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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

domingo, julho 08, 2012

Partícula de Higgs é mais uma vitória da ciência sôbre a religião

Representação das experiências do Centro de Pesquisa Nuclear
Tem havido muita comoção desde o dia 4 de julho, quando houve o anúncio de que o Centro Europeu de Pesquisa Nuclear tinha descoberto evidências de uma nova partícula elementar, a Higgs, que os cientistas têm procurado há quase 50 anos e está no cerne da nossa melhor teoria atual sobre a formação do cosmo.

Parte da comoção parece vir do fato de que a descoberta tem sido frequentemente chamada em círculos informais de “partícula de Deus”.

Esse termo apareceu pela primeira vez no título infeliz de um livro escrito pelo físico Leon Lederman, há duas décadas. Mas, pelo meu conhecimento, nunca foi usado por qualquer cientista antes ou depois da descoberta da partícula, incluindo o próprio Lederman. Apesar disso, o termo "colou” no imaginário da imprensa.

O que torna o termo “partícula de Deus” lamentável é que nada poderia estar mais longe da verdade. Porque a existência da partícula de Higgs, caso confirmada, implica uma revolução sem precedentes em nossa compreensão da física fundamental e traz a ciência mais perto de dispensar a necessidade de quaisquer manobras sobrenaturais para explicar o começo do universo e talvez até mesmo antes de tudo.

A descoberta da partícula pressupõe um campo invisível (o campo de Higgs) que permeia todo o espaço. E sugere que as propriedades da matéria e das forças que governam a nossa existência derivam de sua interação com o que tem parecido ser o “espaço vazio”.

Se a magnitude ou as propriedades do campo de Higgs tivessem sido diferentes, nós não estaríamos aqui agora.  Além disso, o campo de Higgs confirma a noção de que o espaço aparentemente vazio pode conter as sementes de nossa existência.

Essa ideia está no cerne de uma das mais ousadas teorias da cosmologia, cujo nome é "inflação cósmica". Por essa teoria, após o big bang, em um fração de segundo houve a conversão de toda  a energia contida no espaço em matéria e na sua radiação que vemos hoje. Alan Guth, o autor dessa teoria, costuma dizer que esse foi “o último almoço grátis”.

As experiências notáveis do Centro Europeu de Pesquisa Nuclear reforçam duas possibilidades potencialmente incômodas. Primeira: muitas das características de nosso universo, incluindo a nossa existência, podem ser consequências acidentais de condições associadas com o nascimento do universo. Segunda: a criação de “coisas” a partir do “não material” parece ser factível, em um fenômeno para ocupar o espaço ou talvez uma “manifestação” do próprio espaço.

Os seres humanos, com seu cérebro e ferramentas notáveis, parecem ter dado um passo gigantesco para substituir de uma vez por todas a especulação metafísica pelo conhecimento empiricamente verificável. A partícula de Higgs é mais relevante do que a ideia da existência de um Deus. 

Campo de Higgs

Publicado originalmente no The Daily Beast, este texto foi traduzido e adaptado para o português por este site.

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Paulopes

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