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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

sábado, janeiro 09, 2016

Chico, a seu jeito, contribuiu para o retorno do Brasil a um grau de civilidade (Eu acho que o PSDB é bandido.)

Eu acho que o PSDB é bandido': é de Chico a Frase do Ano.

 Por Paulo Nogueira




Aula de civilidade
Aula de civilidade
Chico é autor de muitas das mais lindas e pungentes frases em língua portuguesa.
Algumas:
A felicidade morava tão vizinha que de tolo até pensei que fosse minha.
Tem dias que a gente se sente como quem partiu ou morreu.
Morreu na contramão atrapalhando o tráfego.
Mas foi longe de sua atividade de compositor que ele produziu sua melhor frase em muitos anos.
Eu acho que o PSDB é bandido.
Foi de improviso, sem reflexão, sem um caderno e uma caneta nas mãos, num fim de noite no Leblon. E não foi no silêncio ideal para juntar palavras, mas diante do alarido agressivo e atrevido de jovens analfabetos políticos que se sentiram no direito de importuná-lo depois de um jantar.
Era preciso que alguém, enfim, juntasse essas duas palavras: PSDB bandido. Como foi Chico, isso imediatamente se espalhou pelas redes sociais. Mesmo a mídia tão amiga do PSDB foi obrigada a dar, contrariada, a sentença de Chico.
Ao contrário dos vociferantes analfabetos políticos, Chico não ergueu a voz. Manteve o sorriso amistoso nos lábios, em vez da carranca dos que o cercavam. Ele poderia estar dando boa noite a eles, paternalmente.
Mas disse que para ele o PSDB é bandido.
A importância da frase reside na contestação da ideia, insuflada tenazmente pela mídia, de que o PT é bandido e o PSDB mocinho.
Nunca ninguém, muito menos alguém com a estatura de Chico, dissera tão claramente que o PSDB é bandido.
Não que seja: muito mais que bandido, o PSDB é reacionário, atrasado, golpista e péssimo perdedor. Chico estava apenas mostrando a insignificância desprezível deste clichê – PT bandido – que tanto contribui para a existência hoje de dois Brasis, um dos quais, o representado pelos antipetistas que o assediaram, odeia o outro.
Chico deu, de bônus, outra frase soberba, a que associou aquele tipo de comportamento feroz à leitura da revista Veja.
Leia a Veja e você se transformará num idiota como aqueles que abordaram Chico. Repetirá mentiras, dirá asneiras, se encherá de preconceitos: será, enfim, um perfeito idiota brasileiro.
Do alto de sua grandiosa estupidez, você se achará em condições de dizer para provavelmente o maior compositor da história da música brasileira: “Você é um merda!”
Chico, a seu jeito, contribuiu para o retorno do Brasil a um grau de civilidade perdido com a proliferação de analfabetos políticos.
Se a discussão fosse futebolística, e não política, Chico teria ouvido o seguinte: “O Fluminense é um horror.” E teria respondido: “Pois para mim o Flamengo que é um horror. E daí?”
E daí que podemos ter nossos gostos e preferências sem agredir os outros. A tolerância pode triunfar sobre a intolerância, a civilização sobre a barbárie, os bons modos sobre a grosseria, o bom humor sobre a rispidez. (Em sua página no Facebook, Chico postou, com seu humor de carioca, a música Vai Trabalhar, Vagabundo!)
Numa palavra, o mundo de Chico – e não estou falando de ideologia — pode triunfar sobre o mundo dos desordeiros que perturbaram sua paz no Leblon. Por tudo isso, é de Chico a frase do ano.
Eu acho que o PSDB é bandido.
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