Universidade brasileira forma sua primeira turma composta só por índios
Artigo por Bruna Angélica Pelicioli Riboldi
(Imagem: Henrique Almeida, Divulgação UFSC)
A Universidade Federal de Santa Catarina formou a sua primeira turma composta só por índios. O grupo se gradua em Licenciatura Intercultural Indígena do Sul da Mata Atlântica.
São 85 alunos das etnias guarani, kaingang e laklãnõ/xokleng, provenientes do Mato Grosso do Sul (MS), Espírito Santo (ES), Rio de Janeiro (RJ), Santa Catarina (SC) e Rio Grande do Sul (RS). O curso teve duração de quatro anos, entre aulas na universidade e atividades desenvolvidas nas aldeias. Os estudantes receberam formação para lecionar nas áreas de infância, linguagens, humanidades e conhecimento ambiental indígena.
O juramento na colação de grau falou de cultura, liberdade, autonomia, luta pela terra, autodeterminação, alegria e crianças sadias. O discurso dos oradores ressaltou a preocupação com o futuro, a importância das tradições culturais e da demarcação de território indígena:
– Não importa o povo ou etnia a que pertencemos, somos todos irmãos, filhos desta terra – lembraram.
Uma reportagem publicada no site da universidade ressalta algumas histórias de superação dos alunos.
Foi o cuidado com a família e seu povo que impulsionou o primeiro formando da noite, o guarani Adelino Gonçalves, a completar o curso, após quase haver desistido. Morador de Biguaçu (SC), conta que a rotina de trabalho e estudos ficou forçada demais, e ele quase largou a graduação pela metade.
– Mas eu sei que isso vai fazer uma diferença para nós. Tenho que espalhar esse conhecimento, temos que mostrar as coisas que aprendemos e valorizar o que ensinamos. A experiência de convivência foi muito importante; um dos motivos para os não índios não respeitarem nossa cultura como deveriam é porque não a conhecem –, observa.
A satisfação em poder aprimorar as escolas indígenas da sua cidade natal estava estampada no rosto do kaingang Armandio Bento, de 48 anos. Natural de Redentora, no Rio Grande do Sul, é professor há 21 anos.
– Nossas principais atividades lá são o artesanato e a agricultura, e queremos continuar com essas coisas, mas também levar mais saúde e valorizar cada vez mais o estudo –, prevê.
O xokleng Woie Patté, de José Boiteux, era um dos mais animados, tanto na hora de subir ao palco para tomar o lugar na cerimônia quanto na hora de receber o diploma:
– É uma noite de muita alegria, estou emocionado mesmo –, diz. Ele trabalhava como agente de saúde e resolveu aproveitar a oportunidade de fazer uma graduação e iniciar uma carreira acadêmica. Agora, os planos incluem mestrado e doutorado.
Durante a cerimônia, dois colegas foram lembrados: Natalino e Eduardo, que são parte da turma, mas faleceram antes de terminar o curso. A paraninfa Maria Dorothea Post Darella prestou uma homenagem especial à formanda Maria Cecilia Barbosa, que se tornou bisavó enquanto fazia o curso.
– Foi possível experimentar uma troca, com conhecimentos tradicionais sendo trazidos para o seio da academia – declarou Flácio Chiarelli Vicente de Azevedo, presidente da Fundação Nacional do Índio (Funai), apoiadora do curso, em entrevista à TV Brasil.
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