A aliança da ultraesquerda com a esquerda ressentida, com a esquerda oportunista e com a pior direita contra Dilma e os dez anos que melhoraram o Brasil
Todos contra a Dilma
por Emir Sader
O fenômeno tem se repetido – na Bolívia, na Argentina, no Equador, no
Brasil. Setores que saem dos governos – ou que sempre tinham se oposto –
supostamente pela esquerda, percorrem uma trajetória que os leva a se
situarem como oposições de direita.
Evo Morales, Rafael Correa, os Kirchner, Lula e Dilma – teriam “traído”.
E seriam piores que outros contendores, porque seguiriam fingindo que
defendem as mesmas posições que os projetaram como grandes líderes
nacionais. Por isso tem que ser frontalmente combatidos, derrotados,
destruídos, sem o que os processos políticos seguiriam retrocedendo e
não poderia avançar.
Foi assim que setores que eram parte integrante do governo de Evo
Morales declararam que ele é o inimigo fundamental a combater, porque
teria “traído” o movimento indígena. Daí a proposta de uma frente
nacional contra ele, que incorporaria a todos os setores opositores, não
importa quão de direita sejam.
A mesma coisa com Rafael Correa. Teria “traído” a defesa da natureza e
se passado a um modelo extrativista, tornando-se o inimigo fundamental a
combater. Daí que setores que se reivindicam porta-vozes dos interesses
dos movimentos indignas e ecologistas, se aliam expressamente à
direita, para combater a Correa.
Na Argentina, os Kirchner teriam “traído” o peronismo, daí setores que
faziam uma critica de esquerda ao governo – expressados, por exemplo, no
peronista Pino Solanas – se aliam a setores de direita – como Elisa
Carrió, entre outros -, para combater ao governo de Cristina Kirchner.
Poderíamos seguir com a Venezuela, com o Uruguai, porque o fenômeno se
repete. Para poder operar essa transição de uma oposição de esquerda a
uma de direita, é preciso demonizar os lideres desses processos, que
seriam, piores do que a direita, daí a liberação para alianças com esses
setores contra os governos.
No Brasil o fenômeno se deu, inicialmente, com o PSol e Heloisa Helena,
que abertamente fizeram aliança com toda a oposição contra o governo
Lula. Com a Globo, com os tucanos, com todos os candidatos opositores,
na ação desenfreada e desesperada para tentar impedir a reeleição do
Lula.
Abandonaram as críticas de esquerda – sobre o modelo econômico e outros
aspectos do governo – para se somarem à ofensiva do “mensalão”, sem
diferenciar-se do tom da campanha da direita.
O fenômeno teve continuidade com a Marina, que repetiu de forma mecânica
a trajetória da Heloisa Helena na volúpia contra o governo Lula e a
Dilma, quatro anos mais tarde. O destempero faz parte do processo de
diabolização, que se caracteriza sempre, também, pela ausência de
qualquer tipo de critica à direita – à mídia monopolista, ao sistema
bancário, aos tucanos, aos EUA.
A relação desses setores com a direita tradicional é explicita: a essa
ausência de criticas à direita corresponde uma promoção explícita dos
candidatos que se dispõem a esse papel: Heloisa Helena, Marina, agora
Eduardo Campos.
Todos contra o Evo, todos contra o Rafael Correa, todos contra a
Cristina, e assim por diante. Aqui, agora, todos contra a Dilma.
Não há nenhuma duvida que o campo opositor está composto pelas
candidaturas do Aecio, do Eduardo Campos, ao que se soma agora a Marina.
As reuniões de Eduardo Campos com Aecio, a entrada do Bornhausen, do
Heraclito Fortes, entre outros, para o PSB e o discurso “anti-chavista”
da Marina, completam o quadro. Vale tudo para tentar impedir que o PT
siga apropriando-se do Estado brasileiro para seus fins particulares,
impedindo que o Brasil se desenvolva livremente.
Nenhuma palavra sobre o tipo de modelo econômico e social que
desenvolveria caso ganhassem. Nenhuma palavra sobre o tipo de inserção
internacional do Brasil. Nada sobre o papel do Estado. Silêncio sobre
tudo o que é essencial, porque do que se trata é de tentar derrotar a
Dilma.
Na verdade hoje a direita – seus segmentos empresariais, midiáticos,
partidários – já se contentaria em conseguir que a Dilma não triunfasse
no primeiro turno. O que vier depois disso, será lucro.
Em todos os países, esses setores tem sido derrotados fragorosamente.
Suas operações politicas não tem dado resultados, por falta de
plataforma, de lideranças e de apoio popular.
Aqui também tem acontecido isso. O PSol foi ferido de morte por suas
atitudes em 2006. Marina abandona a plataforma ecológica para assumir o
anti-comunismo de hoje (o anti-chavismo) e se somar à politica mais
tradicional, sem sequer ter conseguido as assinaturas para registrar seu
partido.
Termina no Todos contra a Dilma, cada um do seu jeito, mas com o
objetivo comum. Esse cenário politico tem Evo, Correa, Cristina, como
teve a Lula e agora tem a Dilma, como referência central. Os outros são
os outros, sem plataforma, sem lideranças e sem apoio popular.
Construindo Marina
A novela midiática em torno da tal Rede ajudou a
popularizar a candidatura de Marina Silva com uma eficácia de fazer inveja a muitos
publicitários espertos.
Talvez não houvesse mesmo outro interesse por trás
da mal encenada esquizofrenia dos analistas, que ora condenavam o oportunismo
dos novos partidos, ora lamentavam o rigor legal imposto à honrosa exceção “sustentável”.
A própria tentativa de criação da legenda soa demasiado amadora e inocente para
os personagens envolvidos.
A construção de Marina sobressaiu nos argumentos
usados para incensá-la. Seu grupo obscuro, de plataforma desconhecida e métodos
esquisitos, se transformou na esperança de renovação política nacional. Menos
de 500 mil assinaturas, num total de 140 milhões de eleitores, ganharam dimensões
messiânicas. Um distante segundo lugar (estimulado) nas pesquisas de opinião passou
a representar uma força capaz de impedir a vitória petista no primeiro turno.
A astúcia da manobra é inegável. As maiores
fragilidades eleitorais de Marina sempre foram o baixo índice de reconhecimento
popular e o escasso tempo de propaganda a seu dispor. Fatais para qualquer pré-candidato
sem grandes recursos financeiros, essas limitações sumiram durante a contínua
exposição da ex-senadora, nos horários e espaços nobres dos grandes veículos de
comunicação do país, em plena fase de alianças partidárias visando 2014.
Há poucas semanas, Marina Silva era uma figura política tristonha, ameaçada pela irrelevância, atolada num confuso esboço de
partido que não conseguia sequer legalizar-se. Hoje ela ocupa o centro das
atenções, esbanja triunfalismo e encabeça um projeto de respeitável estrutura
administrativa. Missão cumprida.
*guilhermescalzilli
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