Páginas

Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

terça-feira, janeiro 27, 2015

Vitória da Coalizão de Esquerda na Grécia abre novas possibilidades para a luta social na Europa

Alex1Os primeiros dados de apuração de votos dão conta de uma contundente vitória da Coalizão de Esquerda (Syriza, em grego) nas eleições para o parlamento grego. Essa expressiva votação deve eleger o líder da coalizão, Alex Tsipras, como novo primeiro-ministro do país.
A Grécia teve sua economia praticamente destruída não apenas pelos efeitos da crise econômica que abala a Europa desde 2008, mas também pelos supostos remédios para a crise receitados pelo Banco Central Europeu – BCE, Fundo Monetário Internacional – FMI e a Comissão Europeia. Esse trio de instituições, conhecido na Europa pela expressão russa troika, impôs uma verdadeira humilhação ao povo grego, obrigando cortes em todas a áreas sociais, demitindo funcionários públicos, reduzindo salários e aposentadorias.
Os governos do Partido Socialista Pan-Helênico (PASOK) e da Direita (Nova Democracia-ND) aplicaram como mansos carneirinhos os ditames datroika, caindo em desgraça na opinião pública. Enquanto isso, os banqueiros e monopólios, os ricos da Grécia, mantiveram seus privilégios fazendo crescer a desigualdade social no país.
Com mais de 90% das urnas apuradas, a Coalizão de Esquerda alcança 36% dos votos e 149 assentos no parlamento, faltando 2 deputados apenas para formar a maioria absoluta. Em segundo lugar fica o partido do governo, ND, com 27% dos votos e 77 parlamentares.
Outra boa notícia é a diminuição, ainda que pequena, dos votos do partido nazifascista Aurora Dourada. Depois de estar envolvido em vários atos de violência contra lutadores sociais e imigrantes, os fascistas obtiveram 6,3% dos votos, um deputado a menos que nas últimas eleições de 2012, ou seja, 17 deputados. Em quarto está outra agremiação de direita chamada “O Rio”, com o mesmo número de deputados do Aurora Dourada.
Ocupando o quinto lugar está o tradicional partido revisionista, KKE (Partido Comunista da Grécia), que cresceu 1% em relação às últimas eleições e pode jogar papel importante se entrar em acordo com o Syriza para a formação do novo governo, ocupando 15 assentos no parlamento.
O PASOK, que por vários anos governou a Grécia e se constituía como principal grupo de centro-esquerda desde o fim da ditadura militar, reduziu sua votação em quase 70% caindo para apenas 13 deputados no parlamento. É uma clara expressão do repúdio popular às traições cometidas por esse partido.
Causas e consequências da vitória
A vitória da Coalizão de Esquerda nestas eleições é o resultado direto de toda a luta travada pela classe trabalhadora e pelo povo grego nos últimos 5 anos. Nenhuma das chamadas medidas de austeridade que retiraram direitos e atacaram a dignidade dos gregos passou sem uma heroica resistência realizada pelo povo nas ruas. Foram dezenas de greves gerais; marchas multitudinárias; ocupações por casa para morar; manifestações de estudantes que desde 2008 honram a memória de Alexis Grigoropoulos.
Toda essa luta fez transformar a consciência do povo grego e teve consequências, também, na luta geral travada em outros países da Europa.
Uma vez no governo, o Syriza tem o desafio de fazer valer a vontade popular de romper com a União Europeia e seus organismos econômicos. Os capitalistas vão usar seus instrumentos de pressão, midiáticos e de terrorismo econômico para fazer a esquerda capitular. É preciso coragem e forte pressão popular para que o Syriza aplique de fato as medidas que enfrentem os capitalistas, começando pela suspensão do pagamento ao Banco Europeu e pela revogação das chamadas medidas de austeridade.
É preciso, além de tudo, enfrentar o fascismo que conta na Grécia com um partido organizado, militarizado, useiro e vezeiro em praticar a violência contra seus adversários. O perigo do fascismo não pode jamais ser subestimado e deve ser combatido com energia pelo novo governo.
Para o restante da Europa, e talvez do mundo, trata-se de uma vitória que anima a luta popular. Prova que é viável construir uma alternativa à esquerda e que não há nenhuma fatalidade que obrigue os partidos a seguirem o que mandam os bancos para vencer eleições. O resultado das eleições na Grécia repercutirá nas próximas eleições da Espanha, Portugal e outros países.
De fato, um novo capítulo se inicia na luta do povo grego pela sua libertação. Mais uma vez a luta popular e a organização da classe trabalhadora serão o caminho seguro para vencer.
Jorge Batista, São Paulo
*Averdade

Nenhum comentário:

Postar um comentário