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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

sexta-feira, janeiro 23, 2015

O economista burguês cujo cérebro limitado não sabe distinguir entre a forma aparente e o que nela está oculta...”

A essência do trabalho assalariado
“... O processo de produção se inicia com a compra da força de trabalho por determinado tempo e esse começo se renova sempre que se extingue o prazo estipulado, tendo decorrido assim determinado período de produção, semana, mês, etc. Mas, o trabalhador só é pago depois de ter empregado sua força de trabalho e depois de se terem materializado nas mercadorias o valor dessa força e a mais valia. Assim, produziu ele a mais valia, provisoriamente considerada o fundo de consumo do capitalista, além de produzir o fundo para seu próprio pagamento, o capital variável, antes de este chegar às suas mãos sob a forma de salário. E só terá emprego enquanto reproduzir continuamente esse capital variável... O que vai para o trabalhador sob a forma de salário é uma parte do produto por ele constantemente reproduzido. Na verdade, o capitalista paga-lhe em dinheiro, mas esse dinheiro não é mais do que a forma a que se converte o produto do trabalho, ou mais precisamente, uma parte dele. Enquanto o trabalhador transforma meios de produção em produto, seu produto anterior no mercado se transforma em dinheiro. É com o trabalho da semana anterior ou do semestre precedente que se paga o trabalho de hoje ou do semestre em curso. A ilusão gerada pela forma dinheiro desaparece logo que se consideram a classe capitalista e a classe trabalhadora e não o capitalista e o trabalhador isoladamente. A classe capitalista dá constantemente à classe trabalhadora, sob a forma de dinheiro, letras que a habilitam a receber parte do produto que produziu e do qual aquela se apoderou. Mas, o trabalhador devolve continuamente essas letras à classe capitalista, para receber a parte do produto dele mesmo, que lhe é atribuída. A forma mercadoria do produto e a forma dinheiro da mercadoria dissimulam a operação.
O capital variável, portanto, é uma forma histórica particular em que aparece o fundo dos meios de subsistência ou o fundo do trabalho, do qual precisa o trabalhador para manter-se e reproduzir-se e que ele mesmo tem de produzir e reproduzir em todos os sistemas de produção social. Esse fundo flui continuamente para ele sob a forma de meios de pagamento de seu trabalho, pois seu próprio produto se afasta sempre dele sob a forma de capital. Mas, a forma sob que aparece o fundo em nada altera a circunstância de o capitalista antecipar ao trabalhador o que já é na realidade trabalho materializado por este. Vejamos o caso de um camponês no sistema feudal. Trabalha com seus próprios instrumentos de produção, em sua própria terra, digamos, 3 dias por semana. Os outros 3 dias trabalha como servo, na terra senhorial. Reproduz constantemente seu próprio fundo de trabalho, e este nunca assume, para ele, a forma de meio de pagamento desembolsado por outra pessoa, em troca de seu trabalho. Em compensação, seu trabalho compulsório e gratuito nunca toma a forma de trabalho voluntário e pago. Se o senhor se apoderasse do campo, dos animais, sementes, enfim dos meios de produção do servo, daí em diante este teria de vender-lhe a própria força de trabalho. Não se alterando as demais condições, teria de continuar trabalhando 6 dias na semana, 3 dias para si mesmo e 3 dias para o senhor transformado em capitalista. Continuaria utilizando os meios de produção e transferindo seu valor ao produto. Uma parte determinada do produto continuaria sendo utilizada na reprodução. Ao tomar o trabalho de servo a forma de trabalho assalariado, o fundo de trabalho que continua sendo produzido e reproduzido pelo camponês toma a forma de um capital desembolsado em seu favor pelo patrão. O economista burguês cujo cérebro limitado não sabe distinguir entre a forma aparente e o que nela está oculta...”
(MARX, Karl. O Capital: crítica da economia política – processo de produção do capital – livro 1, vol. 2. 5ª ed. Trad. Reginaldo Sant’Anna. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1980, p. 660-662 )

  • A essência do trabalho assalariado.
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