Livro de socióloga da USP conta a História do PCC
Com Ariel Castro, via Facebook
"PCC tem o controle e o exerce plenamente na mediação dos conflitos internos...".
Nada acontece nas prisões que não passe pela intermediação do PCC, diz socióloga
Autora de livro conta como facção que
nasceu em presídios se espalhou pelo País. ‘Não somos uma organização
criminosa. Somos uma organização de criminosos", diz integrante
Vasconcelo Quadros - iG São Paulo
Escrito depois de quatro anos e meio de pesquisa, o livro PCC -
Hegemonia nas Prisões e Monopólio da Violência (Editora Saraiva, 415
páginas, R$ 118,00), da socióloga Camila Caldeira Nunes Dias, da USP,
mostra que o governo de São Paulo vem sendo derrotado pelo crime
organizado. Consolidado depois de 20 anos de atuação, o PCC domina as
prisões como força paralela ao Estado, controla a economia subterrânea
alimentada pelo tráfico de drogas e está se expandindo para outras
regiões do País.
“Nada acontece nas prisões paulistas que não passe pela intermediação do
PCC”, sustenta Camila, que entrevistou 32 detentos e ouviu dezenas de
funcionários e dirigentes do sistema prisional paulista. Ela situa a
trajetória da organização em três fases distintas para se firmar como
contraponto à política prisional paulista e força econômica organizada a
partir das atividades criminosas.
A primeira fase, que ela chama de conquistas, vai de 1993 a 2001, quando
o PCC, voltado para os problemas carcerários, transformou as prisões
numa espécie de QG do crime, promovendo a onda de violência, com
rebeliões e mortes; a segunda é a da publicização, entre 2001 e 2006,
marcada por ações de impacto e que chamaram a atenção para a existência
da organização; e, por último, a consolidação, entre 2006 e 2013, que
representa o controle efetivo das prisões e sua expansão para fora dos
muros do sistema prisional, com penetração na economia informal da
cidade através de atividades criminosas.
Camila sustenta que o PCC exerce o controle sobre 90% da massa
carcerária paulista, de cerca de 200 mil detentos, e é gerido por uma
cúpula formada por dez presos, todos eles confinados na Penitenciária de
Presidente Wenceslau. Esse grupo funciona como uma espécie de conselho
deliberativo, repassando às unidades prisionais as diretrizes para a
solução de conflitos comuns no sistema, executadas por integrantes que
se esparramam pelas 150 unidades prisionais.
O poder de fogo da organização está na aliança e compromisso com
bandidos em liberdade que, segundo ela, controlam a distribuição de
drogas (cocaína, crack e maconha) e executam as ordens emitidas de
dentro das prisões. Geograficamente, a estrutura segue os moldes da
administração pública, com um representante, chamado na gíria criminal
de “Sintonia”, responsável por cada área da cidade. O código é definido
por “DDD”, seguido de um número correspondente à região de domínio de
cada grupo.
Mais: Polícias batem dois recordes de apreensões de cocaína do PCC em SP
Em fase de crescimento no País, a organização já tem ramificações em
Estados como Paraná, Sergipe, Bahia, Pernambuco, Ceará, Mato Grosso e
Mato Grosso do Sul, este último, de vital importância por se localizar
na fronteira com Paraguai e Bolívia, passagem do grosso da cocaína que
chega a capital paulista. Camila diz que parte dos lucros do tráfico é
lavada em atividades como transporte alternativo, postos de gasolina e
revenda de automóveis, uma clara proximidade com atividades formais que
pode evoluir para relacionamento com grupos políticos através do
financiamento de campanhas eleitorais.
“O perfil do PCC não tem paralelo. É uma organização sui generis: não é
um cartel, não se parece com a máfia e nem tem as características das
gangues americanas tradicionais. Perguntei a um deles o que é o PCC e
ele respondeu: ‘Não somos uma organização criminosa. Somos uma
organização de criminosos. Nossa finalidade é social, mas o meio é o
crime. É assim que a gente ajuda os mano’, disse ele. Isso quer dizer
que o crime e a economia do crime não são suficientes para explicar o
que é o PCC”, alerta a socióloga.
Entrevista com o Poder: "O PCC será derrotado", diz ministro da Justiça
Embora a constatação contrarie frontalmente o governo, que sequer
reconhece a sigla da quadrilha, o PCC tem um apelo ideológico e uma aura
de insurgência contra o estado. “O apelo dá ‘liga’. O trabalho social e
ideológico é responsável pela união da massa carcerária contra o
estado”, alerta. No plano da violência, o confronto armado se reflete no
enfrentamento com a Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar (Rota), o
grupamento de choque da PM, numa relação de ódio recíproco cujo
resultado são as baixas do ano passado em ambos os lados: 93 policiais
militares e dezenas de criminosos, a maioria sem vínculo com a linha de
frente de nenhum dos grupos, mas mortos nas recorrentes retaliações.
Segundo a socióloga, a decisão do governo em colocar a Rota para com
bater o PCC foi desastrosa. Os episódios do ano passado mostraram,
segundo ela, que a organização não mistura sua atuação dentro das
cadeias com ações de rua.
Dentro das prisões, por exemplo, há cinco anos reina uma paz negociada,
mantida pelo poder de força da organização e sob o olhar cômodo do
aparato estatal. Uma das últimas rebeliões que se tem notícia ocorreu em
Iaras, em 2008. E assim mesmo foi autorizada porque o comando do PCC,
diante a reivindicação pelo motim, “reconheceu” que a direção da cadeia
estava agindo com arbitrariedade contra alguns presos.
“A guerra do PCC contra a PM em 2012 foi fora do sistema prisional. Os
presídios vivem atualmente uma fase de acomodação, sem a violência de
outros períodos. É um equilíbrio precário, mas significa que o PCC tem o
controle e o exerce plenamente na mediação dos conflitos internos. É
como se o estado a ele tivesse delegado essa função”, afirma Camila.
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