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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

segunda-feira, outubro 17, 2011

Bolsa-Família é caro? O “bolsa-rentista” é mais…

O jornal Valor Econômico traz hoje um levantamento do número de famílias que deixaram de receber, por elevação da renda, os benefícios do Bolsa-Família. São 2,227 milhões, o que equivale a cerca de 10 milhões de brasileiros que deixaram a pobreza extrema. E este número pode ser ainda muito maior se cosideramos de nos outros 3,6 milhões de benefícios cancelados, muitos deles têm a melhoria da situação como motivo pelo desinteresse em comprovar o cumprimento das condicionalidades em educação e saúde ou mesmo de participar dos recadastramentos.
Por mais que sejam importantes os cursos de qualificação oferecidos aos beneficiários, o cerne desse fenômeno é o crescimento da economia e, com ela, do emprego.
Dez milhões de pessoas saírem de um estado de semi-indigência já teria valido o investimento. Mas ele rendeu mais, embora continue sendo atacado de forma obtusa por quem procura encobrir sua insensibilidade debaixo de razões contábeis.
Ontem, o jornal O Globo deu manchete para um “escândalo”: os programas de transferência de renda somam o dobro dos recursos orçamentários previstos para investimentos públicos.Ou R$ 114 bilhões, contra R$ 44,6 bilhões.
A conta não se sustenta para quem não tem uma obtusa “cabeça de planilha”, como diz o jornalista Luís Nassif.
A primeira e fundamental diferença entre um e outro gastos é simples: as transferências de renda se convertem, imediatamente, em consumo e este em impostos. E consumo de pobre, já se mostrou aqui, paga muito imposto: mais de 40%, segundo o Ipea, para famílias de até dois salários mínimos de renda.
Portanto, mais de 40% destes recursos voltam  para os cofres públicos da União, Estados e Municípios quase que de imediato, ao contrário do que ocorre com os investimentos, que retornam em escala menor e mais lenta aos cofres públicos.
Mas o jornal não toca nem de leve no xis da questão quando se fala na falta de recursos para investimentos públicos.
Porque isso mexe com um “santo” do altar neoliberal: os juros.
O país vai pagar, este ano, R$ 240 bilhões em juros e serviço da dívida pública. Talvez um pouco menos, se o Copom, esta semana, baixar um pouco mais a taxa Selic, porque cada ponto percentual dela vale a bagatela de R$ 17 bilhões. Fora outros R$ 110 bilhões que os juros tiram das pessoas e empresas.
Em termos proporcionais, isso representa 36% do Orçamento, contra 17% dos programas de transferência de renda para os pobres e 7% de investimentos.
Mas essa rubrica, a mais pesada de todo o Orçamento é intocável, não é?
Aliás, no , o presidente da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas, Luiz Aubert Neto, usa uma frase perfeita para definir o que é a política de endividamento e juros altos que o Brasil segue – e é prisioneiro dela, em boa parte – desde o início do governo FHC:
- A política de juros altos dos últimos 17 anos representa a maior transferência de renda da história do capitalismo neste planeta.
Transferência de renda para os ricos, claro. Esta não escandaliza O Globo.
*Tijolaço

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