Por que os Perrellas não foram presos? Nosso professor Nabuco responde
O surpreendente caso do helicóptero pertencente ao deputado
estadual de Minas Gustavo Perrella, apreendido com 445 quilos de
cocaína, não pode levar ao prejulgamento do deputado e nem à omissão de
investigações.
Quando houve a apreensão, as perguntas se sucederam. Muitos
queriam saber se a polícia deveria ter prendido o deputado e se ele
seria responsável criminalmente pelo transporte da droga.
A verdade é que, penalmente, ninguém é responsável por ato
de seu subordinado se não colaborou conscientemente para isso. Em termos
jurídicos, ninguém será punido se não tiver colaborado dolosamente com o
ato praticado por seu funcionário. A rigor, a questão sobre o dolo é
simples. Basta que o chefe saiba que na sua empresa ou com seu
equipamento seja praticado tráfico, para que esse chefe seja responsável
conjuntamente por crime de tráfico (tecnicamente, é o concurso de
pessoas).
A complexidade está no âmbito das provas. É preciso a
obtenção de provas de que o chefe sabe, para que ele seja
responsabilizado penalmente. Isso se aplica tanto ao caso de uma
pizzaria em que o entregador é flagrado com cocaína na moto, como no
caso do helicóptero do deputado mineiro.
Parece claro, portanto, que o deputado deva ser
minuciosamente investigado, para se chegar à conclusão sobre sua
eventual responsabilidade. Em uma república, nenhum homem pode ser
intocável. Por outro lado, numa democracia, não se pode presumir a culpa
de quem quer que seja.
Não há dúvida que numa situação similar e de menor
proporção, vivenciada por um cidadão pobre, o tratamento seria
diferente. Em tais casos, o comportamento tende ao abuso, ou seja, ao
mais profundo desprezo pelas garantias individuais. Mas também não há
dúvida de que democracia se faz inibindo o abuso e não defendendo sua
extensão a todos.
Uma outra questão que surge desse caso é a aparente
sofisticação do tráfico, em que a cocaína é transportada por um
helicóptero caríssimo. A crônica policial no Brasil só retrata
traficantes “pé-de-chinelo”. Os chefões do tráfico, quase sempre, são
moradores de favela que constroem casas no alto do morro de um luxo
precário, com predileção por banheiras de hidromassagem, muito diferente
dos traficantes do cinema americano.
Mas, num negócio rentável como o tráfico de drogas,
provavelmente há por trás pessoas menos toscas que um Fernandinho
Beira-Mar. Eles existem ou são fruto de nosso imaginário? Se existem,
por que não os conhecemos?
O fato é que uma das características das organizações
criminosas é a existência de tentáculos no poder público com a
corrupção. Dessa forma, é provável que existam empresários do tráfico
que se mantenham na impunidade através da corrupção.
Um caso como esse vem aguçar nossa imaginação. Que se investigue,
então, minuciosamente a eventual existência de responsabilidade do dono
do helicóptero.
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