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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

sábado, junho 15, 2013


Elevação da taxa de juros vai aumentar a inflação e prejudicar trabalhadorO Banco Central decidiu no dia 30 de maio aumentar a taxa de juros de 7,5% para 8%. Foi o segundo aumento consecutivo este ano. A taxa Selic é usada pelo governo para negociar os títulos da dívida pública e é referência para as demais taxas de juros da economia. Portanto, também vão subir os juros do cheque especial, do crediário, do cartão de crédito e dos empréstimos.
A consequência imediata da elevação da Selic é que o governo vai gastar mais com os banqueiros e especuladores que possuem títulos da chamada dívida pública e menos com a saúde e a educação do povo brasileiro. De fato, segundo a Auditoria Cidadã da Dívida, em 2012, com uma taxa de juros de 7,25%, o Governo Federal, gastou R$ 752 bilhões com juros e amortizações da dívida. Com o aumento da Selic para 8%, o gasto com a dívida pode ultrapassar R$ 900 bilhões.
A justificativa apresentada pelo Banco Central para aumentar os juros é de que “a decisão contribuirá para colocar a inflação em declínio”. Porém, em abril, quando elevou a Selic de 7,25% para 7,5%, a alegação foi a mesma, mas a inflação cresceu em vez de diminuir. Aliás, taxa de juros baixa em lugar nenhum do mundo é responsável pela inflação. Nos Estados Unidos, por exemplo, a taxa de juros é de 0,25% e a inflação é 1,06% ao ano. Na Alemanha, a taxa de juros é menos de 1% e a inflação não passa de 1,15%.
Na verdade, o objetivo da decisão do Banco Central não é diminuir a inflação e sim favorecer o capital financeiro, o chamado “rentismo”, um reduzido número de famílias que não trabalham e vivem de renda, particularmente das aplicações financeiras nos títulos da divida pública. São cerca de 52 mil bilionários que possuem 527 bilhões investidos em títulos da dívida num país que tem quase 200 milhões de habitantes.
Esses agiotas, desde o ano passado vêm usando seus meios de comunicação para exigir a elevação da taxa de juros. Com efeito, desde 2011, quando os juros pagos pelo Governo caíram de 12% para 7,25%, algumas asaplicações financeiras chegaram a perder para a inflação e muitos milionários viram suas riquezas estacionarem. Como na época do imperialismo capitalista, existe uma completa fusão entre o capital financeiro e o capital industrial e comercial, a burguesia (a classe que é dona dos bancos, mas também das fábricas, da terra e dos supermercados), ajudada pelos bancos internacionais e pelos fundos de investimentos que transformaram os alimentos em ativos financeiros (commodities), decidiu elevar os preços das mercadorias para reaver lucros provocando o aumento da inflação. Para esconder seus objetivos, culparam o tomate.
Ora, aumentar juros não diminui a inflação, mas a eleva. Com efeito, com o aumento dos juros, os custos para produzir também crescem e os preços dos produtos sobem. Com os preços mais altos, o trabalhador passa a gastar mais para se alimentar, para comprar roupa, sapato, eletrodomésticos, e sua dívida aumenta. Com o crédito mais caro e os preços dos produtos mais elevados, principalmente quando comprados a prazo, meio usado pela esmagadora maioria do povo, a tendência é de o consumo cair, o que levaria aos preços diminuírem e, consequentemente, cair a inflação. Porém, antes de a inflação cair (o que é pouco provável), o povo vai pagar mais caro por cada produto que comprar, as empresas vão deixar de investir na produção para aplicar no mercado financeiro e muitas vão demitir porque o consumo foi reduzido. Em outras palavras, a decisão do BC beneficia os especuladores, mas prejudica o trabalhador.
Trata-se, portanto, de um crime contra a economia popular, pois os brasileiros já consomem muito pouco e milhões de pessoas fazem apenas uma refeição por dia. Do outro lado,com a alta dos juros, os ricos ganharão rios de dinheiro.
