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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

sábado, junho 09, 2012

Os novos gladiadores


 

Zoroastro Sant’Anna - Jornalista e cineasta
Nosso Homem nº 21
Ilustrações e legendas - redecastorphoto
Chegaram os gladiadores eletrônicos do UFC. Todos os sistemas totalitários da história do mundo mesclaram pão e diversão numa estratégia perversa de dominação, o conhecido método panis et circenscis, pão e circo, ou seja, não deixar faltar pão nem diversão. Ainda está na memória de muitos brasileiros o general Médici fazendo embaixadinhas e o advento da televisão em cores para a transmissão da Copa do Mundo de 1970, TV colorida na sala e sessão de pau-de-arara nos porões.
Bandeira dos desgovernos MILICANALHAS
Durante mais de 700 anos, de 300 A.C. a 400 D.C., os imperadores romanos utilizaram os gladiadores como forma de “diversão” pública. Gladiadores porque usavam uma espada curta, chamada gladius e eram guerreiros capturados e treinados, ou mesmo cidadãos falidos, que recorriam as armas do circo romano para conseguir algum dinheiro ou a morte. Muitos mercadores enriqueceram alugando e vendendo gladiadores, os primeiros empresários do mundo do entretenimento.
Gladiadores no Coliseu romano
Tudo começou por volta de 288 A.C. quando o império romano enfrentou a primeira Guerra Púnica, contra a poderosa Cartago, hoje república árabe da Tunísia, no norte da África, perto da ilha da Sicília. Um exército de mercenários havia tomado a cidade italiana de Messina, matando todos os homens e tomando as mulheres como suas, controlando o estreito que ligava a Itália à ilha, causando sérios prejuízos comerciais ao império de Roma. Cartago enviou tropas para fortalecer os mercenários enquanto os romanos enviaram novos exércitos para retomar a região.
Esta guerra custou muito ao império criando grande descontentamento entre os romanos e o imperador Diocleciano decretou então as temporadas de “jogos” que duravam até oito meses, com uma agenda de combates na grande arena de Roma, depois conhecida como Coliseu. Sangue humano para ensopar o pouco de pão, eterna e infalível  receita para acalmar as multidões sedentas de liberdade e diversão. A guerra durou mais de 100 anos e terminou com a destruição de Cartago e o trágico espetáculo dos gladiadores ficou mais 600 anos em cartaz.
Gladiador romano
Desde a antiguidade a humanidade cria brigas, muitas sangrentas e mortais, sob a capa do esporte, briga de cães, peixes, galos, pássaros, cobras, insetos e até mesmo a briga de aranhas. Os homens brigam desde os tempos imemoriais, sejam por mulheres, terras, dinheiro, honra, vingança ou poder. Há algo de atávico e imperioso no ato de brigar, característica aguçada pelo espírito de competição estimulado pelo capitalismo enquanto forma de produção e organização social, onde a pior humilhação que se pode impor a um ser um humano é a de qualificá-lo como um loser, um perdedor, quando na verdade perder é apenas uma probabilidade lógica ao se disputar.
Tenta-se desde os tempos longínquos transferir o sentimento de disputa esportiva e saudável das Olimpíadas para as raias menores da violência física, como o box clássico e agora a temível MMA-Mix Martial Arts, esse sarapatel de pancadarias explícitas do UFC, com sanguinolência ao vivo e em cores pelos maiores canais de televisão do mundo ocidental e agora do Brasil, onde corpulentos brutamontes espancam seus adversários com técnicas misturadas até que um deles desabe humilhado e sangrando ou desista por dor insuportável. A técnica e a força de machucar pessoas, cobertas de aplausos, dor e dinheiro.
A banalização da violência faz com que se encare a questão de uma mulher enciumada, detonar a cabeça do marido com uma pistola P 380, esquartejar seu corpo, ensacar e distribuir num terreno baldio como apenas mais um crime do cotidiano urbano de uma cidade atormentada. O fato do rico marido assassinado ter em casa mais de 40 armas de fogo modernas, inclusive fuzis, e mais de 10 mil munições não é sequer discutido, afinal era tudo legal, ricamente registrado.
Novo gladiador
