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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

domingo, julho 22, 2012

O ópio do povo

 

Vai começar tudo de novo. Embora o Brasil seja, pelo menos constitucionalmente, um Estado laico, não há um candidato a qualquer cargo público que não queira ficar de bem com católicos, evangélicos, budistas, espíritas, muçulmano, ou seja lá que religioso for. Parece que acreditar em algum deus é condição sine qua non para ser eleito. Do jeito que as coisas são no Brasil, se um candidato se declarar ateu é capaz de ser, no mínimo, apedrejado.
É incrível como as pessoas dão mais importância ao fato de o sujeito ir à missa, frequentar cultos, rezar direitinho nas horas certas, do que ter uma biografia impecável ou um programa de governo que contemple as necessidades mais prementes da comunidade à qual pretender servir.
Para muitas pessoas é mais importante saber se o fulano acredita em deus do que, por exemplo, quais são seus planos para a educação, para a saúde ou para o transporte urbano.
Coisa de louco.
Exemplo dessa verdadeira patologia social que é obrigar a pessoa a ser religiosa, é o candidato do PRB à prefeitura paulistana, o dublê de deputado e apresentador de TV Celso Russomano, que foi a uma missa para mostrar ao eleitorado que ele acredita no deus católico e não em outro qualquer. Depois do ofício, Russomano falou aos repórteres que o seguiram até a igreja. E a sua declaração revela não só o que ele pensa sobre o assunto, mas, provavelmente, também o que pensam os seus adversários:
- Vou em todas as igrejas e vou com muito prazer. E desde que estejam fazendo o bem, quero proteger essas igrejas como prefeito. Quero que todos os templos que estejam abertos em São Paulo sejam preservados, porque dão linha de conduta para a sociedade. As pessoas não matam e não roubam porque a lei proíbe, mas porque elas têm uma linha de conduta religiosa - afirmou.
Destaco essa última parte de sua afirmação: para Russomano, as pessoas não matam e não roubam porque a lei proíbe, mas "porque elas têm uma linha de conduta religiosa".
É incrível como esse tipo de raciocínio distorcido se espalha e acaba contaminando toda a sociedade. E isso é um perigo para a construção de uma nação plural, que abrigue sem distinção todo o tipo de pensamento, que não incentive o preconceito e o ódio pelas minorias.
O deputado/apresentador de TV Russomano, ao declarar que a virtude e a boa conduta são privilégio apenas dos religiosos insulta a história da humanidade, que tem provas inequívocas de assassinatos em massa e tantos outros crimes bárbaros cometidos em defesa de algum entre os milhões de deuses existentes. Além disso, ofende os milhões de seres humanos que vivem pacificamente respeitando e amando os semelhantes, produzindo obras de arte, desenvolvendo a ciência, ajudando a civilização a evoluir material e espiritualmente, sem que para tanto acreditem na existência dessas entidades invisíveis e incorpóreas que tantos sacrifícios exigem dos pobres mortais.
Certa vez, há muito tempo, um alemão barbudo fez uma afirmação que até hoje faz muita gente refletir: "A religião é o ópio do povo."
Cá entre nós, esse alemão entendia das coisas. Os nossos políticos aprenderiam muito se dessem uma espiadinha naquilo que ele escreveu. 
*GilsonSampaio

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