Páginas

Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

sexta-feira, julho 25, 2014

'Forças Armadas devem pedido formal de desculpas ao País', diz Franklin Martins

Ex-ministro de Lula, protagonista do sequestro do embaixador Elbrick, diz que erro de avaliação levou Jango a não resistir ao golpe, na esperança de que se tratava de um movimento efêmero
Protagonista de um dos episódios mais marcantes da resistência à ditadura – o sequestro do embaixador norte-americano, Charles Burke Elbrick –, o jornalista Franklin Martins tinha apenas 15 anos quando se engajou na luta contra o regime militar. Ex-ministro da Secretaria de Comunicação do governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, ele foi obrigado na época a se exilar em Cuba, Chile e França. Passou períodos na clandestinidade e articulou movimentos de esquerda contrários ao regime ditatorial instalado pelos militares com apoio da direita conservadora.
Passados 50 anos do golpe que na noite do dia 31 de março de 1964 mudaria os rumos políticos do Brasil, Franklin cobra um gesto contundente do Exército: “As Forças Armadas devem um pedido formal de desculpas ao país.”
O ex-ministro defende uma mudança profunda na formação dos militares brasileiros para que eles passem a enxergar que o que ocorreu no Brasil foi um golpe e não uma revolução. Desta forma, defende o jornalista, as Forças Armadas se tornariam mais integradas à sociedade, atuando permanentemente subordinadas ao poder civil. “As Forças Armadas não podem continuar nas academias com currículos que tratam o golpe de 64 como uma revolução libertadora”, critica ele. “Instituições de Estado não podem ir contra a democracia”, disse em entrevista ao iG.
Franklin ponderou ainda que as Forças Armadas “foram manipuladas por comandos que as colocaram contra o País”. “Para colocá-las contra o País tiveram de fazer um expurgo nas Forças Armadas de dimensões gigantescas. Não houve só golpistas nas Forças Armadas. Tinha gente que era contra o golpe”, afirma.
Erro de avaliação
Franklin lembrou o contexto de “efervescência” na política, na cultura e na economia brasileira no início da década de 1960 no Brasil e, apesar disso, a falta de um movimento de resistência ao golpe. Segundo ele, a maioria do País apoiava o cronograma de reformas apresentado e defendido pelo então presidente João Goulart e esse segmento acabou, entretanto, carente de apoio quando buscou um baluarte de resistência. “Quem tentou resistir procurou as lideranças políticas e as lideranças políticas não sabiam o que fazer”, contextualiza o ex-ministro.
Para Franklin, um “erro de avaliação” levou o ex-presidente João Goulart a não resistir ao golpe. “Ele não tinha um esquema militar preparado, o que demonstra a falácia das teses de que ele estaria preparando um golpe de Estado. Não tinha golpe de Estado coisa nenhuma”, diz ele. “Acho que havia da parte do Jango um certo erro de avaliação semelhante ao que havia por parte de vários dirigentes políticos do País, inclusive dirigentes da direita que apoiaram o golpe, que é o seguinte: o golpe vem, ele durará seis meses, um ano, depois se convoca eleição e aí se retoma a normalidade democrática”.
Para Franklin, o golpe foi a realização de uma empreitada que visava impedir que demandas populares entrassem na pauta política do País. “O golpe, no fundamental, é uma tentativa de evitar que os trabalhadores, as forças populares, os camponeses, a intelectualidade, tudo isso, pudessem formar uma nova agenda do País, com modernização do País baseada na justiça social”, resume ele.
O ex-ministro falou brevemente sobre as reedições das passeatas que em 1964 canalizaram apoio ao golpe, como a Marcha da Família com Deus pela Liberdade, ressuscitada recentemente e que aconteceu em São Paulo no sábado (22). “Acho isso uma bobagem sem tamanho”, dispara. “Tem um pessoalzinho no Brasil que vive dentro de um cápsula, uma bolha. Nem as Forças Armadas irão para uma coisa dessas”, emendou, ao defender que o Brasil não abandonará a democracia. “Quem pensar em algo diferente será isolado e não terá influência na vida política do país”.
