Ameaçada de encerrar o ano com o pior desempenho na área desde a redemocratização, presidente cobra 100 novos decretos
Roldão Arruda
Após atravessar mais de dez meses sem
desapropriar um único imóvel rural para a reforma agrária, a presidente
Dilma Rousseff resolveu mudar. Na semana passada, disse a um grupo de
representantes de movimentos sociais que estava cobrando providências do
ministro do Desenvolvimento Agrário, Pepe Vargas. E que o ministro,
sentado ao seu lado, havia prometido encaminhar a ela um conjunto de 100
novos decretos de desapropriação de terras até o final de dezembro.
Ainda não se sabe como o ministro vai
obter resultados tão rapidamente, após tantos meses de inércia. Mas, se
forem mesmo assinados pela presidente, os decretos prometidos
acrescentarão cerca de 200 mil hectares às áreas de assentamentos rurais
no País, segundo estimativas do Instituto Nacional de Colonização e
Reforma Agrária (Incra).
A iniciativa pode ajudar a conter as
críticas que a presidente vem recebendo de movimentos de sem-terra,
indígenas, quilombolas e ambientalistas. Seus representantes afirmam que
Dilma ignora os movimentos sociais, ao mesmo tempo que se aproxima cada
vez mais da bancada dos ruralistas no Congresso. O coro foi engrossado
dias atrás com a oficialização da entrada de Marina Silva no jogo
eleitoral de 2014, ao lado do governador Eduardo Campos, do PSB. A
ex-senadora entrou em cena afirmando que o atual governo retrocedeu em
questões ambientais.
No Incra, funcionários descontentes com o
rumo da reforma agrária de Dilma afirmam que os novos decretos só serão
assinados com o abandono do discurso sobre a qualidade dos
assentamentos. Desde o início do ano, ao justificar a demora na criação
de assentamentos, representantes do governo diziam que a presidente
estava exigindo boas condições para o seu desenvolvimento. Em fevereiro,
o ministro Gilberto Carvalho, da Secretaria-Geral da Presidência, disse
até que Dilma não criaria novas favelas rurais.
Marco. Dez dias antes
da cobrança de Dilma ao ministro, o Estado havia divulgado que, com os
resultados obtidos até aqui, ela deve entrar para a história com um
registro pouco agradável para um político petista: a de presidente que menos desapropriou terras para a reforma desde o início da redemocratização, em 1985. Pode perder até para Fernando Collor de Mello.
A reportagem saiu no dia 7. Uma semana
depois, no dia 14, o ministério do Desenvolvimento Agrário baixou uma
portaria destinada a facilitar os processos de desapropriação. Passados
mais três dias, a presidente e o ministro anunciaram os decretos que vão
sair do forno em menos de dois meses.
"Eu quero informar a vocês que o
ministro Pepe Vargas e seu ministério assumiram comigo o compromisso de
ter 100 decretos de desapropriação até dezembro", disse Dilma. No
embalo, ela retomou a questão da qualidade dos assentamentos criados em
seu governo, diferenciando-os dos que foram realizados pelos seus
antecessores: "No nosso País já se assentou famílias em lugares onde
elas não tinham como se sustentar. Nós sabemos disso. O ministro
(Vargas) está fazendo um grande esforço para melhorar a qualidade do
decreto. Essa é uma questão que não só eu apoio, mas é uma questão que
eu exijo, porque nós não temos o direito de colocar pessoas famílias em
um lugar onde não têm de onde tirar renda."
Na avaliação de agrônomos do Incra
envolvidos com os processos de desapropriação de terras, porém, o
decreto assinado pelo ministro no dia 14 reduz drasticamente as
exigências dos processos para a criação de assentamentos.
"Ele flexibiliza outro decreto assinado
em fevereiro, que exigia estudos mais rigorosos e normas internas para a
criação de novos assentamentos", diz Ricardo Pereira, presidente do
Sindicato Nacional dos Peritos Federais Agrários. "O problema é que não
foram editadas normas para levar adiante os processos, o que acabou
emperrando a obtenção de terras e a reforma." Guerra está convencido de
que o governo deixou de lado a qualificação: "Fez isso para se livrar de
imagem de decreto zero". O presidente do Incra, Carlos Guedes, nega
qualquer retrocesso. "A portaria assinada não mudou nada nas exigências.
Apenas tratou de ritos", afirma.
Sobre o cumprimento da meta prometida a
Dilma, diz que não haverá problemas para alcançá-la. "Na verdade temos
quase 130 áreas em condições de serem desapropriadas. Falamos em 100
porque isso permite uma margem interessante para se chegar à meta. Em
todas elas já temos informações sobre o cumprimento social da área, o
custo do assentamento das famílias e a viabilização econômica do
projeto, com a geração de rendas famílias." A expectativa agora é de que
as primeiras desapropriações aconteçam daqui a quinze dias.
*Nassif
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