Criada à direita, Aliança do Pacífico rivaliza com o ‘esquerdista’ Mercosul
Via Carta Capital
Gabriel Bonis
Novo bloco quer integrar a América Latina com bases liberais e sem burocracias do Mercosul. Foto: Hamner_Fotos/Flickr
Há
cerca de um mês, a criação de um bloco de integração na América Latina
passou quase despercebida no Brasil, mas aparentemente não entre os
líderes do Mercosul. A entrada da Venezuela no mercado sul-americano é
apontada como uma reação à Aliança do Pacífico. Formado por Chile, Peru,
Colômbia e México, o acordo prevê a integração das economias dos países
do oceano Pacífico para que seus integrantes enfrentem a concorrência
asiática e se transformem no motor do crescimento latinoamericano. Uma
proposta que imporá desafios ao projeto de expansão do Mercosul, como a
solução de problemas internos de seus membros, mas sem inicialmente
ameaça-lo.
A Aliança do Pacífico aposta na
diversificação de suas relações comerciais para conter o avanço chinês
na região, ao mesmo tempo que aproveita os benefícios da demanda
asiática por commodities. Todo esse fluxo de comércio comporia
uma área de livre circulação de bens, serviços, capitais e pessoas, em
um projeto semelhante ao Mercosul. A principal diferença apontada pelos
líderes dos países do novo bloco, no entanto, seria a busca por uma
integração rápida. Algo que tornaria o mecanismo mais atraente, embora
ele já seja visto como a iniciativa “mais importante” e ambiciosa da
região pelo economista Roberto Teixeira da Costa, presidente da Câmara
de Arbitragem da Bolsa de Valores de São Paulo. Para ele, o plano acerta
ao explorar a ligação com Pacífico, que coloca o bloco na rota
preferida das Américas com a Ásia, logo, em vantagem ao Mercosul na
concorrência pelo mercado asiático.
O novo
bloco, que reúne 40% do PIB da América Latina, 55% de todas suas
exportações e um mercado de 206 milhões de consumidores, possui planos
ambiciosos na relação entre seus membros. O projeto foca na consolidação
de novos investimentos, principalmente em uma maior integração
energética e de infraestrutura, e mais comércio intrarregional (com
colaboração alfandegária). A Colômbia seria o referencial para as
exportações da produção geral, por possuir tratados de livre comércio
com EUA, Canadá e China, por exemplo. Um fator que pode levar esses
itens aos mercados citados em melhores condições de preço que os do
Mercosul.
A Aliança também ataca à burocracia,
apresentando o Mercado Comum Sul-americano como um exemplo a ser
ignorado. O grupo pretende avançar de forma mais rápida sem impedimentos
ideológicos em temas comerciais e de integração, abominando itens como
barreiras protecionistas. O discurso é totalmente liberalizante, seja
nas tarifas, comércio eletrônico, cooperação aduaneira ou investimentos.
E mostra também uma divisão ideológica entre os governos dos países da
América do Sul. Enquanto o Mercosul vive um momento de líderes de
esquerda – com a exceção do Paraguai após a deposição de Fernando Lugo
-, a Aliança do Pacífico reúne os países mais neoliberais da América
Latina. A exceção fica com o presidente do Peru, Ollanta Humala, da
esquerda. Mas o mandatário está preso ao bloco, proposto pelo
ex-presidente Alan García, que conduziu reformas liberais no país
andino.
O projeto pretende ter grande
envergadura regional e abocanhar novos membros. Um discurso que começa a
rivalizar com os planos de integração do Mercosul. O novo ministro da
Fazenda do Paraguai declarou na última semana que a suspensão do país do
mercado comum sul-americano empurra o governo paraguaio a buscar
alianças com outros países e blocos, que incluem os EUA e países da
Aliança do Pacífico. Mas para Giorgio Romano Schutte, coordenador do
curso de Relações Internacionais da Universidade Federal do ABC (UFABC),
essa ameaça poderia ser contornada com os países de ambos os blocos
realizando acordos econômicos mais flexíveis por meio da Unasul (União
de Nações Sul-Americanas), embora sempre em alerta ao eventual avanço da
Aliança. “Se a AP entrar na América do Sul, seria um cenário que a
diplomacia brasileira deve atuar.”
Apesar dessa
pressão, o Mercosul não deve sentir-se ameaçado. Alguns elementos da
formação da Aliança indicam possíveis dificuldades de integração dos
países do novo bloco. Entre eles, a heterogeneidade dos interesses
comerciais de seus integrantes. Tullo Vigevani, professor da
Universidade Estadual Paulista (Unesp) e especialista em Mercosul,
destaca que o fato de México, Colômbia, Chile e Peru estarem ligados por
tratados de área de livre comércio com os EUA coloca a possibilidade de
uma integração regional e produtiva, como se pretende no Mercosul,
difícil de se deslumbrar. Até porque os países da aliança também possuem
acordos com o Mercosul.
Para o analista, o
Mercosul tem mais chances de seguir consolidar uma integração regional.
Isso dependeria, no entanto, de uma solução por parte dos governos dos
países do bloco para suas dificuldades regionais e de desenvolvimento
interno, que tendem a sinalizar com medidas protecionistas. “Isso não é
bom para uma integração, a não ser que se pensasse em um regional
desenvolvimentismo.”
*GilsonSampaio
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