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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

domingo, outubro 09, 2011

Os taradões do Zorra Total, na vida real são defendidos pela TV Globo

Desde 2006, existe uma lei estadual no Estado do Rio de Janeiro, que obriga o Metrô e os trens urbanos a terem um vagão exclusivo para mulheres nas horas de superlotação.  Outros estados eu não sei.

A lei até envergonha, pois expõe um comportamento medieval que nem deveria existir, mas revelou-se necessária porque existem tarados à solta que não tem cerimônia em atentar passageiras com bolinação e abuso sexual, exatamente como acontece em um quadro no programa humorístico Zorra Total, da TV Globo.

Severino, personagem que representa porteiro da Rede Globo, bolina e abusa sexualmente de passageiras do Metrô. Uma TV concorrente não poderia fazer melhor para detornar a imagem da própria Globo.
Os criadores do humorístico, que só devem andar de carro e se lixar para realidade do povão, acham engraçado, acham uma coisa "non-sense", pois não faz parte de sua realidade, nem de suas mães, nem de suas filhas, nem de suas irmãs.

Mas a realidade das passageiras do Metrô e trem que tiveram o dissabor de passar por uma situação torpe destas, não tem nada de engraçado.

E o caso incomoda a tanta gente que mobilizou a Assembléia Legislativa do Rio de Janeiro, a criar a citada lei, com votação em plenário e tudo que tem direito.

Primeiro leiam esta reportagem do Jornal do Brasil, publicada em 2009, (em seguida volto ao assunto):

Mulheres relatam abuso sexual em vagões de trem no Rio

Lauricéia de Souza, moradora de Queimados, no Estado do Rio de Janeiro, acorda às 5h30 todos os dias para estar na estação ferroviária às 7h15 e pegar o trem para o Méier, zona norte da capital, onde trabalha como doméstica. Tanto para ir quanto para voltar, viaja em composições lotadas e viveu um drama que ainda é uma constante, apesar da lei de 2006 que criou os vagões exclusivos para mulheres: o abuso sexual.

"Eu estava de saia e não dava nem para me mexer de tão cheio que estava. Na hora, não senti nada, mas, quando desci, o vento bateu e senti que minha saia estava úmida. Que nojo, fiquei revoltada, um homem tinha ejaculado em mim. Lauricéia, 33 anos, diz que a criação do vagão exclusivo para mulheres nos horários de pico foi uma lei que não pegou.

"Você está vendo alguma placa indicando o vagão feminino?", pergunta ela. "Isso na prática não existe, quando as portas abrem, os homens entram em todos os vagões, não tem organização".

Também doméstica, só que empregada numa residência em Madureira, Carmem Lúcia de Jesus, 40 anos, pega trem há 10 e dá graças a Deus por nunca ter sofrido violência semelhante. Segundo ela, diante da passividade dos agentes de controle da SuperVia e dos policiais militares do Grupamento de Policiamento Ferroviário, os homens que são descobertos abusando sofrem um justiçamento dos próprios passageiros.

"Na estação de Ricardo de Albuquerque eu vi um homem botar o 'negócio' dele por baixo da minissaia de uma garota. Ela se virou e meteu a mão na cara dele", relata. "Quando o pessoal que estava em volta viu, começou a bater também. Ele acabou expulso do trem".

Segundo a assessoria de imprensa da SuperVia, a empresa segue a lei número 4733/2006, que obriga as concessionárias de trem e metrô a disponibilizarem e identificarem um vagão exclusivo para mulheres nos horários de maior movimento, entre 6h e 9h e das 16h às 20h.

A representante comercial Rosângela Souza, 37 anos, moradora de Nilópolis, diz que evita os trens nesses horários justamente para não correr riscos. E acha a legislação insuficiente para coibir os abusos. "Hoje, a maioria das mulheres trabalha fora. Um vagão só não dá conta. Acho que tem mais mulher do que homem nos trens. E não há segurança nenhuma dentro dos vagões, os agentes só entram quando é para tirar vendedor ambulante", desabafa.

Revolta geral

O ambulante Geraldino Nascimento dos Santos, 69 anos, 30 vendendo mercadorias clandestinamente nos trens, diz que já ajudou a linchar um homem flagrado abusando de uma mulher. "Quando o cara dá mole, até camelô ajuda a bater".

Geraldino lembra o caso acontecido com uma vizinha sua. "Ela era toda fortona, morava em Engenheiro Pedreira e ia para a academia em Queimados fazer ginástica. Um cara chegou a ejacular na malha dela. Como ela era forte, saiu batendo nele e todo o pessoal ajudou", disse.

Jonas Eleutério, 50 anos, também viu os usuários fazendo justiça com as próprias mãos. "O homem se roçou na mulher e ela reclamou. Quando as portas se abriram na estação de Cascadura, só vi o cara correndo e uns 15 atrás dele para bater.

Luciana Alves, 24 anos, que na tarde da última quinta-feira viajava de Japeri para Manguinhos com os filhos Wallace, 8, e Gabriela, 2, estava tranqüila em um trem quase vazio. Ela deu sua receita para não ter maiores dissabores quando o vagão está lotado. "O negócio é entrar, correr para um cantinho e ficar escondida ali, junto da parede. Já vi muita coisa horrível, mas comigo, graças a Deus, nunca aconteceu". Segundo a SuperVia, há entre 150 agentes trabalhando por turno espalhados pelas 89 estações. A empresa alega que o número de policiais militares que lhes dão apoio diariamente, cerca de 30, não deveria ser menor do que 100.

Por causa destas coisas que acontecem aí acima, o próprio programa da TV Globo, por conta própria, deveria retirar a bolinação de cena.

Vejam bem: ninguém está pedindo para censurar o programa, nem tirar o quadro do ar, apenas retirar a parte que banaliza o crime de abuso sexual, por exercer uma clara influência negativa na sociedade.

Há formas de continuar fazendo o humor, sem apelar para naturalizar crimes.

As mulheres do Sindicato dos Metroviários de São Paulo repudiaram a cena em carta aberta à população:


A SPM (Secretaria de Políticas para Mulheres do governo federal), através da sub-secretária, Aparecida Gonçalves, enviou uma nota de apoio às metroviárias de São Paulo.

A turma da imprensa atucanada vislumbrou uma "oportunidade" de fazer guerra política, atacando mais uma vez a ministra Iriny Lopes, deturpando um problema (que é muito mais sério do que parece para quem não o vivencia), com os velhos chavões de "censura" (o que ela desmentiu nesta nota oficial), de "ditadura do politicamente correto", de "liberdade de expressão".

Não existe censura, existe liberdade de expressão, e neste caso não existe sequer o conceito de politicamente correto, existe só o politicamente.

E, politicamente, quais estão sendo as escolhas políticas da TV Globo?

- Defender a (falsa) "liberdade de expressão" dos taradões dentro do Metrô e trens.

- Censurar a voz de quem se recusa a sofrer abuso sexual dentro de Metrô e trens.
*Osamigosdopresidentelula

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