A alta dos juros também vai piorar a situação de crise na economia, pois os investimentos produtivos vão diminuir. Como o que move os capitalistas é o lucro máximo, e com os juros subindo, as aplicações no mercado financeiro vão gerar ganhos maiores, a classe dos ricos vai aplicar seu capital onde obtiver maior lucro, mesmo que ele seja fictício. Prova disso é a declaração dada no ano passado pelo dono de um dos maiores conglomerados industriais do país, Antônio Ermírio de Morais. Disse ele: “Em menos de 10 anos, o Banco Votorantim lucrou mais do que todo o grupo em toda a sua história!”.
Logo, a decisão do BC não vai estimular o investimento produtivo e sim o “investimento” no mercado financeiro. Aliás, o Brasil ocupa agora o 4º lugar entre os países que têm taxas de juros mais altas do mundo, tornando-se ainda mais atrativo para os especuladores mundiais.
O que causa realmente a inflação?
Excetuando os fenômenos climáticos como secas ou excesso de chuvas, que ao dificultarem a produção e a colheita de determinados alimentos provocam aumento dos preços, na moderna economia capitalista a principal causa da inflação é o domínio dos monopólios industriais, financeiros e comerciais sobre a economia.
De fato, um número muito restrito de empresas controla da produção até a venda dos produtos. Essa situação é muito evidente no caso do tomate, tratado como vilão da alta dos preços no início do ano. A Cargill, grande multinacional norte-americana, é dona das marcas de molho de tomate Pomarola e Tarantella, das de extrato de tomate Elefante e Extratomato e de polpa de tomate Pomodoro. A Unilever, anglo-holandesa, é dona da marca Arisco, e a Bunge é dona da Etti e da Salsaretti. Essas três empresas, além de produzirem, compram a maior parte da produção do tomate no país, e assim ficam em condições de determinar o preço pelo qual o produto deve ser vendido no mercado.
Não bastasse, segundo a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), apenas três grandes grupos estrangeiros são donos da maioria dos supermercados e controlam 50% dos alimentos comercializados no país. São eles: Pão de Açúcar (França-Brasil), Carrefour (França) e Walmart (EUA).
A telefonia celular está nas mãos de quatro empresas: Oi, Telefônica/Vivo, Tim e Claro (NET/Embratel), que cobram em nosso país uma das maiores tarifas do planeta.
A Coca Cola tem mais de 50% do mercado de refrigerantes no país e a AB Imbev, com várias marcas de cervejas (Brahma, Antartica, Bohemia, Skol,etc.), possui 70,1% do mercado de cervejas no Brasil.
Essas grandes empresas, além de dominarem setores inteiros da economia, unem e formam cartel para impor preços ao consumidor. O Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) investiga a formação de um cartel para fixar o preço da farinha de trigo em toda a região Nordeste. As empresas de moagem e distribuição de farinha de trigo, produto essencial para a fabricação de pães, massas, doces e biscoitos, articuladas pelo grupo M. Dias Branco, estão estabelecendo preços, condições de venda e divisão do mercado.
Outro exemplo: o governo reduziu os impostos da Cesta Básica, mas não se verificou nenhuma redução dos preços desses alimentos, embora, a presidenta tenha até apelado publicamente para os empresários diminuírem os preços.
Outra causa recente da inflação são os abusivos aumentos das passagens de ônibus decretados pelos governos para beneficiar algumas dezenas de famílias que são donas das empresas de ônibus no Brasil. Somente este ano, 11 capitais já aumentaram os preços das passagens no transporte coletivo e nada repassaram para os motoristas e cobradores ou para melhoria do transporte. Os ônibus andam cheios, são velhos e os motoristas recebem baixos salários.
Desse modo, a monopolização da economia, a ganância da classe capitalista e a submissão do governo a esta classe são as verdadeiras causas da inflação e não o tomate ou uma taxa de juros baixa.
Lula Falcão *
* Membro do comitê central do PCR e diretor de A Verdade

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