sobe num tablado, colocado no pátio central do prédio, e se dirige às famílias de movimentos de sem-teto.
“Para eles (poder público), o ser humano é um mero detalhe. Não é o povo deles que está aqui, que vai ser despejado!” Todos aplaudem, inclusive donas de casa que assistem à movimentação da janela de seus dormitórios.
Brown decidiu gravar o clipe da música “Marighella” - sobre o guerrilheiro comunista Carlos Marighella (1911-1969) - num local com todos os ingredientes para se tornar um novo Pinheirinho - só que, dessa vez, no coração da metrópole, numa região sob disputa política por conta do projeto Nova Luz e das recentes operações anticrack.
Segundo ele, a gravação foi a maneira encontrada para apoiar as mais de 1.300 pessoas que moram no local há quase cinco anos. A Justiça determinou neste mês a reintegração de posse, cuja data será definida em julho.
Embalados pelo discurso de Brown, os integrantes do Racionais e o rapper Dexter emendam um pocket show de luxo. Hits como “Nego Drama” e “Vida Loka (Parte 2)”, pelos quais se costuma pagar alto para ouvir em clubes de “playboys”, jorram um atrás do outro para os sem-teto.
Folha - O que veio fazer aqui?
Mano Brown - Eu já vinha acompanhando o caso da ocupação pelo noticiário. Estava indiretamente engajado, e o pessoal do movimento vinha falando que a gente precisava gravar aqui, porque aqui é onde estão as ideias do Marighella.
Como foi gravar na Mauá?
A ficha ainda não caiu. Eu já tive oportunidade de cantar falando das coisas dentro da coisa em si, como na casa de detenção. A gente fez a música “Diário de Um Detento” e cantamos dentro da detenção (Carandiru), antes dela cair. Foi mais ou menos como hoje aqui. O Marighella falava sobre isso: reforma agrária, divisão das terras, justiça social. E aqui é como se fosse a unha encravada da cidade. É um problema que eles (poder público) não querem, não têm sensibilidade para resolver como deveriam.
Como vê as ações recentes aqui na cracolândia?
Isso se chama especulação imobiliária. Já fizeram isso em São Paulo no começo do século 20. Fizeram isso no Rio de Janeiro, no Bronx, em vários lugares. É um lance racial. São Paulo foi forjada assim. O que a gente tá vivendo aqui é resquício da época da escravidão, são as mesmas fórmulas. Eles querem “limpar”, sumir com o problema, e não resolver.
Acho que eles (sem-teto) têm que lutar mesmo. Não tem que demarcar território para A, B ou C. Se eles estão vivendo aqui, eles têm que continuar aqui. E o rap deve ajudar. Eu sei que eu tenho um peso e que eu posso colaborar.
E a prisão do rapper Emicida em Belo Horizonte?
O Brasil está em transição. O Brasil não sabe se é um país moderno ou se ainda está em 1964. Essa geração da direita... eles falam que não existe direita, mas existe direita. Kassab é de direita, Alckmin é de direita, certo? Eles falam que não, mas têm o mesmo modus operandi dos caras da antiga, de usar a força, de usar o poder e de passar para frente o B.O. para outro resolver.
Acha que essa causa da Ocupação Mauá vai conseguir apoio da população de São Paulo?
A sociedade primeiro tem que se sensibilizar. São Paulo é uma terra em que as pessoas são muito individualistas. Usa-se o termo reacionário, né? Grande parte da população vê eles (sem-teto) como um problema e prefere se livrar deles usando o sistema. Isso é uma coisa bem de São Paulo. A pessoa cai aqui, você passa por cima e vai embora. Isso é São Paulo.
Quem mora lá (na periferia) fica isento de muita coisa, tem um lugar reservado, mas fica longe de tudo. E aqui eles estão perto de tudo, e isso tem um preço. Estar perto do progresso tem um preço. Então querem cobrar esse preço deles. Você não tem direito de estar perto do hospital, da estação de trem, do metrô, você não tem direito de estar a cinco minutos do trabalho. Você tem que estar lá no fundo, onde as pessoas que não têm direito estão.
Ninguém é dono de São Paulo e o paulista não é dono de São Paulo. O brasileiro é dono de São Paulo, como é também dono da Bahia, dono de Minas Gerais...
O que acha da Comissão da Verdade?
Tem que fazer justiça mesmo. Tem que buscar o pé da fita mesmo, como dizem lá na minha quebrada, e tem que punir quem tem que ser punido. Se é que eles estão vivos ainda. Vai punir quem? Quem tá vivo para ser punido? Igual o (ditador chileno Augusto) Pinochet, que foi preso com oitenta e tanto. Vive bem, dorme bem, come bem, aí vive 90 anos. E o trabalhador mesmo...
O espaço do rap na Virada Cultural diminuiu. Isso tem a ver com o show do Racionais de 2007, na Sé?
Com certeza, isso daí tem a ver com o Kassab.
Você acha que a Prefeitura de São Paulo ainda não superou, não esqueceu?
RACIONAIS MCS NOVA LUZNão esqueceu, mas é lógico que o Racionais é a ponta do iceberg. O Racionais é um grupinho, é grão de areia perto do problemão que eles têm que enfrentar. Eu não ligo pelo rap, eu não ligo pelo estilo musical. Eu brigo por uma raça, por um povo. Não está acontecendo só com o rap isso. Os caras estão invadindo as festas nos bairros, os pancadões que o pessoal faz na rua. Não tem carnaval na Bahia, que é popular, que acontece na rua? Não tem carnaval na rua lá no Rio? E por que não pode ter em São Paulo?
No: Folha
Ps. do O Carcará: Apesar de ser conduta “obrigatória” deste blogueiro em informar a fonte de onde a notícia foi retirada quando os textos não são de minha autoria, confesso que quando se trata do PIG, resisto em colocar o link. Mas informo a fonte.
Nesse caso, por se tratar de um integrante do PIG que foi um dos mais colaborativos com a Ditadura Militar, emprestando até veículos ao “sistema”, fiquei tão surpreso com o conteúdo da entrevista que coloquei o link completo da reportagem, uma vez que até eu mesmo duvidei que pudesse ser veiculado nesse jornal. Mas ninguém ouse pensar que isso muda em alguma coisa minha posição contra esse diário golpista.
Como pode ser visto, os links inseridos na reportagem são de O Carcará.
*Ocarcará

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