O "mensalão" como operação de marketing e como golpe branco fracassado
Mais além dos fatos concretos, a operação de marketing do “mensalão”
merece fazer parte dos manuais de marketing politico. Nunca na história
brasileira uma criação dessa ordem foi capaz de projetar e consolidar
imagens na cabeça das pessoas, que as impedem de entender o fenômeno e
avaliá-lo na sua realidade concreta, porque sua imaginação, seus
instintos, já estão vacinados e conquistados pelas imagens projetadas
pela campanha.
Uma jornalista da empresa da “ditabranda” entrevistou um dia a um
parlamentar, presidente de um dos partidos da base aliada do governo,
que teve uma das pessoas indicadas pelo partido para um cargo
governamental, pego em flagrante , filmado, com som, em operação de
suborno. O partido que o indicou – PTB – considerou que nao recebeu o
apoio devido por parte do governo e seu presidente resolveu ligar o
ventilador.
Disse que o governo pagava um “mensalão” a uma porção de gente. O jornal
imediatamente cunhou a expressão e deu inicio àquele tipo de campanha
cuja reiteração, por todos os órgãos da mídia privada, transformou a
insinuação numa verdade supostamente incontestável.
O que ficou na imaginação das pessoas era literalmente que indivíduos
chegavam no Palácio do Planalto com malas vazias, entravam numa sala
contigua à do Lula, enchiam de dólares e saiam, mensalmente. A operação
de marketing tornou-se um caso de manual de marketing, pelo seu sucesso.
A partir a insinuação de um politico sem nenhuma respeitabilidade, se
dava inicio à campanha, em que a oposição – liderada pela mídia privada –
considerava que terminaria com o governo Lula.
Tudo foi se dando como bola de neve. O próprio jornal da família que
emprestou carros para órgãos repressivos da ditadura cunhou o selo
“mensalão”, com o qual cobria todas as atividades políticas nacionais.
Até a eleição interna do PT foi incluída nessa rubrica.
Condenou-se moral e politicamente a dirigentes e políticos ligados ao
governo, com o objetivo de ferir de morte o governo Lula, como repetição
muito similar à crise de 1954, que terminou com o suicídio do Lula.
Dois então membros da equipe do Lula chegaram – conforme entrevista
posterior de Gilberto Carvalho – a ir ao Lula, levando a proposta
opositora: todas as acusações seriam retiradas, inclusive o suposto
impeachment, contanto que Lula renunciasse a se candidatar à reeleição.
Tinham receio de propor impeachment, pelas repercussões populares que
poderia ter, então preferiam usá-lo como ameaça. O tiro saiu pela
culatra. Lula reagiu dizendo que sairia às ruas para defender seu
mandato, convocava os movimentos populares a reagir à tentativa de golpe
branco.
A oposição, depois da cassação do Zé Dirceu, jogava, partindo do que
considerava evidências contra o governo, com a vulnerabilidade do
governo, alegando que Lula sabia dos fatos. Não foi o que aconteceu.
Conseguiram várias cassações, conseguiram diminuir o apoio do Lula mas,
principalmente, deram a pauta política do país.
O caso permitia desqualificar o Estado, o governo Lula, o PT. O Estado,
por definição, para a direita, é corrupto ou corruptível. O governo
Lula, o PT e os sindicatos teriam “tomado de assalto ao Estado” e
imposto seus interesses particulares. O diagnóstico foi retirado
diretamente do arsenal neoliberal.
Os governos de esquerda no Brasil – Getúlio, Jango, Lula – não
terminariam seus mandatos. Fracassado o governo Lula, se cumpriria o
prognóstico de um ministro da ditadura: “Um dia o PT vai ter que ganhar,
vai fracassar, aí vamos poder dirigir o país com tranquilidade”.
Sob a forma do impeachment ou da renúncia de Lula a disputar um segundo
mandato ou, ainda, com sua eventual derrota, asfixiado pela oposição –
que já havia dito que sangraria o governo, até derrotá-lo nas eleições
de 2006 -, se daria um golpe branco e a esquerda estaria desmoralizada e
derrotada por um longo período.
Mas não contavam com a capacidade de reação de Lula e com os efeitos das
políticas sociais, já em marcha. O povo, com a consciência de que era o
seu governo e que sua eventual derrubada faria com que ele, povo,
pagasse o preço mais alto da operação da direita, reagiu. A oposição foi
pega de supresa pelas reações, que levaram à derrota da tentativa de
derrubar o governo. Mais do que isso, levaram à derrota do candidato da
oposição – o duro e puro neoliberal Alckmin –, porque a oposição também
foi vitima da sua própria campanha.
Como esbravejava o Otavinho, na primeira reunião do comitê de direção da sua empresa: - Onde é que nós erramos?
Erraram porque acreditaram que eram onipotentes. Afinal foi a mídia
golpista que levou o Getúlio ao suicídio, que promoveu o golpe militar
que derrubou o Jango e que, acreditavam, levaria o governo Lula à
derrota e a esquerda à desmoralização.
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