A Rota da imprensa
Colunistas de Veja.com, Reinaldo Azevedo e Augusto Nunes, em
artigos sucessivos, exigem para Lula o mesmo que a ditadura militar
determinou a ele em 1980: prisão; o primeiro quer até quatro anos; seu
vizinho, algemas; eles merecem rodar ao volante e na janelinha de uma
viatura da Rota
A partir de 19 de abril de 1980, em plena vigência da ditadura militar,
no plantão de João Figueiredo e sob a custódia do delegado Romeu Tuma,
Luiz Inácio Lula da Silva passou 30 dias no xadrez do temido Dops – o
Departamento de Ordem Política e Social. A ditadura acabou, Figa e Tumão
morreram e o Dops foi extinto. Mas há quem continue querendo mandar
Lula para trás das grades outra vez. Mais precisamente, e não por
coincidência, dois dos mais hidrófobos colunistas de Veja.com: Reinaldo
Azevedo e Augusto Nunes, vizinhos de página virtual.
Cada um ao seu modo, Azevedo com seus jatos biliáticos e Nunes usando e
se lambuzando de adjetivos, eles partiram de dois fatos isolados, sem
dúvida protagonizados por Lula, para embicarem seus leitores na rota do
autoritarismo. Ao mesmo tempo investigadores e juízes, fizeram como se
estivessem um ao volante de uma daquelas antigas viaturas da Rota, e o
outro na janelinha, para exigirem cadeia sem recurso para o que
entenderam como crimes de Lula.
Reinaldo enxergou na conversa reproduzida à Veja pelo ministro Gilmar
Mendes, do STF, e negada à revista pelo ex-ministro Nelson Jobim, um
verdadeiro atentado de Lula sobre a autonomia do Supremo – ainda que o
próprio Mendes, em sua versão atrasada em 30 dias sobre o fato, mal
tenha sido enfático sobre a pressão que sobre ele teria sido praticada.
Para o colunista, no entanto, Lula deveria ser enquadrado imediatamente
no Código Penal como quem tentou obstruir a Justiça e, assim, amargar
uma pena de até quatro anos de cadeia.
Nunes, cuja pena claudica à direita num movimento que pode manchar de
maneira indelével sua biografia de jornalista centrado, é sempre mais
engraçado que Reinaldo, além de ter um estilo incomparavelmente melhor.
Mas igualmente escorregou para a pressa e o açodamento, ao enxergar na
entrevista de Lula ao Programa do Ratinho um ataque do ex-presidente à
legislação eleitoral que mereceria não menos que a humilhante prisão em
flagrante com algemas. Nada de reprimendas, multas ou até mesmo a
cassação do candidato beneficiado, mas cadeia, xadrez, xilindró. É
autoritarismo demais, né, não?
O problema dos dois colunistas não está em seu posicionamento político.
Eles podem, é claro, escrever o que quiserem – a tela do computador,
afinal, aceita tudo. Mas ao usarem o poder de crítica para pedir a
ultrapassagem de todo os ritos democráticos legais existentes na
sociedade para tratar de casos como os mencionados – e levar Lula direto
de volta para a cadeia -, do primeiro ao quinto se associaram ao que a
ditadura fez com o ex-presidente. O pior é que nessa Rota da imprensa
ainda tem mais gente querendo entrar para fazer patrulha. Hoje, como
dantes, Lula ainda incomoda demais.
No 247
*comtextolivre
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