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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

sexta-feira, julho 06, 2012

De todas as manifestações sobre o ingresso da Venezuela no MERCOSUL, a mais lúcida e transparente me pareceu a do presidente uruguaio José Mujica, que a classificou como resposta ao Congresso paraguaio, que destituiu o presidente Fernando Lugo, e ao surgimento de novos elementos políticos.



Dilma Rousseff  e José Mujica
Publicado em 05/07/2012 por Mair Pena Neto*
De todas as manifestações sobre o ingresso da Venezuela no MERCOSUL, a mais lúcida e transparente me pareceu a do presidente uruguaio José Mujica, que a classificou como resposta ao Congresso paraguaio, que destituiu o presidente Fernando Lugo, e ao surgimento de novos elementos políticos.
Política é a palavra chave. O MERCOSUL e a UNASUL não são apenas blocos de interesses comerciais. O mundo não se guia apenas pelo comércio ou pela economia. As tentativas neste sentido estão aí, palpáveis, com a crise de gigantescas proporções que assombra o mundo. Parafraseando o assessor de campanha de Clinton, James Carville, que cunhou a famosa expressão “É a economia, estúpido!”, para destacar o impacto da saúde econômica nos resultados eleitorais, diria que “É a política, estúpido!” quem precisa orientar decisões de governos que desejam se manter  soberanos.
O que Mujica buscou dizer é que o MERCOSUL corria risco com a ascensão do governo ilegítimo do Paraguai, que ameaçava contaminar o bloco ao ignorar suas gestões em prol da legitimidade democrática naquele país. A decisão do ingresso da Venezuela no MERCOSUL foi tomada em 2006, mas o Senado paraguaio, cujo caráter o mundo todo conheceu no processo sumário de deposição de Lugo, vinha impedindo sua consolidação.
Pelo aspecto puramente comercial, não havia como rejeitar o ingresso venezuelano, já que o tamanho de sua economia e sua riqueza petrolífera só contribuiriam para fortalecer o bloco e seus projetos de integração. A barreira imposta pelo Senado paraguaio era política. A mesma que se viu por aqui entre forças minoritárias no Congresso nacional. No avanço de setores progressistas na América do Sul, o Congresso paraguaio ficou como bastião conservador, uma espécie de UDN ou DEM ao sul do continente.
O golpe “constitucional” contra Lugo, que ficou isolado em meio às forças retrógradas do país, foi também um golpe contra o MERCOSUL e a UNASUL, que precisavam reagir politicamente à ameaça. E o fizeram de forma clara, dentro dos princípios de respeito à democracia que regem os grupos. O Paraguai foi suspenso - no âmbito do MERCOSUL sua expulsão jamais foi cogitada - e a Venezuela admitida, como desejavam Brasil, Argentina e Uruguai, que foram unânimes em aprovar seu ingresso.
Mujica conta que na reunião entre os presidentes dos três países surgiram os “novos elementos políticos”, que evidenciaram que “o político superava largamente o jurídico”. O presidente uruguaio se referia a marcos iniciais do MERCOSUL, que remetem à hegemonia neoliberal dos anos 90 e que ficaram para trás. O MERCOSUL e a UNASUL precisam refletir os novos tempos no continente. E eles vão muito além das relações comerciais, preocupando-se também com infraestrutura, industrialização, defesa, finanças e saúde, entre outros.
Essa nova concepção se fundamenta na visão de governos progressistas, que se tornaram majoritários no continente, e precisam estar unidos e atentos para evitar retrocessos, como o que se viu em Honduras, como o que acaba de acontecer no Paraguai e que foi tentado, sem sucesso, na Bolívia e no Equador.
Mair Pena Neto*é  jornalista, carioca e trabalhou em O Globo, Jornal do Brasil, Agência Estado e Agência Reuters. No JB foi editor de política e repórter especial de economia.
Enviado por Direto da Redação

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