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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

quarta-feira, janeiro 07, 2015

Soviéticos e Cubanos (ou como Cuba resistiu ao fim da URSS)


Conferência do PCC
Por Breno Altman

Muitos se indagam o porquê de Cuba ter resistido ao colapso do socialismo, apesar de sua fragilidade econômica.

Uma das razões, penso, é que o discurso de Fidel e seus companheiros sempre expôs ao povo cubano, com clareza, frequentemente de maneira ríspida, os problemas e erros cometidos.

Mesmo enfrentando sacrifícios dramáticos, os cidadãos aprenderam a confiar em sua direção. Nem tanto por sua capacidade para resolver os estrangulamentos provocados pelo bloqueio, a falência da URSS e os graves equívocos cometidos, mas por estarem seguros que seus líderes não faltavam com a verdade e não os tratavam como audiência passiva.

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Ao contrário do que propagam os inimigos da revolução cubana, o Partido Comunista sempre incentivou, dentro de suas instâncias e na população, processos amplos de crítica e auto-crítica, cujo ápice ocorreu exatamente nestes 25 anos depois da quebra soviética.

Tudo isso apesar da situação de cerco e pressão provocada pelo embargo norte-americano.

Os soviéticos, ao menos desde Krushev, preferiram outro caminho, marcado pela linguagem do contente. Até os anos finais da crise, os cenários dos relatórios eram maravilhosos: pleno emprego, conquistas sociais e culturais formidáveis, desenvolvimento incessante, tremenda pujança em comparação ao capitalismo supostamente doente e terminal.

A população e parcelas expressivas da própria militância comunista, que tinham travado batalhas de vida ou morte para construir o socialismo e derrotar o nazismo, foram desacreditando de uma direção que propagava os logros revolucionários sem enfrentar com franqueza os evidentes problemas em curso.

Meu temor é que, na esquerda brasileira, venhamos a ter cada vez mais "soviéticos" e menos "cubanos"...

Breno Altman é jornalista brasileiro, direitor editorial do site Opera Mundi e da revista Samuel.

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