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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

terça-feira, fevereiro 28, 2012

'Mr. Kong' e o racismo à brasileira 

por Lucas Ribeiro Scaldafferri

Cena do clipe

Toda vez que se debate racismo no Brasil as classes dominantes apelam para o senso comum e perguntam: quem é negro no Brasil? A miscigenação sempre é invocada para camuflar o racismo e passar a idéia de que esse mal não existe em nossas terras. Mas, uma pequena reflexão já basta para desvendar o quanto nossa sociedade ainda é marcada pela chaga do racismo.

No Brasil, o que serve de exemplo “positivo” para a sociedade sempre tem uma ancestralidade européia. É assim, por exemplo, com as apresentadoras de programas infantis, que há mais de três décadas invadem os lares brasileiros com suas cabeças loiras e que não parecem nada com a maioria da população. As novelas também reproduzem essa falsa realidade e seus galãs ou protagonistas sempre têm o “pezinho” no velho continente. 


Na educação essa realidade não é diferente. Os que hoje são adultos se lembram que nos livros didáticos as famílias negras nunca eram retratadas. As únicas figuras negras registradas eram, sempre, os escravizados ou trabalhadores domésticos.

A herança escravagista que tratava o negro como animal irracional e sem capacidade intelectual se manteve viva mesmo depois da abolição. Ser a maioria dos miseráveis e favelados nos dias atuais é o exemplo categórico do racismo no Brasil. Ao contrário dos Estados Unidos da América (EUA), onde leis garantiam a segregação até os anos 70, o Brasil não precisou de artifícios jurídicos.

“Kong”, um desserviço e uma ofensa às mulheres e aos negros
É por todos esses exemplos que a população negra, e em especial os jovens, precisam ter referências positivas. Pelé, o atleta do século, perdeu a chance de ser um embaixador da luta anti-racista no Brasil; como foi o maior pugilista de todos os tempos, Muhammad Ali, nos EUA. Quando alguns negros conseguem ultrapassar o filtro racista da sociedade brasileira se espera deles, no mínimo, uma postura crítica perante a situação do negro no país.

O cantor Alexandre Pires, que foi líder do grupo Só Pra Contrariar, gravou recentemente um clipe que não traz nada que possa ajudar a população negra a ser tratada com dignidade. O clipe que leva o nome da música “Kong”, uma referência ao gorila “king Kong”.

O inicio do vídeo é marcado por uma invasão de gorilas (homens fantasiados) numa casa cheia de mulheres. As cenas são protagonizadas por três negros: o próprio Alexandre, o jogador de futebol Neimar e o cantor Mr. Catra. Este último, durante o filme, se intitula com Mr. Kong. Uma passagem da música diz: “é no pelo do macaco que o bicho vai pegar”.

As imagens só reforçam o estereótipo animalesco do homem negro como viril. O desserviço prestado por Alexandre, além de fortificar o racismo, é sem dúvida machista. O movimento negro deve repudiar essa manifestação evidente de racismo, que passa como se fosse uma coisa natural, típica característica do racismo à brasileira.


No site do PSTU
*Mariadapenhaneles

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