O julgamento de Manning, o Google e Assange
Mauro Santayana
Como
o julgamento — iniciado ontem — contra o soldado Bradley Manning, é
por traição à pátria, o ex-presidente Bush é quem deveria estar sentado
no banco dos réus. Provavelmente não tenha havido, na história dos
Estados Unidos, crime maior contra a segurança nacional do que a
decisão de intensificar a guerra contra o Iraque, como resposta ao
atentado que destruiu as Torres Gêmeas. O ataque ao país começou bem
antes, em 1990, por Bush pai, e continuou durante Clinton, sem
interrupção, até que Bush filho lhe deu as dimensões infernais, com a
cumplicidade europeia.
Excluindo-se a
possibilidade, por mais fantástica pareça, de que a destruição do World
Trade Center tenha sido operação interna, de acordo com a denúncia de
várias autoridades técnicas e de fortes evidências políticas, ficou
absolutamente provado que Saddam Hussein nada tinha a ver com o assunto
nem com armas de destruição em massa.
Bush, por
sua decisão solitária, desde que a ele coube a palavra final, é o
responsável direto pela morte de todos os que pereceram em decorrência
dessa aventura criminosa — soldados e civis, norte-americanos e
estrangeiros. Entre os mortos, grande número de velhos e de crianças,
totalmente indefesos.
Manning revelou ao mundo, e a próprios compatriotas, a brutalidade da guerra
O
que fez Bradley, um quase adolescente assustado com a violência das
forças a que servia, foi revelar ao mundo, e aos seus próprios
compatriotas, a brutalidade da guerra. Às vítimas de Bush — e de sua
quadrilha reunida na Casa Branca — devem somar-se os milhares de
suicidas em decorrência do conflito. E a multiplicação dos casos de
abuso sexual nas fileiras.
Os exércitos
norte-americanos do passado, com todos os seus defeitos, eram recrutados
na sociedade inteira, e os combates uniam, na solidariedade do perigo,
os cidadãos fardados, fossem ricos ou pobres. E ainda que não com tanta
freqüência, brancos e negros costumavam criar laços de amizade sob o
perigo. Depois do Vietnã, só o alto oficialato é de carreira; a linha
de fogo é constituída de “voluntários pagos”, ou seja, de mercenários.
O
Pentágono esforça-se para criar um exército de robôs, dos quais os
drones são os precursores programados para matar. Trata-se da extensão
tecnológica dos operadores frios e protegidos, que apertam botões à
distância e encaminham suas bombas e mísseis, sem qualquer emoção.
Sexta-feira passada, o New York Times publicou artigo de Julian Assange sobre o livro The new digital age,
de Eric Schmidt e Jared Cohen. Schmidt é o diretor-executivo do
Google, e Cohen, ex-assessor de Condoleeza Rice e Hillary Clinton, é
diretor de sua Divisão de Ideias.
Ambos,
segundo Assange, criaram um novo idioma para o poder global dos Estados
Unidos no século 21. De forma clara, anunciam que a sua empresa terá uma
posição chave na consolidação do imperialismo tecnocrático
norte-americano no mundo. “O texto é conciso, o estilo, coloquial — e o
conteúdo, banal”, resume Assange.
O que preocupa
Assange é outra coisa: a íntima associação entre o Google — nascido da
ideia visionária e libertária de jovens do Vale do Silício — e o
Departamento de Estado. Como registra o criador do WikiLeaks, os maiores
elogios ao livro partiram dos falcões imperialistas, como Henry
Kissinger, Tony Blair e Michael Hayden, ex-diretor da CIA.
Assange
aponta que o livro dos dirigentes do Google repete os tabus e
interesses do Departamento de Estado. Seus autores, conforme o criador
do WikiLeaks, desdenham o avanço democrático na América Latina — obtido
com o fim das oligarquias e a queda de alguns dirigentes submissos aos
Estados Unidos — e se referem a seus líderes como “envelhecidos”.
É
curioso que dirigentes da organização que pretende administrar toda a
informação sobre o mundo sejam tão cegos diante de uma realidade em
mutação.
*Gilsonsampaio
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