Uma emissora brasileira de televisão brasileira está investindo milhões no MMA, esse novo “esporte” que, certamente, será um sucesso de audiência. Da mesma forma que são sucessos de audiência imbecilidades como o BBB, o programa do Ratinho, Pânico na TV e outras aberrações. Não se trata aqui de ser contra ou a favor do UFC-MMA, o fato está aí e o que cabe é discutir o porque da sua existência e que forças e interesses estão por trás dessa iniciativa.
Não é apenas mais um esporte inocente. É a violência física entrando por nossa casa a dentro. É  fácil argumentar que se não quer ver, mude de canal, mas as coisas não são tão simples assim. Existe todo um marketing, toda uma motivação introdutória, uma cooptação quase indefensável praticada pela mass mediadirigida aos jovens e aos menos avisados. Existe uma apologia explícita da técnica exercida com força bruta para domínio e submissão do próximo. Além do mais, os maiores campeões mundiais são brasileiros, verdadeiros ícones de uma cultura do vencer, nem que seja na porrada.
Arena de UFC-MMA, o novo Coliseu romano
As lutas consideradas esportivas com o box, judô, taikwondô, jiujitsu, mai-tai e tantas outras não foram suficientes para satisfazer aquele gostinho de sangue na boca que toda sociedade saboreia com maior ou menor prazer. Foi preciso retirar a elegância de um Muhamed Ali, Sugar Ray Robson ou Rocky Marciano, diminuir o tamanho de suas luvas de box, para proteger menos e machucar mais. Foi preciso juntar todas as formas de combate físico conhecidos numa briga só para tornar o espetáculo mais atraente e sangrento. Não há um único round do UFC em que o sangue não jorre, não seja aparente, provocante e rico. E, atrás de tudo, o dinheiro, muito dinheiro.
Em cada golpe, soco ou ponta pé desferido no outro, cada cidadão esmurra e se vinga do guarda de trânsito achacador, do flanelinha indevido, do político corrupto, da sogra incômoda, da mulher desamada, do vizinho mau caráter e do Estado injusto e incompetente. Cada gota de sangue derramada no ringue é uma lágrima  derramada neste triste viver no mundo inóspito do século XXI. Os novos gladiadores eletrônicos chegaram para o delírio da plebe. Enfim.
· Travesti – O ator Antônio Fagundes está fisicamente travestido do falecido político Antônio Carlos Magalhães, na novela “Gabriela” que estréia na próxima semana. ACM foi um dos últimos coronéis da política brasileira, Vice-Rei da Bahia, responsável por vários escândalos como o dos grampos no Congresso e o da distribuição de concessões de rádios e televisões para políticos corruptos enquanto Ministro das  Comunicações do governo Sarney.
· Safado – Sucesso absoluto a peça de Paulo Lobo “O Anjo Safado”, com a participação do ator Antônio Leite e direção de Jorge Lins, exibida no Atheneo.
· Era outro – Já virou piada a CMPI do Cachoeira. Todo mundo mente, até quem pergunta. São tantos os fios a serem puxados nesse novelo, que não há tantos dedos possíveis e muito menos onde guardar tanta lã. Agora, o vereador que intermediou a casa que o governador Marcondes Perillo vendeu por R$ 2,4 milhões ao criminoso Cachoeira, diz que não foi ele quem pagou em dinheiro vivo, que o negócio dele foi de R$ 1,6 e pago em dinheiro. Quem comprou não foi um e nem quem pagou foi o outro. Ninguém entende mais nada.
· Mengão – Roubaram o Flamengo e não foi em campo, foi na tesouraria mesmo, aqui no Leblon. Dois homens armados levaram quase R$ 15 mil dos cofres do clube. O comentário é que o roubo teve a participação de funcionários pois um dos ladrões chamou o tesoureiro pelo nome. Dizem que não tem a nada a ver com Ronaldinho Gaúcho a quem o time deve mais de R$ 40 milhões.

· Igualzinho – O atual presidente do Uruguai, Jose Pepe Mujica, tem 77 anos, é ex-guerrilheiro tupamaro, vive em casa própria, uma chácara a 20 km de Montevidéu, doa 90% do salário e faz um bom governo, segundo a imprensa. Mujica saiu sozinho outro dia para comprar uma tampa de privada, quando foi reconhecido pelos jogadores do time local, Huracán, que o convidaram para um churrasco e lá foi ele com a tampa da privada debaixo do braço.
*GilsonSampaio

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