A integração oceânica Brasil-Chile-Bolívia
Brasil, Chile e Bolívia vão inaugurar ligação entre oceanos em novembro
Os presidentes Luiz Inácio Lula da Silva, Sebastián Piñera, do Chile, e Evo Morales, da Bolívia, têm encontro marcado na primeira semana de novembro, para uma cerimônia repleta de simbolismo: a inauguração do Corredor Bioceânico Central, que deverá ligar o porto de Santos ao de Iquique, no Chile, passando pelo departamento (Estado) boliviano de Tarija, que faz fronteira com Argentina e Paraguai. "É um corredor de 3,8 mil quilômetros, com implicações importantes para a integração da região", disse ao Valor o ministro das Relações Exteriores do Chile, Alfredo Moreno.
"Vamos passar, agora, à segunda etapa, que é como administrar esse corredor de maneira que esteja sempre disponível, com normas aduaneiras, sanitárias e de trânsito homogêneas", disse o ministro, após reunir-se com o ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, em Brasília. Chile, Bolívia e Brasil devem se reunir em breve para discutir o tema. Moreno reconhece que, no corredor, ainda há cerca de 200 quilômetros de estrada na Bolívia sem pavimentação, mas diz ter recebido do ministro de Obras Públicas da Bolívia, Walter Delgadillo, com quem se encontrou em Santiago, a informação de que em "muito poucos meses" as obras estarão concluídas. "Será um acesso importante para os mercados asiáticos, os que mais crescem no mundo, com os quais temos acordos de livre comércio", disse o ministro chileno.
Os dois ministros realizaram em Brasília a primeira reunião da Comissão Bilateral Brasil-Chile, criada no ano passado. O Chile, que aderiu ao padrão de TV Digital desenvolvido pelo Japão com colaboração brasileira, e tem, desde 2008, acordo de livre comércio de serviços com o Mercosul, está muito interessado nas possibilidades de produção de conteúdo local para venda entre os dois países. Amorim e Moreno decidiram, também, iniciar na próxima semana negociações para um acordo de investimentos entre os dois países. "Estamos dispostos fazer o acordo dentro das restrições e do espírito que haja aqui, não vemos problema", disse Moreno, ao comentar o que, no Itamaraty, se descreve como "diferenças conceituais" entre Chile e Brasil sobre os acordos de investimento. Os chilenos preferem acordos clássicos, com regras abrangentes e a possibilidade de as empresas acionarem diretamente os governos caso se sintam prejudicadas. Os brasileiros veem barreiras constitucionais a esses acordos e defendem tratados de promoção e acesso a mercados nas áreas de investimento. As declarações do ministro chileno e de assessores de Amorim indicam que os dois países devem tentar um meio termo entre os dois modelos.
O acordo de investimento deve estimular o ingresso de capitais chilenos que, hoje, oficialmente, chegam a aproximadamente US$ 8 bilhões no Brasil (o ministro chileno fala em "mais de US$ 10 bilhões") e hoje têm, como destino preferencial na vizinhança os mercados de língua espanhola Argentina e Peru. "O governo brasileiro se mostrou muito interessado em avançar", comentou, satisfeito, o ministro chileno.
Os entendimentos entre os dois governos incluem até a associação em um prodígio científico, a construção do que será o maior telescópio do mundo, com um espelho de 42 metros de diâmetro, e capacidade de visualização até 15 vezes maior que os atuais supertelescópios em órbita da Terra. Construído por iniciativa da Organização Europeia para a Investigação Astronômica no Hemisfério Sul (ESO, na sigla em inglês), será instalado no Chile após intenso lobby do governo chileno (a Espanha disputava a localização) com apoio de Lula.
"O Brasil tomou a decisão de ser sócio, o primeiro não europeu", anunciou Moreno. O tamanho do aporte, ainda em negociação, deve ficar em torno de 10% de projeto, que, calcula o ministro, pode ficar em cerca de € 1 bilhão. "Isso significará maior acesso dos cientistas brasileiros ao projeto mas, também, há intenção de que as empresas brasileiras e chilenas participem da construção", adianta Moreno. Por envolver tecnologia avançada, a participação deve gerar não só contratos, como melhorias tecnológicas para essas empresas, argumenta.
Na visita ao Chile, em novembro, Lula deverá passar uma noite no vizinho telescópio de Paranal, também operado pela ESO, que resistiu ao terremoto que abalou o país no ano passado. O Chile vem se recuperando da catástrofe, que danificou severamente a infraestrutura do país. Impulsionada pelo otimismo dos consumidores e investidores, pelos programas de reconstrução do governo e pela persistente alta das commodities exportadas pelo país, como o cobre, a economia chilena cresceu 7% no mês passado a taxas anualizadas e deve crescer em média 5% a 5,5% neste ano, conta o ministro, dizendo-se entusiasmado com o surpreendente ritmo da recuperação.
Do Valor
Sergio Leo, de Brasília
By: Luis Nassif Online
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