Páginas

Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

sexta-feira, dezembro 03, 2010

Tratado indesejável de Jobim: Base norte-americana


Segundo a imprensa internacional, prevê-se a instalação de uma base norte-americana no Brasil. A última base americana em nosso chão se limitava ao acompanhamento dos primeiros satélites artificiais, em Fernando Noronha. Ela foi discretamente fechada em 1961, por iniciativa de Tancredo que, como primeiro-ministro, negou-se a prorrogar o convênio, sob o argumento de que ainda não obtivera a opinião das Forças Armadas.
Geisel, em 1977, em pleno regime ditatorial, denunciou o Tratado Militar que tínhamos com Washington, e fora renovado em 1952, por iniciativa de João Neves da Fontoura, contra a opinião do ministro da Guerra de então, o general Estillac Leal – que se demitiu como protesto. É da restauração paulatina desse antigo Tratado que se trata.
Antes houve a base de Natal, no esforço comum da guerra contra a Alemanha nazista. Terminado o conflito, em 1945, Getúlio agradeceu muito a contribuição norte-americana e, mesmo com as pressões ianques a fim de manter o enclave militar, dispensou-os desse cuidado. Não havia necessidade de tanto dispêndio para a nossa hipotética proteção.
O fato é que as negociações para a instalação de uma base norte-americana no Brasil, para o combate às drogas, foram anunciadas, em Quito, pelo subsecretário de Estado para o Hemisfério Ocidental, Arturo Valenzuela, e repercutiram no exterior, em que pesem os desmentidos do Brasil. Apesar de sua cuidadosa linguagem diplomática, a nota oficial do Itamaraty não é suficiente para afastar as dúvidas: trata, em termos vagos e genéricos da “cooperação em assuntos da defesa” e intercâmbio no treinamento militar.
Nós conhecemos essa antiga canção, que nos remete ao centro de doutrinamento ideológico do Panamá. Ali muitos de nossos oficiais foram moldados para a submissão aos interesses norte-americanos, em nome da divisão do mundo entre os bons (os ianques) e os maus (quaisquer outros que contestassem a sua hegemonia). Foram alguns deles, com Castello Branco, Lincoln Gordon, Vernon Walters, a Quarta Frota e a CIA, que fizeram o golpe de 1964.
Esse Tratado compromete o futuro do país e tem um motivo estratégico maior por parte de Washington, ainda que bem dissimulado e a prazo mais longo: o controle da Amazônia e a reconquista do poder colonial sobre o continente.

Texto de Mauro Santayana em abril de 2010
*CelsoJardim

Nenhum comentário:

Postar um comentário