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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

terça-feira, abril 30, 2013

A direita latino-americana



Por Emir Sader 
A direita latino-americana atual é o agregado de vários segmentos. 
Um primeiro, é a direita tradicional, que contém os jornais e revistas ligados à oligarquia, que estiveram ligados ao velho modelo primário exportador, apoiaram as ditaduras militares. Se valeram da reinterpretação do liberalismo por aqui, favoráveis ao livre comércio e contra qualquer protecionismo. São saudosistas, escrevem editorias rançosos, expressam ódio de classe aberto aos sindicatos, aos partidos de esquerda, a Cuba, Venezuela, Bolívia. 
Exaltam a mídia conservadora como bastiões da liberdade, ameaçados pelos “populismos” reinantes. 
Hoje manifestam melancolia e pessimismo sobre o estado atual do mundo e, em particular, da América Latina e de seus países em particular. 
Adoram os EUA de quem exigem sempre a dureza da época da “guerra fria”. 
Sua cantilena preferida é a do risco que a liberdade e a democracia correm. 
O bloco neoliberal nos vários países no continente foi conduzido por outras forças, que incorporaram esse ramos oligárquico da direita. 
Foram forças originárias da social democracia e do nacionalismoAção Democrática na Venezuela, PRI no México, o peronismo dos anos 1990 na Argentina, o PSDB no Brasil, entre outros – os agentes do modelo neoliberal no continente. 
Seguindo pelo caminho dos socialistas franceses e espanhóis, e dos trabalhistas ingleses, essas forças organizaram um novo bloco de direita ou simplesmente avançaram sós na condução de governos neoliberais. 
Essas duas vertentes contaram com o monopólio oligárquico dos meios de comunicação, numa fase em que estes ocuparam o lugar central na construção dos consensos políticos e ideológicos. 
Diante dos governos pós-neoliberais, a direita se viu fora do governo, com muitas dificuldades para retornar. 
Esses governos ocuparam um amplo espaço do campo politico, não deixando espaço para outro projeto com potencial hegemônico. 
O que fazer diante do inegável sucesso das politicas sociais desses governos? 
Manter a concepção da direita de que os recursos utilizados nessas politicas são gastos, via de regra considerados “excessivos”, responsáveis pelos desequilíbrios das contas publicas, além de mal administrados – para o que se centra na denuncia de supostas irregularidades e/ou ineficiência na sua aplicação
Diante das alianças que priorizam os processos de integração regional, a direita centra suas criticas na situação política e econômica dos países latino-americanos, tentando provar que a aliança com eles está permanentemente ameaçada. 
Não podem manter – pelo menos desde o começo da crise econômica no centro do sistema – sua preferência pela aliança subordinada com os EUA, a Europa e o Japão. 
Tentam então desqualificar projetos como o Mercosul, Unasul, o Banco do Sul, a Celac, o Conselho Sul-americano de Defesa, sem grande efetividade. 
Da mesma forma a direita ficou neutralizada na sua ojeriza ao Estado, especialmente desde o começo da atual crise econômica internacional, quando todos pediram ações estatais para minorar seus efeitos. 
Desviam então suas críticas ao Estado, concentrando em supostos casos de corrupção, que teriam o Estado como cenário, assim como supostas ineficiências dos programas governamentais, que seriam melhor administrados se estivessem centrados em empresas privadas e no mercado. 
Com essas debilidades, a direita não consegue se recompor das derrotas que tiveram em países como a Venezuela, o Brasil, a Argentina, o Uruguai, a Bolívia e o Equador. 
Estes governos se elegeram e se reelegeram, encontrando-se em condições favoráveis para cumprir sua primeira década e avançar para a segunda. 
Incapacitada de obter maiorias eleitorais, a direita centra sua ação nos grandes meios de comunicação, frente à debilidade confessa dos seus partidos, e busca articular novas modalidades golpistas, contando com a velha mídia e com o Judiciário – quando ainda o controla. 
Os governos progressistas latino-americanos têm tudo para fortalecer-se diante de uma direita como essa. 
Basta que zelem, antes de tudo, pela eficácia na aplicação das suas políticas sociais, pelo seu fortalecimento, expansão e criatividade. 
Essa é sua base fundamental de apoio e legitimidade, que lhes dá as maiorias e a legitimidade que lhes permitem seguir triunfando. 
E, ao mesmo tempo, avançar nas políticas de integração regional – em particular o novo Mercosul e o Banco do Sul –, que é o que permite a esses países resistir em melhores condições aos influxos recessivos do centro do capitalismo e superar obstáculos internos para construir um modelo alternativo de política econômica. 
Em terceiro lugar, fazer as reformas do Estado e do sistema político, para democratizar as instâncias de poder, incluindo o sistema eleitoral, o Judiciário e os meios de comunicação.
do Blog Aldeia Gaulesa

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