Veja, como o crime organizado faz jornalismo
do Brasil de Fato
A aliança da revista Veja com o crime organizado rendeu denúncias que
reverteram em ganhos econômicos para a organização criminosa de
Carlinhos Cachoeira e seus aliados políticos
09/05/2012
Editorial da edição 480 do Brasil de Fato
A Operação Monte Carlo, desencadeada pela Policia Federal (PF) para
desbaratar a quadrilha comandada pelo bicheiro Carlinhos Cachoeira, já é
merecedora de um mérito: publicizou o conluio de setores da grande
mídia com o crime organizado para alcançar objetivos econômicos e
políticos.
As investigações da PF, com informações documentadas e já amplamente
divulgadas, atestam que o bicheiro utilizava a revista Veja, do grupo
Abril, para disseminar perseguições políticas, promover suas atividades
econômicas ilegais, chantagear, corromper e arregimentar agentes
públicos. A revista se prestava a esse esquema de coação e chantagem do
bicheiro.
Em troca, a revista da família Civita recebia do contraventor
informações, gravações e materiais – na maioria das vezes obtidas de
formas criminosas – que alimentavam as páginas da publicação, para
destilar seu ódio e preconceito contra seus adversários políticos,
principalmente os do campo do PT.
A aliança da revista Veja com o crime organizado rendeu denúncias que
reverteram em ganhos econômicos para a organização criminosa de
Carlinhos Cachoeira e seus aliados políticos – os contratos da
construtora Delta com governos estaduais precisam ser profundamente
investigados – e se constituíram em instrumento de pressão e
amedrontamento de autoridades públicas. Dessa forma, consolidaram um
esquema criminoso, milionário, com ramificações privadas e públicas, nas
três esferas da República.
O conluio, mais do que reportagens jornalísticas, rendia conspirações políticas e econômicas.
O acinte à democracia do país alcançou ao nível de planejar a
desestabilização e queda do presidente Lula e da presidenta Dilma
Rousseff. Enquanto Carlinhos Cachoeira e o senador Demóstenes (ex-Dem)
gargalhavam por fogo no país, a revista projetava o senador como o
prócer da moralidade pública, com perspectivas de vir a ser candidato à
presidência da República. Era o crime organizado, com a participação do
Grupo Abril, tramando desestabilizar governos e tomar conta da máquina
estatal.
No entanto, a revista Veja era pequena e insignificante para os
objetivos que o conluio se propunha alcançar. Precisava de ajuda. Os
telejornais da Rede Globo se prestaram a dar a ajudava de que
necessitavam. Com sua peculiar e esculachada crítica, o jornalista Paulo
Henrique Amorim sintetiza a mútua ajuda que se estabeleceu: “o Jornal
Nacional não tem produção própria. A revista Veja não tem repercussão
nacional. O crime organizado se organiza na Veja e se expande no Jornal
Nacional”. Em um jornalismo sem ética, sem compromisso com a verdade e
interesses públicos, que se dane a verdade factual. O que interessa,
para esse tipo de jornalismo, é a versão dos fatos que atendam aos
interesses dos que mantém o monopólio da informação.
Sempre que é questionada por praticar esse tipo de jornalismo, a mídia
se defende afirmando que tem a capacidade de se autorregulamentar. O
conluio Veja-crime organizado sepultou essa tese. Até esse momento
impera o silencio da mídia burguesa sobre os vínculos da revista com a
organização criminosa do bicheiro.
O jornalista Jânio de Freitas, um dos mais renomados colunistas da
Folha, fez uma detalhada radiografia da organização montada pelo
contraventor e suas extensas ramificações. Não disse uma única palavra
das suas ramificações com a mídia. Mais do que escreveu, a sabuja lacuna
do seu artigo evidenciou o medo que impera entre o patronato da grande
mídia e a capacidade desse lamaçal engolir, inclusive, jornalistas
decentes.
Ao pacto de não noticiar a promiscuidade do grupo Abril com o crime
organizado juntam-se, agora que a CPMI está instalada, os esforços para
evitar que os que se beneficiaram com a organização criminosa do
Carlinhos Cachoeira sejam convocados a dar explicações no Congresso
Nacional e para sociedade.
O deputado federal Miro Teixeira (PDT/RJ) articula um pretexto jurídico
para impedir a convocação de jornalistas e proprietários das empresas de
comunicação envolvidas nas atividades criminosas do bicheiro.
Um dos mais altos executivos do grupo Abril já perambulou pelos
corredores e gabinetes do Congresso numa tentativa de evitar que seu
patrão, Robert Civita, tenha que prestar esclarecimentos na CPMI. A
Globo, fato noticiado, enviou um mensageiro para informar (ou seria
ameaçar?) o Palácio do Planalto: se o empresário Robert Civita for
convocado pela CPMI, os meios de comunicação declaram uma guerra sem
limites contra o governo.
É de lamentar que a Rede Globo não tenha a coragem de publicar essa
posição política nos editoriais dos seus jornais e divulgá-la em seus
telejornais.
Caso os parlamentares da CPMI se rendam às pressões dos grupos
empresariais da mídia, estarão sendo coniventes com práticas criminosas e
institucionalizado duas categorias de cidadãos nesse país: os que podem
ser convocados para depor numa CPMI e os que não devem ser convocados.
Há um enorme volume de informações e provas que atestam que setores da
mídia estão envolvidos com atividades de organizações criminosas e que
atentaram contra a democracia do nosso país. É inadmissível que os que
participaram ativamente na organização criminosa, e dela se
beneficiaram, não sentem no banco dos réus alegando, unicamente, a
condição de serem patrões.
O Congresso Nacional instalou, atendendo os anseios da sociedade, uma
CPMI para investigar as atividades do crime organizado com suas
ramificações na mídia e nas três esferas da estrutura do Estado. Os
parlamentares que compõe essa CPMI tem a responsabilidade de não
frustrar a sociedade, apurar os fatos com profundidade e criar as
condições para que seus responsáveis prestem contas à justiça, além de
legar ao país uma legislação que, ao menos, iniba essa prática de
jornalismo associado com o crime organizado. A Lei dos Meios de
Comunicação é cada vez mais necessária e inadiável.
*Opensadordaaldeia
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