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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

sexta-feira, julho 08, 2011

O segundo enterro de Pinochet?

A crise no Chile 
Além de Economia

Se já não bastasse os países da Europa e os Estados Unidos estarem experimentando a radicalidade do modelo de mercado excessivamente desregulamentado, na América Latina, particularmente o Chile, está começando a viver um temor financeiro generalizado.

O Banco Central e o Ministério da Fazenda de uma das economias mais abertas e dita competitivas da América do Sul se deram conta de que 418 mil chilenos – o equivalente a 12% das famílias – estão envolvidas em uma espécie de crediário fraudado pela rede de lojas de departamentos La Polar S.A. uma das maiores do país, com filiais em todo o Chile e na Colômbia.

Qualquer semelhança com sub-prime norte americano é mera coincidência, entretanto, é importante observar, o modo tupiniquim. No Chile, é muito comum as lojas de departamentos administrarem seus próprios cartões de crédito. Por não serem consideradas “instituições bancárias”, houve uma tendência de o governo fazer “vista grossa” para este setor da economia.

O golpe dado pela empresa consistia em abrir crediário e conceder cartões de crédito a clientes considerados de risco para, em seguida, aplicar juros extorsivos e taxas administrativas sobre as prestações em atrasos. A dívida era, então, renegociada ou “repactuada” de forma unilateral, sem o consentimento do cliente, e a quantia devida no início aparecia multiplicada, paulatinamente, em até 30 vezes. Principalmente desde 2008, devido a esse procedimento, tornou a Polar uma referência para diversos tipos de aplicações no mercado financeiro.

As ações da Polar S.A. eram consideradas uma excelente opção de aplicação financeira, devida a sua liquidez e a facilidade de compra e venda, com isso, milhares de pessoas e fundos privados de pensão realizaram aplicações com a expectativa de ampliar sua renda.

Com o golpe militar em 1973, o Chile se tornou a primeira experiência neoliberal, a economia chilena passou por reformas profundas muito similares e até mesmo mais intensas que o restante da América Latina na década de 90. No Chile não há previdência pública, como por exemplo; há no Brasil. Neste sentido, os fundos de pensão privados e empresas para aumentarem seus rendimentos, investem em ações, que podem subir ou, em como no caso da Polar, correm o risco de desabar. Segundo a Associação de Fundos de Previdência do Chile estimam em prejuízos em torno de US$ 300 milhões.

Para além da crise financeira, há também a crise energética e educacional. Desde maio deste ano o Presidente Sebastián Piñera decidiu colocar para aprovação um projeto de instalação de uma grande usina hidrelétrica na Região de Aysén, no sul do país, numa das zonas mais belas e preservadas da Patagônia. A iniciativa provocou reação imediata dos movimentos de preservação ambiental chilenos e internacionais e fez com que, rapidamente, gigantescos protestos se espalhassem pelo país.

Há pelo menos um mês estudantes chilenos (secundaristas e universitários) não estão dando trégua ao governo de Piñera, reivindicam que a educação seja um direito e de responsabilidade do Estado; aumento imediato do financiamento público; o Estado deve assumir a formação técnica e assegurar liberdades de expressão à docentes e estudantes.

Queiram ou não, o neoliberalismo chileno está em xeque, a capacidade de arrefecimento ou encrudelecimento caberá, evidentemente, a organização dos movimentos populares e do tamanho da crise financeira, mas do ponto de vista, internacional os diversos países latino-americanos que não comungam política e ideologicamente com Piñera, também poderá contribuir para que o Chile comece a trilhar caminhos diferentes ao iniciado pelo golpe militar.

*esquerdopata

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