'Forças Armadas devem pedido formal de desculpas ao País', diz Franklin Martins
Ex-ministro de Lula, protagonista do sequestro do embaixador Elbrick, diz que erro de avaliação levou Jango a não resistir ao golpe, na esperança de que se tratava de um movimento efêmero
Protagonista de um dos episódios mais marcantes da resistência à ditadura – o sequestro do embaixador norte-americano, Charles Burke Elbrick –, o jornalista Franklin Martins tinha apenas 15 anos quando se engajou na luta contra o regime militar. Ex-ministro da Secretaria de Comunicação do governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, ele foi obrigado na época a se exilar em Cuba, Chile e França. Passou períodos na clandestinidade e articulou movimentos de esquerda contrários ao regime ditatorial instalado pelos militares com apoio da direita conservadora.
Passados 50 anos do golpe que na noite do dia 31 de março de 1964 mudaria os rumos políticos do Brasil, Franklin cobra um gesto contundente do Exército: “As Forças Armadas devem um pedido formal de desculpas ao país.”
O ex-ministro defende uma mudança profunda na formação dos militares brasileiros para que eles passem a enxergar que o que ocorreu no Brasil foi um golpe e não uma revolução. Desta forma, defende o jornalista, as Forças Armadas se tornariam mais integradas à sociedade, atuando permanentemente subordinadas ao poder civil. “As Forças Armadas não podem continuar nas academias com currículos que tratam o golpe de 64 como uma revolução libertadora”, critica ele. “Instituições de Estado não podem ir contra a democracia”, disse em entrevista ao iG.
Franklin ponderou ainda que as Forças Armadas “foram manipuladas por comandos que as colocaram contra o País”. “Para colocá-las contra o País tiveram de fazer um expurgo nas Forças Armadas de dimensões gigantescas. Não houve só golpistas nas Forças Armadas. Tinha gente que era contra o golpe”, afirma.
Erro de avaliação
Franklin lembrou o contexto de “efervescência” na política, na cultura e na economia brasileira no início da década de 1960 no Brasil e, apesar disso, a falta de um movimento de resistência ao golpe. Segundo ele, a maioria do País apoiava o cronograma de reformas apresentado e defendido pelo então presidente João Goulart e esse segmento acabou, entretanto, carente de apoio quando buscou um baluarte de resistência. “Quem tentou resistir procurou as lideranças políticas e as lideranças políticas não sabiam o que fazer”, contextualiza o ex-ministro.
Para Franklin, um “erro de avaliação” levou o ex-presidente João Goulart a não resistir ao golpe. “Ele não tinha um esquema militar preparado, o que demonstra a falácia das teses de que ele estaria preparando um golpe de Estado. Não tinha golpe de Estado coisa nenhuma”, diz ele. “Acho que havia da parte do Jango um certo erro de avaliação semelhante ao que havia por parte de vários dirigentes políticos do País, inclusive dirigentes da direita que apoiaram o golpe, que é o seguinte: o golpe vem, ele durará seis meses, um ano, depois se convoca eleição e aí se retoma a normalidade democrática”.
Para Franklin, o golpe foi a realização de uma empreitada que visava impedir que demandas populares entrassem na pauta política do País. “O golpe, no fundamental, é uma tentativa de evitar que os trabalhadores, as forças populares, os camponeses, a intelectualidade, tudo isso, pudessem formar uma nova agenda do País, com modernização do País baseada na justiça social”, resume ele.
O ex-ministro falou brevemente sobre as reedições das passeatas que em 1964 canalizaram apoio ao golpe, como a Marcha da Família com Deus pela Liberdade, ressuscitada recentemente e que aconteceu em São Paulo no sábado (22). “Acho isso uma bobagem sem tamanho”, dispara. “Tem um pessoalzinho no Brasil que vive dentro de um cápsula, uma bolha. Nem as Forças Armadas irão para uma coisa dessas”, emendou, ao defender que o Brasil não abandonará a democracia. “Quem pensar em algo diferente será isolado e não terá influência na vida política do país”.

Nenhum comentário:

Postar um comentário