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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

sexta-feira, agosto 15, 2014

Teat(r)o Oficina 53 Anos

by Zé Celso
O Teat(r)o Oficina re-anivesaria sábado.
Dia 16 de Ah!Gosto faz 53 anos em cena, às 19h.
Dia de festa no Oficina Uzyna Uzona, agora como Teat(r)o; com esse “r” introduzido entre aspas, confirmando o Teatro com o “r” normal, mas afirmando a descoberta do Te-Ato parido na sua história, em 1971, na primeira peça de Te-Ato: Gracias Señor.
Cacilda_inauguração_Oficina
Renasce no 5º episódio da “ODISSEIA DAS CACILDAS!!!!!!!!!” (9 exclamações) com as cinco exclamações de Cacilda!!!!!. Aquela mesma mulher Cacilda Becker que no verão de 1960, como se fazia com a inauguração dos navios, quebrou uma garrafa de champagne num pedaço de cimento instaurado como alicerce do Teatro d(o)as Menin(o)as da Bigorna.
Nove meses depois inaugurava-se com “A Vida Impressa em Dolar”: “Awake and Sing”, de Clifford Odets.  Dia 16 de agosto de 1961 surgia uma nova forma de espaço cênico em SamPã, arquitetada por Joaquim Guedes: duas arquibancadas para o público que sentava-se de um lado ou de outro, confrontando-se, tendo no meio o lugar da atuação; um teatro sanduíche em que os atores e atrizes eram o recheio; duas paredes laterais e o pé direito alto, suportes para cenógrafos como Flávio Império criarem maravilhas plásticas; toda a estrutura dos refletores à mostra.
Enfim tínhamos as possibilidades de construção das alegorias plástica das cenas, como o TBC, e a proximidade física dos corpos, como no Teatro de Arena.
No dia seguinte à estreia o teatro foi fechado pelo Departamento de Diversões Públicas do Estado por não apresentar os requisitos necessários para obter um alvará de funcionamento como teatro. E a peça foi proibida.
Nem me lembro o que tivemos que fazer pra voltarmos a funcionar, mas não esqueço que no dia 25 de agosto, nove dias depois, Jânio Quadros renunciou – saiu de cena pra sempre – e nós entramos com o teatro e a peça liberados, varando repressão/exilio/falta de grana/ostracismo decretado. E hoje estamos aqui com nosso entorno tombado, mais que nunca vivos, mas desafiando o destino da Cultura: neste momento, no Brasil, sendo processados como os favelados, índios, sem teto, com uma ação de reintegração de posse do entorno cedido em comodato por Silvio Santos em 2010.
Mas, ao mesmo tempo, o Plano Diretor da cidade, aprovado na Câmara dos Vereadores e agora passando pelas mãos do Prefeito Fernando Haddad, propicia a troca de terrenos proposta pelo próprio Sílvio Santos, pois o Bixiga vira corredor cultural.
O Oficina aniversaria muitas vezes: além desta, como grupo amador que estreou no mesmo local, no Teatro Novos Comediantes, dia 28 de outubro de 1958, e como Terreiro Eletrônyko, no projeto de Lina Bardi, no dia 03 de outubro de 1993.
E sonha em comemorar o aniversário de sua integração na cidade a partir do entorno, pelo qual luta há 34 anos.
Cacilda!!!!!_Foto_Enio_BraunsEu, o mais velho plugador de gerações e gerações do Teat(r)o Oficina, quero dedicar este aniversário:
•    Às mais de 50 pessoas que hoje atuam em todas as áreas deste universo múltiplo.
•    Aos que vêm atuar nos rituais Teatais que criamos nesta faixa estreita de terra aberta pros ventos do Bixiga, entornada por este terreno vazio maravilhoso inspirador de nossa criação com o sol, lua, a chuva que reluta a chegar e a presença constante da cidade com seus ruídos trágicos & gozosos, espelhada no janelão furado pela árvore que Lina plantou como em sua Casa de Vidro.
•    Aos tecno-artistas público, que há 53 anos criaram as condições para este aniversário ser comemorado.
•    Às 20 companhias teatrais que obtiveram tombamento imaterial por parte da Secretaria Municipal de Cultura para lutar por seus espaços ameaçados pela especulação imobiliária – elas se distinguem por fazerem um teatro que cria a reconstrução trans humana da metrópole de SamPã. Não estamos, nem nunca estivemos, nem estaremos sós neste milagre de nossa longevidade fecundada sempre pela sucessão de novas gerações que aqui sucedem-se.
•    Sobretudo, dedico aos atuadores que têm permanecido por longo tempo, propiciando a qualidade do vinho maduro que hoje estamos produzindo mesmo dentro da precariedade radical com que criamos.
Nós queremos mais condições de trabalho, óbvio,-mas Lina Bardi nos ensinou a nunca parar de criar, mesmo no que ela chamava de “precariedade radical”.  O artista, sobretudo na arte teatral, não pode esperar por condições ideais, não pode jamais deixar de estar preparando-se pra estar em cena, estando sempre n’ela dentro e fora do teat(r)o. Se há um segredo da longevidade desta Cia, este talvez seja o mais importante; este que Lina e os que trabalham nesta aventura cineteatográfica hoje, esta geração de jovens bárbaros cyberizados, me ensinam.
Hoje quis retomar o 1º dia em que tudo começou profissionalmente e me dei ao luxo de viajar nas pessoas que iniciaram esta epopeia no dia 16 de agosto de 1961, às 21, com “A Vida Impressa em Dollar”.
Fauze_Arap
Fauzi Arap - Sam Feinschreiber / A diva Célia Helena – Hennie
Ensaio
Foto de ensaio do fotógrafo Fredy Kleman: o jovem Renato Borghi como Ralph; Célia Helena como Hennie; Moracy Duval, administrador, e Etti Frazer – que vendeu cadeiras cativas para a construção do teatro, realizada em menos de nove meses  – e magistralmente fazia o papel de Bessie Berger, a mãe.
Eugenio Kusnet fazia o comunista Jacob na peça – na foto abaixo, brinca com o início das obras do então novo teatro.
Jânio
*BlogdoZeCelso

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